O homem que desafiou as ambições coloniais
alemãs
Levado à Alemanha para
ser exposto em um "zoológico humano", camaronês Quane Martin Dibobe
acabou se tornando um ativista pioneiro dos direitos humanos, desafiando a
relação de exploração do país com suas colônias.
Quem foi Quane Martin
Dibobe?
Dibobe nasceu perto de
Douala, Camarões, em 1876, onde seu pai ocupava um cargo político local. Ele
foi educado em uma missão em Camarões, onde aprendeu a ler e a escrever em
alemão. Ele chegou à Alemanha em meados da década de 1890 para participar da Grande
Exposição Industrial de Berlim.
• Como foi a primeira exposição colonial
alemã de 1896?
A feira tinha como
objetivo mostrar que a Alemanha era uma "terra de oportunidades
ilimitadas". Havia um esforço conjunto de propaganda para convencer os
alemães de que era correto o país ter colônias, o que incluía exposições
etnológicas da "vida cotidiana nas colônias" – ou o que hoje
chamaríamos de zoológico humano.
Dibobe foi apenas um
dos mais de 100 africanos que chegaram a Berlim – alguns levados à força,
outros atraídos por promessas de pagamentos. Eles eram Herero, Nama e Massai,
entre outros povos, vindos de territórios alemães que hoje são os países
Namíbia, Togo, Tanzânia e Camarões.
Dibobe era conhecido
apenas como "Número 76". Na realidade, ele e outros não eram nada
parecidos com os "nativos primitivos" apresentados nessas
"exposições etnológicas".
Ao longo de seis
meses, cerca de 7 milhões de alemães compareceram à exposição para ver Dibobe e
outros como ele serem forçados a representar uma vida imaginada – cozinhando,
dançando, caçando – em uma falsa aldeia africana.
Dibobe e muitos outros
foram obrigados a se submeterem a exames físicos humilhantes realizados por
estudantes da incipiente ciência racial alemã, para provar a já desacreditada
pseudociência da eugenia.
• O que Dibobe fez após a exposição?
Dibobe ficou em
Berlim, o que não era incomum. Os poucos africanos eram geralmente aceitos em
espaços cosmopolitas e podiam encontrar empregos ou estágios. Dibobe tornou-se
artífice, depois ingressou na companhia ferroviária de Berlim. Ele se casou com
a filha de seu locatário, após o missionário que o havia batizado em Camarões
ter confirmado sua identidade.
Em 1902, Dibobe
tornou-se maquinista do metrô de Berlim – o primeiro negro nessa posição em
toda a Alemanha, um trabalho de prestígio na época – e tornou-se uma
celebridade.
Mais tarde, ele
escreveu: "Por meio de eficiência e conduta impecável, ganhei um cargo de
confiança".
• Dibobe retornou a Camarões?
As autoridades
coloniais enviaram Dibobe de volta a Camarões em 1907 para prestar consultoria
sobre a construção de uma linha ferroviária.
Dibobe ficou chocado
com o que viu: os espancamentos, a expropriação, o racismo e os maus-tratos
sofridos pelos camaroneses nas mãos das empresas alemãs.
A infraestrutura alemã
em Camarões existe até hoje, e alguns historiadores falam de uma nostalgia dos
locais pela era alemã se comparada às práticas de exploração da França e da
Grã-Bretanha, que assumiram as colônias alemãs depois de 1919, com a derrota do
país na Primeira Guerra Mundial.
• Qual era a situação dos súditos
coloniais alemães?
De volta à Alemanha,
Dibobe participou de greves de trabalhadores, apoiou os sociais-democratas e
participou ativamente da organização da Liga dos Direitos Humanos, formada em
1914.
À medida que mais
pessoas negras chegavam a cidades como Berlim, Hamburgo e Bremen, Dibobe e
muitos outros que permaneceram na Alemanha se viram em uma situação semelhante:
em uma vida sem cidadania e sem direitos.
As autoridades não
tinham a intenção de conceder aos habitantes das colônias alemãs os mesmos
direitos dos cidadãos alemães, pois isso significaria que a lei teria de ser
aplicada igualmente nas colônias.
Assim, em meados de
1919, em nome dos africanos que viviam nas colônias alemãs, Dibobe e 17 outros
afro-alemães fizeram uma petição ao governo pedindo representação, direitos
iguais e o fim do trabalho forçado, entre outros 32 pontos, ao mesmo tempo em que
juraram lealdade à República de Weimar.
• O que aconteceu com a petição de Dibobe?
Como a Alemanha havia
cedido suas colônias a outras nações europeias de acordo com o Tratado de
Versalhes, as exigências da petição nunca foram reconhecidas.
Dibobe perdeu o
emprego na ferrovia e tentou retornar a Camarões em 1922. Entretanto, os novos
governantes coloniais franceses recusaram sua entrada por acreditarem que ele
causaria distúrbios. Dibobe, de 45 anos, foi para a Libéria e não deixou
rastros. Presume-se que ele tenha morrido por lá.
Como resultado, Dibobe
não é muito conhecido em Camarões, já que a maior parte do seu legado está
associado ao tempo que passou na Alemanha.
Mais de um século
depois, a petição de Dibobe é considerada um dos documentos políticos mais
importantes da migração africana do início do século 20.
Fonte: Deutsche Welle
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