sábado, 4 de maio de 2024

Estudo revela a perversidade dos contratos ‘temporários’ na educação pública

De acordo com um estudo da ONG Todos Pela Educação, com base no Censo Escolar e no Sistema de Avaliação da Educação Básica, os profissionais com contratos temporários nos estados brasileiros já são maioria, 51,6% do total.

A situação é muito grave, como mostra o levantamento, porque 43,6% dos “temporários” atuam há pelo menos 11 anos como professora ou professor, ficando claro que esse tipo de contratação deixou de ser apenas para uma demanda pontual e passou a ser a regra, com a falta de concursos. O problema consiste em que os governadores enxergaram na lei a possibilidade de contratação temporária para suprir demandas pontuais, numa forma de burlar a lei e cortar verbas da educação.

Inclusive, em São Paulo, depois de 13 anos, um concurso foi realizado, mas a nota desse concurso foi utilizada como critério de atribuição de aulas para os “temporários”; e o governo paulista não dá sinais de efetivar os aprovados.

Recentemente, o presidente Lula sancionou a Lei 14.817, que visa à  valorização profissional das professoras e dos professores. Esta, em seu artigo 4º, inciso I, diz que o “ingresso na carreira” deve ser  “exclusivamente por concurso de provas e títulos, que aferirá o preparo dos candidatos com relação a conhecimentos pedagógicos gerais e a conhecimentos da área específica de atuação profissional, sempre considerada a garantia da qualidade da ação educativa”.

A nova lei estabelece que o ensino público deve ter plano de carreira docente, formação continuada e condições de trabalho adequada; o que não acontece nas redes estaduais nem para os profissionais efetivos, que dirá aos “temporários”.

  • Redes de ensino

O Plano Nacional de Educação determina, às redes de ensino, a possibilidade de contratar temporários até cerca de 10% do quadro de professoras e professores, para suprir a demanda por casos de afastamento dos efetivos, o que já não acontece há tempos.

Em primeiro lugar, defendemos a realização de concursos nos estados para suprir a demanda da educação pública como a melhor forma de melhorar a situação dos chamados contratos “temporários”. Mas enquanto isso não acontece, defendemos a extensão, aos “temporários”, de todos os direitos trabalhistas conferidos aos efetivos.

Também lutamos pela efetivação de todos os aprovados em concurso até suprir todas as necessidades da rede de ensino em cada estado. Além disso, por plano de carreira que contemple as necessidades e os anseios das professoras e dos professores, e salários que possam dar vida digna às trabalhadoras e aos trabalhadores da educação pública e estruturas adequadas para o processo de ensinar e aprender em todas as escolas.

 

Ø  Em defesa da greve nas Universidades Federais. Por Wagner Miquéias Damasceno

 

A greve dos professores nas Universidades Federais foi deflagrada no dia 15 de abril deste ano. Até agora, já são 39 Universidades em greve e 11 com indicativo de greve para os próximos dias. Os Técnicos Administrativos em Educação (TAEs) das universidades e institutos federais já estão em greve, desde 11 de março.

Mas por que os professores decidiram cruzar os braços e entrar em greve? Por três demandas negligenciadas pelo governo: (i) recomposição salarial, (ii) reestruturação da carreira docente e (iii) recomposição do orçamento das Universidades e Institutos Federais.

A exigência por recomposição salarial é uma tentativa de repor as perdas dos últimos 14 anos. Essas perdas salariais perfazem 39%, como demonstra estudo específico do DIEESE. Ora, exigir que seus salários sejam recompostos conforme a inflação – cujos índices são produzidos pelo próprio Estado – é um direito de todo trabalhador. Entretanto, a resposta do governo federal, ainda no ano passado, foi categórica: reajuste zero para 2024.

Aqueles que são contrários à greve dos professores e se perfilam ao lado do governo, argumentam que, no ano passado, o governo Lula concedeu 9% de reajuste salarial para os professores e técnicos das Universidades Federais. Entretanto, se esquecem que: (a) o que foi exigido por essas categorias era uma recomposição emergencial de 26,9%; (b) que o percentual de 9% já havia sido decidido no Projeto de Lei Orçamentária Anual de 2022, feito pelo governo anterior; (c) e que, ainda assim, Lula tentou reduzi-lo a 8% em 2023.

Achamos a proposta de reajuste zero inadmissível e incongruente com a campanha do presidente durante as eleições. Além de sermos responsáveis pela formação de profissionais para o mundo do trabalho (médicos, engenheiros, sociólogos, professores, advogados, físicos etc.) nós, professores universitários, somos os principais responsáveis pela produção científica no país. A pandemia da COVID-19 mostrou a importância da ciência e dos cientistas para toda a sociedade.

Outra exigência da greve é a reestruturação da carreira. Isso significa unir o vencimento básico, a retribuição por titulação e todos os demais benefícios numa só remuneração salarial acabando, assim, com os chamados “penduricalhos” que não são incorporados à aposentadoria. Significa, também, a luta por uma carreira única no magistério federal e a estruturação de uma carreira que nos permita progredir e alcançar o seu topo.

A terceira exigência é a recomposição do orçamento das Universidades Federais. Segundo relatório do Observatório do Conhecimento, as universidades federais vêm perdendo orçamento nos últimos dez anos.

Isso se traduz em universidades com falta de salas, salas sem ar condicionados e sem portas, cadeiras quebradas, obras inacabadas, redes de internet precárias, falta de laboratórios, laboratórios sem equipamentos etc.

Investir nas Universidades Federais é uma excelente forma de absorver uma força de trabalho especializada através de concursos públicos. E é uma importante medida para reverter a posição subordinada do Brasil na divisão mundial do trabalho.

O Brasil vem se cristalizando como uma neocolônia dos Estados Unidos, da União Europeia e da China, tornando-se um país cuja razão de existir é exportar matérias-primas produzidas ou extraídas em território nacional, para depois comprar desses países os produtos transformados com maior valor agregado. Não por acaso o carro chefe da economia brasileira, nas últimas décadas, tem sido a agropecuária, enquanto o papel da indústria de transformação no PIB declina.

Reindustrializar o país, investir em cadeias produtivas estratégicas e promover uma transição energética – fundamental para o enfrentamento à crise climática – não são tarefas exequíveis sem Universidades e Institutos Federais fortes e sem seus profissionais valorizados.

Dinheiro para isso tem, o problema reside na opção política feita pelo governo. O contingenciamento do orçamento das Universidades Federais obedece aos ditames do Arcabouço Fiscal, cuja razão de existir é restringir o investimento do Estado com serviços públicos para destinar bilhões de reais do dinheiro público para o pagamento de juros e amortizações da mal chamada dívida pública. Para termos uma ideia, em 2023, foram pagos R$ 1,89 trilhões para banqueiros e rentistas, enquanto foi destinado apenas R$ 129,4 bilhões para toda a Educação.

·        O que dizem os contrários à greve?

Quem diz que a greve docente favorece a extrema direita ignora um fato da realidade: governistas e bolsonaristas – dentro e fora das universidades – estão unidos tacitamente contra a greve.

Hostis às lutas dos trabalhadores e portadores de uma visão de mundo reacionária e anticientífica, os bolsonaristas se opõem à greve dos professores, ainda que, no plano do discurso, tentem usar dela para desgastar o governo Lula.

Já os petistas e governistas, desejam subordinar a luta dos professores à defesa do governo Lula. Alegam que a greve enfraquecerá um governo aliado e pavimentará o retorno da extrema-direita ao poder. O resultado dessa chantagem política é permitir que o governo Lula fique com as mãos livres para implementar um receituário neoliberal, enquanto os trabalhadores suportam resignados a perda de direitos e a corrosão do serviço público por temerem o retorno de Jair Bolsonaro ao poder.

Isso ajuda a entender, por exemplo, porque o Arcabouço Fiscal não encontrou a mesma resistência que encontrou a Lei de Teto de Gastos de Michel Temer (MDB). Em junho de 2016, Michel Temer criou a Lei do Teto de Gastos (PEC 241/16) para congelar investimentos nos Serviços Públicos Federais e, assim, garantir superávit para destinar bilhões aos banqueiros. Para aprová-la no congresso, Temer enfrentou atos nas principais capitais do país e enfrentou um ato em Brasília, com cerca de 20 mil manifestantes em dezembro de 2016.

Já o governo Lula criou e conseguiu aprovar o Arcabouço Fiscal – que nada mais é do que uma nova lei do teto de gastos semelhante à feita por Michel Temer – sem enfrentar qualquer resistência popular semelhante! Derrubar o Arcabouço Fiscal é parte inseparável da luta em defesa do serviço público.

Por fim, é preciso dizer que o que realmente fortalece a extrema direita não é a luta dos trabalhadores contra um governo que aplica políticas econômicas neoliberais, mas, sim, a aplicação de uma agenda econômica neoliberal. Quem tem o sincero temor de que a extrema direita possa retornar ao poder deve apostar na mobilização independente dos trabalhadores como a única forma de combater qualquer ameaça reacionária.

Afinal, a história já ensinou fartamente que não se combate a extrema direita através de projetos conciliatórios, mas mobilizando os trabalhadores em torno de seus interesses próprios que são os interesses da esmagadora maioria da sociedade.

 

Fonte: Correio do Brasil/A Terra é Redonda

 

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