sexta-feira, 28 de junho de 2024

O que se sabe sobre tentativa de golpe militar na Bolívia

A Bolívia viveu horas de incerteza nesta quarta-feira (26) depois que um grupo de militares se mobilizou no centro de La Paz, algo que o presidente Luis Arce descreveu como uma tentativa de “golpe de Estado”.

Soldados e veículos militares tomaram por algumas horas o controle da Plaza Murillo, em La Paz, e entraram no Palácio Quemado, sede do governo, liderados pelo general Juan José Zúñiga.

Horas depois, Zúñiga foi preso pela polícia.

Ele havia sido destituído do cargo de chefe do Exército boliviano no dia anterior, terça-feira (25), por algumas declarações que fez sobre o ex-presidente Evo Morales.

Os soldados e veículos que haviam tomado a Plaza Murillo iniciaram a retirada minutos depois.

Em algumas cidades bolivianas, inclusive em La Paz, a população foi à rua protestar contra a tentativa de golpe.

Após o incidente, o presidente Arce fez um discurso televisionado, rodeado por membros de seu gabinete.

“Estamos firmes para enfrentar qualquer tentativa de golpe”, disse.

“Queremos exortar todos a defenderem a democracia e aqui estamos com todo o gabinete, com nossas organizações sociais. Saudamos vocês, organizações sociais, e cordialmente os convidamos a mostrar mais uma vez a democracia ao povo boliviano”, ele disse.

Zúñiga disse à imprensa que houve uma “mobilização de todas as unidades militares” devido “à situação do país”.

"Estamos ouvindo o grito do povo. Porque há muitos anos uma elite toma conta do país. Donos do Estado, os vândalos estão nas diferentes estruturas do Estado, destruindo a pátria. As Forças Armadas pretendem reestruturar democracia", declarou Zúñiga, que anunciou a libertação de "todos os presos políticos".

Imagens nas redes sociais mostraram posteriormente Arce dentro da sede do governo enfrentando Zúñiga e ordenando a retirada dos militares, que haviam acessado o Palácio Quemado forçando o portão com um veículo blindado.

Mais tarde, em cerimônia televisionada na Casa Grande del Pueblo, Arce nomeou novos líderes militares. Entre eles, o general José Wilson Sánchez, que assumiu o comando geral do Exército.

Após ser empossado, o militar declarou: “Ninguém quer ver a imagem que estamos vendo nas ruas. É por isso que agora na qualidade de comandante... peço, ordeno que todo o pessoal que estiver mobilizado nas ruas retorne às suas unidades."

Enquanto o evento acontecia na sede do governo, os militares que haviam se mobilizado no centro de La Paz começaram a deixar a Plaza Murillo.

Após a retirada das tropas, Luis Arce saiu à varanda presidencial e, diante de uma multidão, agradeceu aos cidadãos que se mobilizaram.

“Com vocês, com o povo, nunca desistiremos. Ninguém pode tirar a democracia que conquistamos nas urnas e com o sangue do povo boliviano”, afirmou Arce.

·        'Autogolpe', diz general

Zúñiga foi detido depois que o ministério público emitiu uma ordem para sua apreensão. No momento da detenção, o militar acusou Arce de orquestrar a tentativa de golpe para "levantar sua popularidade".

"No domingo no colégio La Salle me reuni com o presidente e ele me disse que 'a situação está muito ferrada, esta semana será crítica. Então é preciso preparar algo para levantar minha popularidade'", disse Zúñiga para as câmeras, quando estava sendo preso.

O general disse ter perguntado a Arce se deveria "colocar os tanques" nas ruas, ao que o presidente teria respondido que sim. O militar disse que os preparativos começaram no domingo à noite.

Segundo Zúñiga, o que aconteceu foi uma tentativa de "autogolpe".

A imprensa local está noticiando que o general será processado por terrorismo e atentado armado contra a segurança e soberania do Estado.

As autoridades anunciaram a detenção de um segundo envolvido — o ex-comandante da Marinha boliviana Juan Arnez Salvador.

·        Barricadas e gás lacrimogêneo

O presidente Arce havia denunciado por volta das 15h locais (16h em Brasília) que houve “mobilizações irregulares de algumas unidades do Exército Boliviano”.

“A democracia deve ser respeitada”, escreveu ele em sua conta na rede social X.

A mídia local mostrou então imagens de tropas posicionadas na Plaza Murillo e de militares entrando no palácio do governo.

Os militares montaram barricadas para impedir a entrada de cidadãos na praça e dispararam gás lacrimogêneo.

Em suas redes sociais, o ex-presidente Evo Morales, líder do partido governante Movimento ao Socialismo (MAS), descreveu o ocorrido como “um golpe de estado” em andamento.

Juan José Zúñiga foi demitido do cargo de chefe do Exército na terça-feira depois de afirmar que Morales “não pode mais ser presidente deste país”.

“Se for necessário, não permitirei que ele pise na Constituição, desobedeça ao mandato do povo”, disse Zúñiga numa entrevista na TV, ameaçando prender Morales.

Morales deixou o poder em 2019, após uma revolta militar que se seguiu ao primeiro turno das eleições presidenciais. Ele então deixou o país com o apoio do México, mas retornou quando Arce levou o MAS de volta ao poder.

Entretanto, Arce e Morales, outrora aliados, têm tido uma disputa política nos últimos meses sobre o futuro do MAS e a tentativa do ex-presidente de concorrer a um novo mandato.

Em diversas declarações públicas, Arce já disse ser alvo de um “golpe suave” que visa “encurtar mandatos”, e por trás do qual estariam os seguidores de Morales.

Por sua vez, o ex-presidente denunciou que Arce, ao assumir a liderança do MAS, tentaria minar as suas aspirações a uma nova candidatura presidencial.

Paralelamente, a Bolívia enfrenta uma grave crise econômica devido à falta de combustível e à escassez de divisas. Isto gerou mobilizações sindicais pelas quais Arce culpa Morales.

·        Lula: 'Golpe nunca deu certo'

Diante dos últimos acontecimentos, o secretário-geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), Luis Almagro, disse que condena "da forma mais contundente" o que aconteceu no país sul-americano.

"O Exército deve submeter-se ao poder civil legitimamente eleito. Enviamos nossa solidariedade ao presidente da Bolívia, Luis Arce Catacora, ao seu governo e a todo o povo boliviano", disse Almagro.

"A comunidade internacional, a OEA e a Secretaria-Geral não tolerarão qualquer violação da ordem constitucional legítima na Bolívia ou em qualquer outro lugar."

Questionado por jornalistas sobre o tema na quarta-feira, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou ter pedido informações ao Itamaraty sobre o tema e ressaltou ser necessário primeira ter certeza sobre o que ocorre no país .

"Eu o ministro Mauro [Vieira, de Relações Exteriores] ligar para a Bolívia, ligar para o presidente [boliviano], ligar para o embaixador brasileiro, para a gente ter certeza, para ter uma posição", disse Lula durante uma visita a uma exposição de ônibus escolares do Programa Caminho da Escola-Novo PAC.

"Mas, como eu sou um amante da democracia, eu quero que a democracia prevaleça na América Latina, golpe nunca deu certo."

Depois, em sua conta oficial na rede social X, Lula afirmou que "a posição do Brasil é clara".

"Condenamos qualquer forma de golpe de Estado na Bolívia e reafirmamos nosso compromisso com o povo e a democracia no país irmão", disse o presidente brasileiro.

O Itamaraty disse em nota à imprensa que o governo brasileiro "condena nos mais firmes termos a tentativa de golpe de estado em curso na Bolívia, que envolve mobilização irregular de tropas do Exército, em clara ameaça ao Estado democrático de Direito no país".

"O governo brasileiro manifesta seu apoio e solidariedade ao presidente Luis Arce e ao governo e povo bolivianos", disse a pasta.

"Nesse contexto, estará em interlocução permanente com as autoridades legítimas bolivianas e com os governos dos demais países da América do Sul no sentido de rechaçar essa grave violação da ordem constitucional na Bolívia e reafirmar seu compromisso com a plena vigência da democracia na região. Esses fatos são incompatíveis com os compromissos da Bolívia perante o Mercosul, sob a égide do Protocolo de Ushuaia."

Diplomatas brasileiros ouvidos pela reportagem em caráter reservado informaram que a situação está sendo analisada pela cúpula do Itamaraty, em Brasília.

A equipe da assessoria internacional da Presidência da República também está avaliando os acontecimentos em La Paz.

A movimentação militar na Bolívia acontece a pouco mais de 15 dias da viagem prevista de Lula ao país, para onde o petista tem viagem agendada para 9 de julho.

A BBC News Brasil indagou ao Itamaraty se a viagem de Lula a Bolívia está mantida e se o governo fez alguma orientação específica aos cidadãos brasileiros que vivem no país, mas até agora nenhuma resposta havia sido enviada.

¨      Soltar golpistas na Bolívia seria um dos objetivos de general líder de rebelião

O presidente da Bolívia, Luís Arce, instalou um novo comando nas Forças Armadas do país, mesmo cercado por militares leais ao general Juan José Zuñiga, que controlam o entorno do Palacio Quemado e o acesso à sede do governo.

Os novos chefes militares prestaram juramento a Arce e prometeram debelar a crise.

Na transmissão da troca de comando, foi possível ouvir bombas explodindo do lado de fora.

Eram os militares golpistas impedindo a aproximação da multidão que se apresentou para defender o governo constitucional.

A tentativa de golpe recebeu rápida condenação internacional.

Ao chegar ao palácio, o general Zuñiga disse que contava com apoio das Forças Armadas, denunciou os políticos e disse defender o povo.

Um de seus primeiros objetivos, de acordo com a rede Telesur, seria soltar os políticos presos na Bolívia pelo golpe de 2019. 

JEANINE E CAMACHO

A senadora Jeanine Añez, que assumiu o governo de maneira inconstitucional, cumpre pena de dez anos de prisão. Vários de seus ministros também estão na cadeia.

O ex-governador do departamento de Santa Cruz de La Sierra, Luis Camacho, líder da extrema-direita boliviana, também perdeu o cargo e segue preso.

Famosamente, ele invadiu o Palácio Quemado com uma Bíblia na mão e orou sobre a bandeira da Bolívia.

Libertar Camacho seria outro objetivo do golpe.

Na confusão, não se sabe se as ordens de Zuñiga foram atendidas.

Como acontece no Brasil desde a tentativa de golpe de 8 de janeiro, a extrema-direita boliviana faz uma campanha pela libertação dos golpistas, alegando que são "presos políticos".

Em Santa Cruz, a foto de Camacho segue na entrada do palácio de governo e, na praça principal, há uma barraca da campanha que afirma que a Bolívia "não é Cuba, nem Venezuela".

O departamento mais rico da Bolívia é a base da extrema-direita no país e atribui o atraso relativo da Bolívia ao domínio dos políticos de origem indígena em La Paz.

 

¨      Quem é Juan José Zúñiga, o general boliviano golpista 

"Vamos recuperar esta pátria", disse na tarde desta quarta-feira (26) o general Juan José Zúñiga à imprensa, enquanto um grupo de soldados liderados por ele tomava a Plaza Murillo, na cidade de La Paz, na Bolívia.

Soldados e veículos blindados assumiram o controle da emblemática praça por algumas horas e entraram no Palácio Quemado, antiga sede do governo, no que o presidente boliviano Luis Arce descreveu como uma “tentativa de golpe de Estado”.

“Aqui estão as forças armadas com o seu povo”, disse o general.

"Estamos ouvindo o grito do povo. Porque há muitos anos uma elite toma conta do país. Donos do Estado, os vândalos estão nas diferentes estruturas do Estado, destruindo a pátria. As Forças Armadas pretendem reestruturar democracia."

Algumas horas depois, e após a desmobilização do militares na Plaza Murillo, Zúñiga foi preso — após acusar Arce, diante das câmeras, de ter realizado um "autogolpe" para aumentar sua popularidade.

Na terça-feira (25), o general Zúñiga foi destituído do cargo de chefe do Exército boliviano após algumas declarações na televisão, nas quais se opôs fortemente ao ex-presidente Evo Morales.

Zúñiga afirmou que estaria disposto a prender o ex-presidente e que o Exército defenderia “a todo custo a Constituição e os grandes interesses do país”.

·        O controverso 'general do povo'

Juan José Zúñiga Macías foi nomeado comandante-geral do exército boliviano em novembro de 2022 e confirmado em janeiro deste ano pelo presidente Luis Arce.

Antes disso, Zúñiga ocupou o cargo de chefe do Estado-Maior. Ele tem vasta experiência militar e é especialista em trabalho de inteligência.

O jornal boliviano El Deber o definiu como “o general do povo”, devido à sua proximidade com os setores mineiro e sindical.

No passado, porém, ele enfrentou acusações de ter desviado $ 2,7 milhões de bolivianos (cerca de R$ 2,2 milhões) de fundos públicos quando era chefe de um Regimento de Infantaria.

Um suboficial acusou-o em 2013 de lhe ter ordenado o desvio dos recursos, que se destinavam a financiar pensões, apoio escolar e despesas de viagem dos militares. Por esse motivo, foi punido com sete dias de prisão.

Em 2022, o general Zúñiga foi mencionado por Evo Morales como líder de um grupo dentro do exército que supostamente realizava “perseguição permanente” a líderes políticos como ele, os “Pachajchos”.

Segundo ex-militares e o próprio Zúñiga, os “Pachajchos” são um grupo criado durante o último governo de Evo Morales e que se dedica ao trabalho de inteligência militar.

Morales deixou o poder em 2019, após uma revolta militar que se seguiu ao primeiro turno das eleições presidenciais. Ele então deixou o país com o apoio do México, mas retornou quando Arce levou o partido Movimento ao Socialismo (MAS) de volta ao poder.

Entretanto, Arce e Morales, outrora aliados, têm tido uma disputa política nos últimos meses sobre o futuro do MAS e a tentativa do ex-presidente de concorrer a um novo mandato.

Em diversas declarações públicas, Arce já disse ser alvo de um “golpe suave” que visa “encurtar mandatos”, e por trás do qual estariam os seguidores de Morales.

Por sua vez, o ex-presidente denunciou que Arce, ao assumir a liderança do MAS, tentaria minar as suas aspirações a uma nova candidatura presidencial.

Paralelamente, a Bolívia enfrenta uma grave crise econômica devido à falta de combustível e à escassez de divisas. Isto gerou mobilizações sindicais pelas quais Arce culpa Morales.

 

Fonte: BBC News Brasil/Fórum

 

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