quarta-feira, 31 de janeiro de 2024

Pessoas trans podem escolher onde cumprir pena, reforça nota técnica da Defensoria Pública da Bahia

Uso do nome social, tratamento hormonal e escolha do local para cumprimento da pena. Esses são alguns dos direitos elencados na nota técnica emitida pela Defensoria Pública da Bahia (DP-BA) para garantir dignidade às pessoas trans dentro do sistema prisional do estado. O documento foi enviado às secretarias de Administração Penitenciária (SEAP) e de Justiça e Direitos Humanos (SJDH).

Elaborada pela Coordenação de Direitos Humanos e Núcleo de Defesa das Mulheres (Nudem), a nota técnica foi motivada após sucessivas violências sofridas por uma mulher trans custodiada no Conjunto Penal de Serrinha. A última ocorrência foi uma tentativa de transferência compulsória para o Conjunto Penal Feminino, em Salvador. O caso foi acompanhado pela DP-BA, que conseguiu garantir a efetivação do direito de escolha do local de cumprimento da pena pela detenta.

De acordo com a Resolução 366/2021 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), as pessoas trans privadas de liberdade devem ser consultadas sobre o local para cumprimento de pena. “Não há uma opção aberta ao Poder Público sobre como tratar esse grupo, tampouco um permissivo de escolha discricionária do magistrado ou da direção de unidade prisional quanto ao local de custódia de pessoas trans”, reforça a nota técnica.

O documento também recomenda que a SEAP garanta às pessoas trans o uso do nome social, pronome adequado à identidade de gênero, tratamento hormonal em conformidade com o processo transexualizador regulamentado pelo SUS; e salvaguarda à expressão da identidade de gênero e seus caracteres secundários, como roupas conforme o gênero e manutenção de cabelos.

A nota técnica apresenta ainda conceitos importantes para o acolhimento de pessoas transexuais, como identidade de gênero, orientação sexual e sexo biológico; e diversas normativas que versam sobre a não discriminação, inclusão e igualdade de gênero. 

Considerando a importância do tema, a Defensoria pede que o documento seja encaminhado às diretorias de todas as unidades prisionais do estado, com a maior brevidade possível.

TRANSFERÊNCIA COMPULSÓRIA

Com a emissão da nota técnica, a Defensoria espera evitar que outras pessoas trans sejam submetidas ao mesmo tipo de violência infringidas a uma interna de Serrinha. Desde que deu entrada na unidade prisional, ela teve o cabelo cortado compulsoriamente, o uso do nome social, constantemente, desrespeitado e foi impedida de usar roupas femininas.

Após ofício e reunião da DP-BA com a direção do presídio, foi criada uma aba no sistema interno para inserção do nome social e disponibilizada terapia hormonal para a interna. “Ela também relatou uma melhora quanto à forma de tratamento pelos monitores”, conta a defensora Beatriz Soares, que atuava na unidade. Contudo, no segundo semestre do ano passado, foi feito um pedido de transferência da interna para o Conjunto Penal Feminino de Salvador.

Ao tomar conhecimento do processo, a DP-BA ouviu a custodiada, que reafirmou o desejo de permanecer no Conjunto Penal de Serrinha, sobretudo, porque possibilitaria a manutenção do vínculo familiar. “A mãe dela mora em Serrinha e é a única visita que ela recebe. Caso houvesse transferência para Salvador, a genitora não teria condições materiais e logísticas de visitá-la com frequência”, conta a defensora pública.

Com isso, a Defensoria se opôs à transferência compulsória por violar o direito de escolha da pessoa trans. Em consonância com os fundamentos alegados pela DP-BA, a Corregedoria dos Presídios do Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA) barrou a transferência e determinou a permanência da custodiada na unidade prisional de Serrinha.

 

Ø  Brasil registrou 145 assassinatos de pessoas trans em 2023

 

O Brasil registrou 145 assassinatos de pessoas transexuais, travestis e pessoas não binárias no ano de 2023, segundo o relatório anual da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra). Os dados foram divulgados nesta segunda-feira, 29, Dia Nacional da Visibilidade Trans.

A pesquisa aponta que 2023 apresentou um crescimento de 10,7% em comparação com 2022, que teve um número de 131 mortes. Das 145 mortes registradas no ano passado, cinco foram cometidas contra pessoas trans defensoras de direitos humanos, 136 contra travestis e mulheres trans e nove contra homens trans e pessoas transmasculinas.

Número de homicídios de pessoas trans:

  • 2023: 145 casos
  • 2022: 131 casos
  • 2021: 140 casos
  • 2020: 175 casos
  • 2019: 124 casos
  • 2018: 163 casos
  • 2017: 179 casos

Com esses dados, o país tem uma média de 151 assassinatos por ano e 13 casos por mês.

“A ausência de dados governamentais é um problema sério que precisa de atenção. Dados sobre essas violências seguem inexistentes ou insuficientes quando comparadas com o que é reportado pelos canais de notícias. E é urgente saber onde está sendo ‘perdida’ essa informação”, diz trecho do relatório.

Em 2023, a média de homicídios foi de 12 por mês. Os meses de janeiro (17), fevereiro (13), março (15), outubro (14), novembro (16) e dezembro (13) assassinatos superiores à média do ano.

São Paulo é o estado com maior número de registros de mortes de pessoas trans. Segundo o levantamento, 65% (90 casos) mortes aconteceram fora das capitais dos estados, em cidades do interior. 

A série histórica da Antra, entre 2017 e 2023, também listou os estados que mais mataram pessoas trans:

  • São Paulo: 135 casos
  • Ceará: 96 casos
  • Bahia: 89 casos
  • Rio de Janeiro: 83 casos
  • Minas Gerais: 80
  • Pernambuco: 68 casos
  • Paraná: 54 casos
  • Pará: 41 casos
  • Amazonas e Paraíba: 38 casos
  • Goiás: 36 casos

Além disso, o estudo identificou cinco mulheres travestis brasileiras que foram assassinadas no exterior, sendo duas na Itália, duas na Espanha e uma no Paraguai. Entre 2017 e 2023, 17 travestis e mulheres trans foram mortas fora do Brasil.

 

Ø  STJ mantém júri de acusado de matar participante da Parada LGBT+

 

O vice-presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro Og Fernandes, no exercício da presidência, indeferiu pedido de liminar em habeas corpus que pretendia suspender a sessão do tribunal do júri convocada para analisar o caso de um homem acusado de integrar organização criminosa e matar um participante da Parada do Orgulho LGBT+ de São Paulo, em junho de 2009.

De acordo com a decisão de pronúncia do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), o réu faria parte de um grupo que praticava crimes motivados por intolerância. No dia do evento, eles teriam explodido bombas ao longo do trajeto da parada e agredido a vítima até a morte com socos, chutes e golpes de barra de madeira.

Em habeas corpus dirigido ao STJ, a defesa alega que faltam indícios de participação do réu no crime e pede o restabelecimento da decisão do juízo de primeiro grau, que havia optado por não pronunciá-lo. A defesa argumenta ainda que a pronúncia se baseou exclusivamente em elementos do inquérito policial e que o TJ-SP, ao reformar a decisão de primeiro grau, teria aplicado ao caso o princípio in dubio pro societate – o que, em seu entendimento, seria inconstitucional.

No pedido de liminar, a defesa requereu a suspensão da sessão do tribunal do júri, marcada para os dias 7 a 9 de agosto. No entanto, segundo Og Fernandes, o caso não apresenta nenhuma das hipóteses que poderiam justificar o deferimento imediato do pedido.

Em relação à acusação de associação criminosa, Og Fernandes verificou a existência de relatos e materiais apreendidos que indicariam, na visão do tribunal paulista, a atuação prévia do grupo com a intenção de praticar crimes de intolerância contra homossexuais e negros.

"Não se percebem, portanto, os requisitos para a concessão do pedido liminar, já que ausente constrangimento ilegal verificado de plano. Fica reservada ao órgão competente a análise mais aprofundada da matéria por ocasião do julgamento definitivo", concluiu o ministro.

Com a decisão, a sessão do tribunal do júri, por enquanto, está mantida. O julgamento do mérito do habeas corpus caberá à Sexta Turma, sob a relatoria do ministro Rogerio Schietti Cruz.

 

Fonte: BN/A Tarde

 

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