Quem é o líder do Hamas em Gaza, Yahya
Sinwar?
O paradeiro de Yahya
Sinwar permanece como"local desconhecido", embora milhares de
soldados israelenses com apoio de drones, dispositivos eletrônicos de escuta e
informantes tentem descobrir sua localização desde os ataques de 7 de outubro
no sul de Israel.
Sinwa é o líder do
braço político do Hamas em Gaza e um dos homens mais procurados
por Israel.
Ele é considerado um
dos responsáveis pela operação que deixou mais de 1.200 pessoas mortas e na
qual 200 foram sequestradas.
"Yahya Sinwar é o
comandante… e ele é um homem morto", declarou o porta-voz das Forças de
Defesa de Israel (IDF), o contra-almirante Daniel Hagari, no início de outubro.
"Esse ataque
abominável foi decidido por Yahya Sinwar", disse o chefe do Estado-Maior
das IDF, Herzi Halevi. "Portanto, ele e todos os que estão abaixo dele são
homens marcados para morrer."
Isso inclui Mohammed
Deif, o líder da ala militar do Hamas, as Brigadas Izzedine al-Qassam.
Hugh Lovatt,
pesquisador sênior de política do Conselho Europeu de Relações Exteriores,
acredita que Deif foi responsável pelo planejamento do ataque de 7 de outubro,
pois foi uma operação militar, mas que Sinwar "provavelmente fez parte do
grupo que planejou e teve influência".
Israel acredita que
Sinwar, que é o segundo de fato em comando depois do líder do Hamas, Ismail
Haniyeh, foi encurralado no subsolo.
Em fevereiro de 2024,
o site de notícias saudita Elaph informou que ele havia deixado Gaza, citando
uma única fonte israelense. A informação foi negada pelas autoridades de
Israel.
·
Educação e prisões
Sinwar, amplamente
conhecido como Abu Ibrahim, nasceu em 1962 no campo de refugiados de Khan
Younis, em Gaza. Seus pais eram de Ashkelon, mas tornaram-se refugiados depois
do "al-Naqba" (a Catástrofe), o deslocamento em massa de palestinos
das suas casas ancestrais na Palestina durante a guerra que se seguiu à
fundação de Israel, em 1948.
Ele foi educado na
Escola Secundária para Meninos Khan Younis e concluiu um bacharelado em árabe
pela Universidade Islâmica de Gaza.
A cidade onde viveu
Sinwar, Khan Younis, era um centro de ativismo. Um “bastião” de apoio à
Irmandade Muçulmana, que era “um movimento massivo para jovens que iam para as
mesquitas na pobreza do campo de refugiados”, diz Ehud Yaari, fellow do
Washington Institute for Near East Policy. Ele entrevistou Sinwar na prisão
quatro vezes.
Tornou-se então um
centro importante para o Hamas, à medida que crescia o apoio a uma campanha
militar contra Israel.
Ibrahim Awad,
professor de Assuntos Globais na Universidade Americana do Cairo, diz que os
palestinos foram privados dos seus direitos e de uma "vida normal":
"O Hamas provavelmente não teria existido, não fosse pela ocupação
estendida, prolongada e brutal," diz.
Sinwar foi preso pela
primeira vez por Israel em 1982, aos 19 anos, por "atividades
islâmicas" e depois preso novamente em 1985. Nessa época, ele conquistou a
confiança do fundador do Hamas, o xeque Ahmed Yassin.
Os dois tornaram-se
“muito, muito próximos”, diz Kobi Michael, pesquisador sênior do Instituto de
Estudos de Segurança Nacional de Tel Aviv.
Dois anos depois da
fundação do Hamas, em 1987, ele criou a temida organização de segurança interna
do grupo, a al-Majd.
A Al-Majd tornou-se
famosa por punir pessoas acusadas de cometer ofensas morais - Michael diz que
ele tinha como alvo lojas que vendiam "vídeos de sexo" - e por matar
qualquer pessoa suspeita de colaborar com Israel.
Yaari diz que Sinwar
foi responsável por inúmeros “assassinatos brutais” de pessoas suspeitas de
cooperar com Israel. “Alguns deles com as próprias mãos, e ele tinha orgulho
disso, falando para mim e para outros.”
De acordo com
autoridades israelenses, Sinwar confessou mais tarde ter punido um suposto
informante fazendo com que o irmão o enterrasse vivo. Ele disse que fez o homem
terminar o trabalho usando uma colher em vez de uma pá.
“Ele é o tipo de homem
que consegue reunir ao seu redor seguidores, fãs, mas também muitos que
simplesmente têm medo dele e não querem brigar com ele”, diz Yaari.
Mustapha Kamel Al
Ayyid, da Faculdade de Economia e Ciências Políticas da Universidade do Cairo,
adverte que alguns relatos sobre a brutalidade dos líderes do Hamas são
exagerados e que é necessário uma dose de ceticismo em relação às afirmações
israelenses sobre a organização.
Em 1988, Sinwar teria
supostamente planejado o sequestro e assassinato de dois soldados israelenses.
Ele foi preso no mesmo ano, condenado a quatro penas de prisão perpétua por
Israel pelo assassinato de 12 palestinos.
·
Os anos na prisão
Sinwar passou grande
parte da sua vida adulta, mais de 22 anos, em prisões israelenses (de 1988 a
2011). E esse período, parte dele passado em confinamento solitário, parece ter
radicalizado-o ainda mais.
Ele se posicionou como
um líder entre os presos, impondo disciplina e negociando por eles com as
autoridades penitenciárias.
·
Hebraico
Enquanto estava preso,
Sinwar tornou-se fluente em hebraico fazendo a leitura dos jornais israelenses.
Ele deixou a prisão em
2011 como parte de um acordo que resultou na libertação de 1.027 prisioneiros
palestinos e árabes israelenses em troca de um único refém israelense, o
soldado das IDF Gilad Shalit.
Shalit foi mantido em
cativeiro durante cinco anos depois de ter sido sequestrado, entre outros, pelo
irmão de Sinwar, um alto comandante militar do Hamas. Depois disso, Sinwar
pediu mais sequestros de soldados israelenses.
A essa altura, Israel
já tinha retirado as tropas e desmanchado os assentamentos judaicos. O Hamas
estava no comando, tendo vencido uma eleição e depois eliminado seus rivais, o
partido Fatah de Yasser Arafat, atirando alguns dos seus membros do topo de edifícios.
·
Disciplina brutal
Quando Sinwar retornou
a Gaza, ele foi imediatamente aceito como líder, diz Michael. "Ele era
muito brutal, agressivo e carismático ao mesmo tempo."
Em 2013, foi eleito
membro do Bureau Político do Hamas na Faixa de Gaza, antes de se tornar o líder
em 2017.
O irmão mais novo de
Sinwar, Mohammed, também acabou desempenhando um papel ativo no Hamas.
A reputação de
crueldade e violência de Yahya Sinwar rendeu-lhe o apelido de O Açougueiro de
Khan Younis.
“Ele é um cara que
impõe uma disciplina brutal”, diz Yaari. “As pessoas sabiam no Hamas, e ainda
sabem, que se você desobedece Sinwar coloca sua vida em risco”.
Ele é considerado
responsável pela detenção, tortura e assassinato, em 2015, de um comandante do
Hamas chamado Mahmoud Ishtiwi, após acusações de peculato e homossexualidade.
Em 2018, ele afirmou
ter sobrevivido a uma tentativa de assassinato por parte de palestinos leais à
rival Autoridade Palestina na Cisjordânia.
·
A causa palestina
Não está provado que
Sinwar esteja por trás do ataque do Hamas em 7 de outubro. No entanto, como
mencionado anteriormente, as Forças de Defesa de Israel e outros avaliaram que
ele desempenhou um papel proeminente.
Al Ayyid acredita que
as circunstâncias criadas pela retaliação de Israel ao ataque geraram um “ganho
para a causa palestina”.
"Não estou
julgando do ponto de vista moral, mas sim do ponto de vista político... A
opinião pública mundial virou-se a favor dos palestinos e a imagem de Israel
ficou bem manchada…
“Israel está sendo
julgado perante o Tribunal Internacional de Justiça por cometer o crime de
punição coletiva”.
O professor da
Universidade do Cairo também destaca o apoio dos governos do Reino Unido e dos
EUA a uma solução de dois Estados. O primeiro-ministro israelense, Benjamin
Netanyahu, manifestou, no entanto, sua oposição a qualquer reconhecimento
“unilateral” de um Estado palestino.
Já Ibrahim Awad, da
Universidade Americana do Cairo, minimiza a importância de qualquer pessoa ou
de Sinwar na causa palestina global. Ele diz que as pessoas que protestam em
todo o mundo e os governos têm mais poder para criar condições para que os palestinos
tenham o seu próprio Estado.
"No quadro geral,
nem sequer é o Hamas... Não é a Autoridade Palestina... Essas são instituições
intermediárias que conectam as populações e os estrangeiros, e a solidariedade
que encontram em muitos países e continentes em todo o mundo. Esses - o povo
palestino, as pessoas e os governos estrangeiros solidários com eles – são de
fato os principais atores”.
Ele diz que o motivo
da popularidade do Hamas é a oposição que representa a Israel: “É a ideia de
resistência”.
·
E depois?
Muitos integrantes do
sistema de defesa e segurança de Israel acreditam ter sido um erro fatal
permitir que Sinwar saísse da prisão como parte de uma troca de prisioneiros.
Em Maio de 2021,
ataques aéreos israelenses tiveram como alvo a casa e o escritório dele na
Faixa de Gaza. Em Abril de 2022, em discurso transmitido pela televisão, ele
encorajou as pessoas a atacar Israel por todos os meios disponíveis.
Especialistas
identificaram-no como uma figura-chave que liga o gabinete político do Hamas ao
braço armado do grupo, as Brigadas Izzedine al-Qassam, que liderou os ataques
de 7 de Outubro no sul de Israel.
No entanto, matar
Sinwar seria mais uma “vitória de relações públicas” para Israel do que de fato
teria impacto no movimento, diz Lovatt.
"Claramente, ele
seria uma perda... mas seria substituído, e existem estruturas para fazer isso.
Não é como matar Bin Laden. Existem outros líderes políticos e militares
importantes dentro do Hamas."
Talvez a grande
pergunta continue a ser esta: o que acontecerá a Gaza quando Israel terminar
sua campanha militar para erradicar o Hamas, e quem ficará no comando?
E conseguirão impedir
que se torne mais uma vez uma plataforma de lançamento de ataques a Israel
capazes de desencadear o tipo de retribuição e destruição massivas a que
estamos assistindo agora?
Fonte: BBC News Mundo
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