Entenda a
medida provisória que ‘beneficia’ os irmãos Batista
Uma
MP (medida provisória) enviada pelo governo ao Congresso neste mês para alterar
uma série de regras no mercado de energia do Amazonas tem gerado
questionamentos de representantes dos consumidores por, entre outros motivos,
causar impactos nas tarifas de luz.
A
iniciativa beneficia, na prática, uma empresa do grupo J&F da família dos irmãos Joesley e Wesley Batista.
O
texto com as mudanças foi publicado pelo governo poucos dias após uma operação
de R$ 4,7 bilhões da Âmbar, empresa de energia do grupo J&F (também dono da
gigante de carnes JBS). A companhia comprou um conjunto de usinas termelétricas
no estado, até então pertencentes à Eletrobras.
Conforme
mostrou a Folha, a medida do governo faz com que a geração dessas termelétricas
pare de ser parcialmente paga pela distribuidora local, a Amazonas Energia, e
passe a ser totalmente bancada pelo conjunto de consumidores do Sistema
Interligado Nacional.
A
justificativa do Executivo federal é tornar viável a concessão de distribuição
e evitar um cenário ainda pior, de caducidade.
Para
2024, a energia das térmicas incluídas na medida tem um custo estimado pelo
mercado em R$ 2,7 bilhões. Hoje essa conta é coberta em menor parte pela
companhia e, em maior parte, por subsídios pagos pelos consumidores
pertencentes ao chamado mercado regulado do país (onde está a maior parte dos
consumidores residenciais).
O
problema de os pagamentos estarem hoje sob responsabilidade parcial da Amazonas
é que a empresa vive em dificuldades financeiras há muito anos, devido a, entre
outros motivos, a complexidade da operação local (o que inclui um alto índice
de furtos de energia).
A
companhia tem uma série de dívidas com as termelétricas da região. Só no quatro
trimestre de 2023, a Eletrobras vendedora das usinas registrou provisão de R$ 328,7 milhões referentes à inadimplência da distribuidora.
De
acordo com especialistas, alguma medida era esperada para resolver os problemas
financeiros da distribuição e evitar um colapso no fornecimento de energia no
estado. Mas, ao mesmo tempo, a decisão abriu caminho para a mudança nos
pagamentos que, com as mudanças, passarão a ser feitos de forma garantida pelos consumidores.
Em
nota, o governo reafirmou a necessidade da medida e negou que o movimento vai
encarecer a energia para os brasileiros.
Em
caráter reservado, no entanto, integrantes do Executivo reconhecem que a
iniciativa deve elevar a conta mas apenas de parte dos consumidores, aqueles que estão no chamado mercado livre (onde estão principalmente as indústrias). Para os demais, a visão é que a tarifa pode até baixar.
Dois
membros do governo ligados ao tema afirmam, inclusive, que a reclamação
observada no setor é capitaneada por grupos que migraram para o mercado livre.
É onde estão empresas de grande porte por exemplo, uma fábrica que escolhe comprar energia diretamente de um parque eólico ou solar.
Isso
porque quem está no mercado livre (grandes comércios e indústrias) paga uma
fatia menor, em relação a quem está no mercado regulado (principalmente
residências), dos subsídios da chamada Conta de Consumo de Combustíveis (a CCC,
que banca a maior parte dos pagamentos às térmicas em questão).
Já
os contratos de energia de reserva, para onde as termelétricas estão sendo
migradas, são arcadas por todos que estão no Sistema Interligado Nacional (o
que inclui as grandes indústrias).
O
presidente da Abrace, associação que representa os grandes consumidores de
energia, Paulo Pedrosa, afirma que o movimento é prejudicial. "O pedaço
que era pago pela Amazonas Energia foi jogado para o Brasil inteiro pagar. Vai
pesar mais principalmente para a indústria do Norte", afirma.
Luiz
Eduardo Barata, presidente da Frente Nacional dos Consumidores de Energia,
disse haver impacto não só para clientes industriais e comerciais, como também
para os residenciais. "O custo passará a ser dos consumidores de todo o
Brasil. Isso tem impacto na inflação", afirmou.
A
MP foi resultado de estudos feitos por um grupo de trabalho formado entre
membros do governo e da Aneel para estudar a solução para o imbróglio no
estado.
Além
das iniciativas voltadas às usinas locais, há uma segunda seção da MP voltada
especificamente à Amazonas Energia, concessionária de distribuição que compra
energia das termelétricas. O texto flexibiliza uma série de condições para
garantir a viabilidade econômica da concessão e transferir o controle
societário como alternativa à extinção da concessão (cenário extremo que o
governo busca evitar).
De
acordo com Pedrosa, da Abrace, a medida ainda joga para os consumidores de todo
o Brasil as perdas com o furto de energia observado no estado. Caso o comprador
resolva o problema, fica com os recursos mesmo assim obtendo um duplo ganho. "Se o
comprador resolve o problema, a empresa captura os ganhos. Esse é o grande ponto", disse.
A
J&F, além de ter comprado as térmicas, está interessada em comprar a
própria Amazonas Energia de acordo com
integrantes do governo com conhecimento do assunto.
Baseado
nos estudos, os técnicos concluíram pela necessidade de transferir a concessão
para uma empresa que tenha condições de prestar o serviço com eficiência. Para
isso, entenderam que era preciso mudar a lei com o intuito de permitir
reembolso adequado em subsídios e tempo necessário para que o novo controlador
consiga ajustar os níveis de perdas, inadimplência e custos operacionais.
O
ministro Alexandre Silveira (Ministério de Minas e Energia) foi questionado no
Congresso sobre o fato de a MP ter sido publicada logo após a compra da
J&F. Ele disse que o timing foi uma mera coincidência.
"O
Ministério de Minas e Energia já havia enviado há algum tempo o texto para a
Casa Civil, mas as medidas que apontam a necessidade da mudança regulatória já
são de meses. Nós estávamos instruindo adequadamente o processo para que isso
se tornasse realidade", disse.
"Existe
toda uma construção da medida, que foi feita há mais de um ano [...]. A Aneel
notificou o ministério, disse que a concessionária [Amazonas] colapsaria, foi
feito um grupo de trabalho, o grupo de trabalho definiu quais eram as medidas a
serem tomadas", completou o ministro.
Ele
afirmou que vários grupos nacionais de grande porte iniciaram uma análise
detalhada dos números da Amazonas Energia para uma possível oferta (processo
chamado de due dilligence) e também as térmicas locais. Ele citou como exemplo
de potenciais compradores a Equatorial, a Aegea e o banco BTG.
"A
transação feita entre a Eletrobras e a Âmbar Energia não passou pelo
ministério, não é do interesse do ministério, não deve ser considerada pelo
ministério", afirmou.
• Câmara discute 'imposto do pecado' em
nova audiência
O
grupo de trabalho (GT) da Câmara dos Deputados encarregado de regulamentar a
reforma tributária (PLP 68/24) promoveu nesta segunda-feira (24/6) uma nova
audiência pública focada no Imposto Seletivo, conhecido como "Imposto do
Pecado". O debate ocorrerá às 14h30 no plenário 2.
O
Imposto Seletivo foi introduzido pela reforma tributária, aprovada em dezembro
do ano passado, e incidirá sobre produtos considerados prejudiciais à saúde,
como cigarros e bebidas alcoólicas, e ao meio ambiente, como carros a
combustão. A regulamentação deste imposto está inserida no Projeto de Lei
Complementar 68/24, que também estabelece o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS)
e a Contribuição Social sobre Bens e Serviços (CBS).
A
proposta de regulamentação da reforma tributária foi apresentada pelo governo
em abril. Com a implementação prevista para iniciar em 2026, o debate será
fundamental para definir os detalhes técnicos e assegurar que os objetivos de
saúde pública e proteção ambiental sejam alcançados sem comprometer a
competitividade dos setores afetados.
Os
deputados federais Claudio Cajado (PP-BA), Reginaldo Lopes (PT-MG), Hildo Rocha
(MDB-MA), Joaquim Passarinho (PL-PA), Augusto Coutinho (Republicanos-PE), Moses
Rodrigues (União-CE) e Luiz Gastão (PSD-CE) têm o total de 60 dias para
concluir os trabalhos do colegiado e apresentar suas conclusões.
Ao
Correio, o deputado Claudio Cajado explicou que ainda não é possível dar um
indicativo de caminho que o grupo está tomando pois ainda há várias entidades
representantes dos setores envolvidos para serem ouvidas. O GT deve se reunir
com todos os representantes até a próxima quinta-feira (27).
“A
expectativa é que devamos receber amanhã mais reivindicações do que sugestões
dos setores afetados pelo imposto. A ideia é fazermos audiências até esta
quinta-feira. Ou seja, estamos na rodada final de atendimentos das mesas de
diálogo e das audiências”, explicou Cajado.
• Relatório previsto para semana que
vem
Após
a rodada de conversas, o próximo passo do grupo é escrever um relatório que
reúne todas as reivindicações expostas nas audiências e mesas de diálogos. O
documento deve ser apresentado na próxima semana.
“O
objetivo é começar a escrever o texto do relatório no próximo final de semana
para que ele fique pronto até a quarta-feira da semana que vem, dia 3 de julho.
No total 19 partes constituem os temas que estão sendo discutidos. O que for
consenso de decisão entre o grupo e o governo já deve ficar resolvido. O que
for dissenso vai para uma outra coluna de discussão e então vamos encaminhar
para os líderes e para o [presidente da Câmara] Arthur Lira (PP-AL) definir o
que vai ser feito. O que estamos fazendo é uma peneiragem e dar a nossa
opinião”, explicou o deputado do PP.
O
deputado Reginaldo Lopes, publicou neste domingo (23) em suas redes sociais, um
balanço dos 20 dias de trabalho do grupo. De acordo com a publicação, foram
realizadas 19 audiências públicas, com a reunião de 427 entidades e 868
especialistas.
“A
reforma tributária é a mais importante para o nosso país. Com essa reforma,
teremos ganho de produtividade, crescimento econômico, e mais justiça tanto
tributária quanto social. Ela vai preparar o Brasil para o futuro, tornando
nosso país um lugar melhor para investimentos e promovendo uma maior
consciência fiscal e cidadã. [...] Nosso objetivo é entregar um sistema
tributário justo, transparente e benéfico para todos os brasileiros”, afirmou o
deputado petista na publicação.
• Setor automobilístico
O
gerente de imprensa da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos
Automotores (Anfavea), Glauco Lucena, explicou ao Correio que porta-vozes do
setor devem comparecer à audiência desta segunda-feira para expor suas
reivindicações.
“A
gente vai fazer uma defesa veemente para tirar os automóveis desse rol de
produtos do imposto seletivo. Nós vamos ter 10 minutos para falar e todos os
outros setores devem estar lá, cigarro, bebidas, embutidos e etc. A gente vai
apresentar argumentos técnicos, econômicos e até filosóficos contra o princípio
dessa lei que mostram que não faz o menor sentido colocar automóveis nesse tipo
de imposto seletivo. É inédito se isso acontecer no Brasil”, afirmou Lucena.
O
representante da Anfavea ainda explicou que um dos argumentos que deve ser
exposto no plenário da audiência é o fato de que o aumento do imposto deve
ocasionar o aumento de preço dos carros novos, podendo ocasionar o
envelhecimento da frota automobilística no Brasil.
“Um
argumento que posso adiantar é que na nossa visão, se a ideia é a preocupação
com a saúde, o imposto seletivo deveria ser com produtos nocivos à saúde
pública. Colocar carro novo, zero quilômetro, no imposto seletivo, você vai
atrasar a renovação da frota, vai manter [nas ruas] carros [mais velhos]. O
preço aumenta com o imposto, então você dificulta o acesso ao carro novo e
deixa carros usados que são muito mais poluentes, mais inseguros, rodando nas
ruas por mais tempo. Então esse é um dos argumentos centrais da nossa defesa”,
explicou Glauco.
• Expectativas para a audiência
Para
as audiências desta semana, espera-se que sejam abordados diversos aspectos
técnicos e econômicos relacionados ao “Imposto do Pecado". Entre os temas
em discussão estão:
<><>
1. Definição das alíquotas: A metodologia para definir as alíquotas do IS
(imposto seletivo), que serão estabelecidas posteriormente por lei ordinária,
será um ponto central do debate. As alíquotas devem ser calibradas para
balancear a arrecadação e os objetivos de saúde pública e proteção ambiental.
<><>
2. Impactos econômicos e sociais: Avaliar como o imposto afetará o consumo de
produtos como cigarros, bebidas alcoólicas e veículos a combustão, além de
discutir os possíveis benefícios para a saúde pública e a redução de poluentes.
<><>
3. Regulamentação e implementação: O cronograma para a implementação do imposto
seletivo também deve ser discutido, incluindo a transição do sistema tributário
atual para o novo modelo de impostos não cumulativos, prevista para começar em
2026.
<><>
4. Setores específicos: O impacto sobre indústrias específicas, como a do
tabaco, bebidas e automotiva, será analisado. Representantes desses setores,
incluindo associações industriais, devem apresentar suas preocupações e
sugestões.
<><>
Implementação do imposto seletivo
A
reforma tributária aprovada em 2023, consolidada na Emenda Constitucional 132,
trouxe significativas mudanças no sistema de tributos sobre consumo. Os novos
tributos, o IBS e a CBS, substituirão PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS após um
período de transição de 2026 a 2033. O Imposto Seletivo (IS) complementa essa
estrutura, incidindo especificamente sobre produtos nocivos à saúde e ao meio
ambiente.
Fonte:
FolhaPress/Correio Braziliense
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