sexta-feira, 31 de maio de 2024

Estudo do Inca indica desigualdades entre tipos de câncer e incidência de acordo com regiões do País

A mortalidade prematura por câncer no Brasil deve cair no período de 2026 até 2030. Essa é a previsão feita por pesquisadores do Instituto Nacional de Câncer (Inca), com base na mortalidade prematura observada no período anterior, de 2011 a 2015, para a faixa etária de 30 a 69 anos, a partir de dados do Sistema Nacional de Informações sobre Mortalidade (SIM). O estudo, intitulado Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável para o câncer podem ser cumpridos no Brasil? e publicado no início de janeiro, indica desigualdades entre tipos de câncer e incidência de acordo com as regiões do País.  

Mesmo que a previsão seja de diminuição da mortalidade prematura, há ainda o aumento de casos de câncer e, em alguns casos, até mesmo o aumento da mortalidade. Isso ainda é piorado de acordo com o sexo e a região: mulheres são as mais afetadas, com uma redução geral de 4,6%, frente aos 12% dos homens, enquanto o Nordeste apresenta as maiores taxas de mortalidade. Esse aumento está diretamente relacionado às mudanças de hábitos alimentares, sedentarismo, envelhecimento da população e aos padrões de vida devido ao aumento da urbanização. 

O estudo foi motivado pela Meta 3.4 dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Organização das Nações Unidas (ONU), que visa a “até 2030 reduzir em um terço a mortalidade prematura por doenças crônicas não transmissíveis via prevenção e tratamento e promover a saúde mental e o bem-estar”. 

·        Expectativa de vida

As pessoas atingidas por essas mortes prematuras estão na faixa etária mais produtiva. Isso é também muito motivado graças ao aumento da expectativa de vida, nas quais há um aumento das doenças crônicas não transmissíveis. É esperado que essas pessoas estejam vivas até os 70 anos de idade. A redução prevista para o Brasil, porém, está muito aquém dessa meta de 30%. 

“Ela está longe dos 30% de redução. Acho que é um dado importante, é uma boa notícia nós pensarmos que pode haver uma redução, mas não vai ser possível 30% de redução. A expectativa é que alcance alguma coisa da ordem de grandeza de 12%”, explica Maria Del Pilar Estevez Diz, médica oncologista e diretora do Corpo Clínico do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo. 

Entre a incidência de tipos de câncer, o de próstata ainda lidera entre os homens, enquanto os de colo do útero e mama lideram entre as mulheres. No cenário geral, os cânceres de pulmão, estômago e intestino são os mais diagnosticados na população geral. Este último, inclusive, é o que deve apresentar maior aumento de risco de óbitos prematuros, cerca de 10%. O estudo ainda estima que cerca de 46 mil novos casos de câncer de intestino sejam diagnosticados a cada ano entre 2023 e 2025. 

Em comparação, o câncer de pulmão apresenta dados alarmantes. Ele tem uma altíssima mortalidade por uma dificuldade de tratamento e diagnóstico. A redução esperada entre os homens é de quase 30%, enquanto para as mulheres há a previsão de um aumento da morte prematura de 1,1%. Isso evidencia o sucesso do trabalho – de décadas – feito para a redução do tabagismo, no qual os homens aderiram mais que as mulheres. 

“Isso mostra a necessidade de campanhas específicas para as mulheres. Para ver essa redução nas próximas décadas, nós vamos precisar desestimular o tabagismo entre as meninas e as mulheres”, diz Maria. Ela ainda complementa que é necessário “mudar um pouquinho a campanha, a gente tem que trabalhar para sensibilizar essa população para que ela não seja exposta ao cigarro”.

·        Prevenção

“Está prevista uma redução na ordem de grandeza de pelo menos 20% do câncer de próstata”, diz a médica. Na maior parte das regiões, essa redução é notada, o que é muito positivo. Isso se dá a partir de uma maior busca dos homens pelo diagnóstico e à procura pelo tratamento. O câncer de próstata, ainda o de maior incidência entre homens, é passível de cura desde que diagnosticado precocemente. 

Já no caso do câncer de mama, o cenário é bastante diverso.  As projeções indicam queda no Sudeste, estabilidade na região Sul e, na contramão, um aumento nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Esse aumento é decorrente do fato de as mulheres escolherem engravidar mais tarde e motivadas por hábitos alimentares e sedentarismo. “Nós temos uma quase estabilidade na mortalidade pelo câncer de mama nessas próximas décadas, uma redução de pouco mais de 10%. Nas regiões Norte e Nordeste, a gente não tem essa redução, enquanto na região Sudeste a gente tem uma redução de cerca de 20%”, explica a médica.

Esse tipo de câncer possui estratégias de prevenção. Como explica Maria, a detecção precoce do câncer de mama depende da adesão da população à mamografia, a ida regular ao ginecologista, mas também uma certa rapidez no diagnóstico. “Não basta a mulher ir ao médico, ela precisa ter acesso ao exame no momento certo, acesso ao médico quando tem alguma coisa, quando perceber algo anormal. A gente vê essa disparidade importante no Brasil”, explica. “Estimular a população a procurar o exame e, uma vez feito o diagnóstico, o acesso ao tratamento mais rápido possível”, complementa. 

A médica ainda chama atenção para o câncer de colo uterino. Esse tipo de câncer é totalmente prevenível, desde que descoberto precocemente. A ideia é ter esse câncer erradicado. Porém, ainda apresenta uma desigualdade muito grande entre as regiões: enquanto a redução nacional é esperada, a região Norte tem uma mortalidade muito elevada e fora da média nacional. Em 2015, morreram 28 pessoas por 100 mil, sendo que a previsão é de diminuição para 24 pessoas por 100 mil. A média nacional é de 11 óbitos por 100 mil.

·        Aumento dos casos

O câncer de intestino deve ter um aumento de cerca de 10%, em homens e mulheres, até 2030. A médica lembra que isso tem a ver com a transição epidemiológica pelo qual o País passa, ou seja, estamos assumindo um perfil de morte por câncer parecido com o dos países desenvolvidos. 

Uma dieta pobre em fibras influencia o aparecimento do câncer de intestino também. A má notícia é que a prevenção é menos estruturada no País. São necessários exame de fezes anualmente, ou exames menos acessíveis, como a retossigmoidoscopia e a colonoscopia. Maria lembra que não há uma rede estruturada nacionalmente para a realização desses exames, além de um preconceito em relação a eles.

“Infelizmente, a gente vê, sim, um aumento, tanto em homens quanto mulheres, da mortalidade pelo câncer colorretal. Na verdade, quando a gente vai olhar o Brasil como um todo, é o único câncer que está esperado um aumento até o final da década”, diz Maria. Novamente, o Nordeste lidera um aumento de 52% dos casos para os homens e 38% para as mulheres. Para efeito de comparação, o aumento é de 4,5% para os homens e 7,3% para as mulheres no Sudeste. “Aponta para a necessidade de uma de uma política muito específica e urgente”, diz a oncologista. Esse é um tipo de câncer prevenível, com mudanças de hábitos, mas também com exames e a retirada da lesão pré-maligna ou por meio do diagnóstico precoce. “A população precisa ser esclarecida sobre o risco e o Ministério da Saúde precisa estar desenvolvendo uma campanha específica para isso. Sabemos hoje que pelo menos 75% da população é atendida pela rede pública de saúde, então, para mudar esse quadro, são necessárias políticas públicas de saúde efetivas”, finaliza. 

 

¨      Pesquisa nos EUA revela medicamento capaz de reduzir mortes de pacientes com câncer de pulmão

Um estudo feito nos Estados Unidos mostra que um novo fármaco reduz pela metade o risco de morte de pacientes de câncer de pulmão já operados. Além disso, o medicamento, chamado Osimertinibe, permitiu sobrevida de cinco anos para cerca de 88% dos voluntários da pesquisa. O câncer de pulmão é o mais letal dos cânceres e mata cerca de 3 milhões de pessoas por ano, no mundo todo. A pesquisa foi divulgada em Chicago durante a maior conferência anual de especialistas em câncer, organizada pela Sociedade Americana de Oncologia Clínica (Asco).

Gilberto Castro, oncologista e chefe do grupo de Oncologia Clínica de Tórax, Cabeça e Pescoço do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (Icesp), explica as condições para ser tratado com o Osimertinibe: “Não é todo mundo que vai se beneficiar desse tipo de tratamento, são somente aqueles pacientes que têm esse tipo específico de câncer de pulmão que se chama adenocarcinoma e que apresenta a mutação do EGFR”.

EGFR é a sigla para Receptor do Fator de Crescimento Epidérmico, uma proteína presente num gene que sofre mutação durante o câncer de pulmão e é também um dos requisitos para o tratamento com o fármaco: “É um medicamento que já é utilizado há vários anos no tratamento de um tipo específico de câncer de pulmão, que é o câncer de pulmão que apresenta uma mutação, uma alteração lá no DNA do tumor, num gene que é responsável pela proteína EGFR; 25% dos pacientes com um tipo específico de câncer de pulmão, o adenocarcinoma, apresenta essa alteração molecular, a mutação do EGFR”. 

A descoberta do Osimertinibe não anula a necessidade de cirurgia nem da quimioterapia. “O que a gente já sabia anteriormente do tratamento dessa doença não deixou de ser válido. Ou seja, é preciso operar quando dá para operar, precisa fazer quimioterapia quando tem que fazer quimioterapia. A informação nova foi justamente esse ganho de sobrevida.” Nem todos os pacientes vão precisar desse tipo de tratamento. Apenas com a detecção da mutação do EGFR, via exame, é que o medicamento deve ser recomendado pelos médicos. 

·        Descobrindo o câncer de pulmão

O médico destaca que o câncer de pulmão normalmente demora a ser percebido por quem o tem e que isso prejudica as chances de cura. “Infelizmente, nos estágios iniciais, o paciente não apresenta sintomas que a gente observa naqueles pacientes que têm câncer de pulmão avançado. Os sintomas que os pacientes apresentam são sintomas gerais, como emagrecimento, perda de apetite e perda de energia para fazer as coisas. São sintomas muito discretos que as pessoas confundem com alguma pequena infecção, algum resfriado, uma gripe.” 

Por isso, a atenção e os cuidados com a saúde devem ser constantes. “Recomendações gerais de atenção à saúde, como ter uma dieta saudável, prática de exercício físico, evitar fazer sexo desprotegido são medidas de saúde que vão acabar prevenindo de outros cânceres. Além desses, deve-se evitar o tabagismo, que é o principal fator de risco para câncer de pulmão.

 

Fonte: Jornal da USP

 

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