terça-feira, 2 de janeiro de 2024

Como ficou o panorama mundial do armamento nuclear em 2023?

O ano de 2023 foi um dos mais críticos em relação à situação global no setor de armamento nuclear, desde o colapso dos tratados de controle de armas nucleares até os renovados temores de que o mundo possa se aproximar do uso desse tipo de armas à luz do conflito na Ucrânia.

O sistema de controle de armas nucleares desmoronou significativamente em 2023, envolvendo as duas principais potências nucleares: Rússia e Estados Unidos. Em fevereiro, o presidente russo, Vladimir Putin, anunciou durante seu discurso à Assembleia Federal que a Rússia interromperia sua participação no Tratado de Redução de Armas Estratégicas, o último acordo de controle de armas nucleares entre os dois países.

O presidente russo afirmou que Washington estava pressionando Moscou a cumprir seus compromissos sob o pacto, enquanto os EUA não o faziam. Putin deixou claro que a Rússia estava suspendendo, não encerrando, sua participação no acordo. Desde então, os riscos relacionados a um possível conflito nuclear se exacerbaram com a contraofensiva de Kiev anunciada repetidamente por autoridades ucranianas, afirmou o pesquisador principal do Centro de Não Proliferação e Desarmamento de Viena, Nikolai Sokov, à Sputnik.

A ameaça de uso nuclear era a mais alta desde 1962. Na Rússia, começou o debate público sobre o uso limitado de armas nucleares. Por ser a primeira vez na era nuclear que isso foi discutido tão abertamente e contundentemente, foi um fato significativo, destacou o especialista. O fracasso da ofensiva ucraniana estabilizou a situação nuclear.

"Vale a pena notar que nunca antes foi discutido na Rússia o uso de armamento nuclear contra a Ucrânia; se armas nucleares forem usadas, será contra a OTAN [Organização do Tratado do Atlântico Norte], diretamente ou indiretamente", explicou Sokov. Outro golpe na estrutura mundial de controle de armas nucleares ocorreu no final do ano como resultado da recusa de Washington em ratificar o Tratado de Proibição Completa de Testes Nucleares (TPCEN), do qual posteriormente a Rússia revogou a ratificação.

Apesar das numerosas garantias dadas por autoridades russas de que Moscou continuaria respeitando a moratória de testes nucleares, alguns países ocidentais criticaram a medida e instaram a Rússia a reconsiderar sua posição, lembrou o pesquisador.

Comentando todos os acontecimentos sobre o controle de armas nucleares em 2023, o diretor do Instituto Liu para Questões Globais da Universidade da Colúmbia Britânica, M. V. Ramana, comentou à Sputnik que os riscos de um confronto militar direto entre Moscou e Washington continuam. "Os riscos de uma guerra nuclear entre EUA e Rússia sempre existiram e continuam existindo", apontou o especialista.

·        Compartilhamento de armas nucleares atinge uma nova dimensão

No ano passado, a Rússia também posicionou suas armas nucleares fora do país, o que, segundo muitos funcionários, reflete os acordos de compartilhamento nuclear dos Estados Unidos com seus aliados na Europa. No final de março, o presidente russo anunciou que Moscou e Minsk concordaram em implantar armas nucleares táticas russas em Belarus, sem violar os compromissos russos de não proliferação.

O acordo inclui também a construção de instalações de armazenamento e treinamento. A decisão foi tomada em parte como resposta à crescente presença de armas nucleares dos Estados Unidos na OTAN, informaram autoridades russas. A troca nuclear entre Rússia e Belarus foi uma das mudanças-chave no cenário mundial de armas nucleares em 2023, destacou Sokov, acrescentando que esse acordo bilateral foi "subestimado".

"Qualquer mudança na política nuclear é um sinal importante e muito tangível. O peso das armas nucleares aumentou e, além disso, a atenção está voltada para o Leste Europeu. Dadas as crescentes tensões na região, incluindo o mar Báltico, eu prestaria muita atenção", continuou o especialista.

Enquanto isso, os meios de comunicação informaram, citando documentos orçamentários da Força Aérea dos Estados Unidos para o ano fiscal de 2024, que os EUA poderiam estar planejando implantar armas nucleares no Reino Unido, na base de Lakenheath, o que representaria o retorno das armas nucleares dos Estados Unidos ao solo britânico pela primeira vez em 15 anos, afirmou a representante oficial do Ministério das Relações Exteriores da Rússia, Maria Zakharova.

·        Arsenais cada vez mais poderosos

Com o aumento das tensões entre as principais potências mundiais, todas elas se envolveram profundamente na modernização de suas capacidades militares, incluindo as nucleares. Washington deu vários passos nessa direção. Em março, o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, destinou US$ 37,7 bilhões (R$ 182,9 bilhões) para a modernização das empresas nucleares no orçamento de defesa para o ano fiscal de 2024.

Meses depois, o Pentágono anunciou que os Estados Unidos buscariam o desenvolvimento de uma versão moderna da bomba nuclear de queda livre B61. Na opinião de Sokov, os Estados Unidos continuarão se esforçando para modernizar suas capacidades nucleares.

"Os Estados Unidos entraram na via da nova modernização, que levará muito tempo. Essas coisas não são feitas rapidamente. Estamos diante de uma série de melhorias qualitativas", afirmou o especialista.

A Rússia também fez esforços significativos para melhorar as capacidades de combate de suas forças nucleares estratégicas. Em setembro, o país colocou em serviço o sistema Sarmat, uma arma com capacidade nuclear que reforçará consideravelmente suas Forças de Mísseis Estratégicos, informou a agência espacial estatal russa Roscosmos.

·        Corrida armamentista

De acordo com especialistas, a China é outro ator fundamental em 2023. Os Estados Unidos expressaram crescente preocupação com o armamento nuclear chinês, acusando Pequim de "falta de transparência" em relação à sua suposta rápida acumulação de armas nucleares. Washington advertiu que a China continuará sendo um dos principais jogadores nesse campo.

O Pentágono apontou em seu relatório de outubro ao Congresso que a China já possuía 500 ogivas nucleares em 2023 e que se previa que teria mais de 1.000 ogivas nucleares operacionais em 2030. "O crescente arsenal nuclear da China significa que o país não será suscetível às ameaças dos EUA ou da OTAN", argumentou Ramana.

O Irã já tem capacidade para desenvolver sua própria bomba nuclear?

O Irã e seu controverso programa nuclear continuam em foco desde que o ex-presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anunciou a retirada de seu país do Plano de Ação Conjunta Abrangente (JCPOA) em 2018. A questão atraiu ainda mais atenção em 2023, no meio do impasse nas negociações sobre a renovação do acordo e os supostos avanços de Teerã no enriquecimento de urânio em níveis elevados.

Em outubro, a Agência Internacional de Energia Atômica afirmou em um relatório que o Irã havia enriquecido urânio até 60% de pureza, o que se aproxima do grau armamentista, para três bombas nucleares. "Não há dúvida de que o Irã pode se armar nuclearmente: tem tudo para isso, exceto uma decisão política (...) O principal obstáculo são as sanções econômicas, mas é possível resolvê-lo com urgência suficiente e vontade política", explicou Sokov.

 

Ø  Irã vê tentativa dos países ocidentais de 'transferir a culpa' sobre o enriquecimento de urânio

 

Teerã reagiu à declaração dos EUA e de três países europeus, que criticou por afirmarem que o enriquecimento de urânio do Irã não tem fins civis.

O Irã rejeita a declaração dos EUA e da Alemanha, França e Reino Unido sobre o programa nuclear do Irã, disse o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores iraniano, citado na sexta-feira (29) pela agência iraniana Tasnim.

Nasser Kanaani reiterou em um comunicado divulgado na sexta-feira (29) que o enriquecimento de urânio a 60% nas instalações nucleares do Irã sempre teve o objetivo de atender às necessidades nucleares pacíficas do país, que Teerã está bem ciente de seus direitos e compromissos, e que continuará cooperando com a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), que supervisiona essas atividades.

Kanaani disse que o afastamento das negociações e o levantamento de "questões irrelevantes que levaram à situação atual" não permitem que Washington e a "troika europeia" tenham o direito de fazer tais declarações sobre o programa nuclear do Irã, e apelou aos quatro países para reavaliar suas próprias ações relativamente às sanções, em vez de "transferir a culpa e fazer declarações políticas".

"Como sempre, a República Islâmica do Irã acredita que conversas e diplomacia são a melhor maneira de dissipar preocupações falsas sobre o programa nuclear do Irã", afirmou o porta-voz, acrescentando que o ônus agora recai sobre os EUA e a troika europeia em "tomar as decisões políticas necessárias a esse respeito, interrompendo a política de emitir declarações e exercer pressões inúteis", escreve a Tasnim.

 

Ø  Presidente sul-coreano defende postura que 'bloqueará completamente' ambições nucleares de Pyongyang

 

Yoon Suk-yeol falou de um posicionamento mais agressivo contra Pyongyang para atingir "uma paz verdadeira e duradoura baseada na força".

Yoon Suk-yeol, presidente da Coreia do Sul, disse no seu discurso de Ano Novo de domingo (31) que seu país e os EUA vão implementar uma postura de defesa reforçada na primeira metade do ano, em uma nova resposta dura à Coreia do Norte.

Segundo ele, a postura "bloqueará completamente" as ameaças nucleares e de mísseis da Coreia do Norte, e a Coreia do Sul conseguirá alcançar "uma paz verdadeira e duradoura baseada na força".

O discurso também abordou tópicos como a moradia, educação e economia.

Em julho, Seul e Washington formaram um órgão chamado Grupo de Consulta Nuclear (NCG, na sigla em inglês) EUA-Coreia do Sul, que os dois lados descreveram como tendo a intenção de demonstrar o compromisso dos EUA em defender a Coreia do Sul com seu arsenal nuclear.

O grupo realizou sua segunda reunião em 16 de dezembro, onde os EUA reiteraram que "qualquer ataque nuclear da RPDC contra a República da Coreia será enfrentado com uma resposta rápida, esmagadora e decisiva".

Ao mesmo tempo, tem crescido a dúvida entre o público sul-coreano sobre o verdadeiro compromisso dos EUA em ajudar Seul contra Pyongyang e seu investimento em armas nucleares.

 

Fonte: Sputnik Brasil

 

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