domingo, 31 de dezembro de 2023

PT e PL repassaram quase R$ 300 mil a Lula e Bolsonaro em 2023; outros ex-presidentes não recebem

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) recebem pagamentos mensais de seus respectivos partidos. Entre abril e outubro, Bolsonaro foi remunerado pelo PL sete vezes, somando R$ 200 mil. Por sua vez, Lula foi beneficiado com nove repasses do PT, de fevereiro a outubro, totalizando R$ 96 mil. Os vencimentos pagos ao atual presidente e a seu antecessor são uma exceção, já que nenhum outro ex-chefe de Estado possui benefício semelhante em suas legendas. Procurados, o PL não se manifestou, enquanto o PT argumentou que recurso é para pagar aluguel de imóvel (veja abaixo).

As informações foram levantadas pelo Estadão junto às prestações de contas anuais do MDB, PL, PSDB, PT e PTB enviadas neste mês ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Os documentos encaminhados à Justiça Eleitoral compreendem o período de outubro de 2022 a outubro de 2023. Nesse intervalo, não foram identificados pagamentos em benefício dos ex-presidentes José Sarney (MDB), Fernando Collor (PRD, antigo PTB), Fernando Henrique Cardoso (PSDB), Dilma Rousseff (PT) e Michel Temer (MDB).

A legislação brasileira não impõe aos partidos a obrigação de pagar salários a presidente ou ex-presidentes. Portanto, as remunerações recebidas por Lula e Bolsonaro não derivam de suas passagens pelo Palácio do Planalto, mas sim de suas funções dentro de seus respectivos partidos. Lula e Bolsonaro ocupam as posições de presidentes de honra no PT e no PL, respectivamente. Além deles, a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro também desempenha um papel na estrutura partidária como presidente do PL Mulher.

Entre fevereiro e outubro, Bolsonaro e Michelle receberam um total de R$ 437 mil pelas responsabilidades que desempenharam dentro do PL. O registro financeiro do partido classificou essa transferência como “serviços técnicos-profissionais”. O salário atual de cada um como dirigente partidário é de R$ 30.483,16. Os gastos com assessores, advogados e outras despesas, como deslocamentos e alimentação, não estão inclusos nesse valor. O PL foi procurado pela reportagem, mas não retornou.

Além de seu salário no PL, Bolsonaro também recebe a aposentadoria do Exército, de cerca de R$ 12 mil por mês. Além disso, usufrui dos benefícios da aposentadoria como ex-deputado, o que corresponde a mais de R$ 30 mil mensais. Como ex-presidente da República, ainda tem direito a quatro servidores para desempenhar funções de segurança e apoio pessoal, dois assessores pessoais, dois veículos oficiais e dois motoristas.

•        Repasses a Lula são para pagar aluguel em SP, diz PT

O PT, por sua vez, informou, em nota, que as transferências mencionadas pela reportagem referem-se ao custeio de parte do aluguel de imóvel que, desde 2022, serviu como residência e local de trabalho do presidente de honra do PT, Luiz Inácio Lula da Silva, em São Paulo. “Todas estas transferências foram feitas com recursos de arrecadação própria do partido, conforme declarado à Justiça Eleitoral, sem uso de Fundo Partidário ou outras fontes”, diz o texto.

O partido esclareceu também que assumiu uma parcela do custo do aluguel, tendo em vista que o imóvel deveria prover as necessidades de segurança, privacidade, espaço para trabalho de assessores e para reuniões políticas inerentes às atividades de seu presidente de honra. “Desde outubro último, o PT assumiu integralmente o contrato de locação e o pagamento do contrato de aluguel, cessando então as transferências registradas na Justiça Eleitoral”.

 

       “Patafísica do poder” explica a existência de tantos personagens tóxicos na política

 

Para quem estancou a queda da nação no abismo, são fracos neste fim de ano os índices de popularidade de Lula. Fracas também as explicações. A campanha governamental “O Brasil é um só povo”, recém-lançada, não desautoriza uma hipótese de natureza patafísica: existiriam dois Brasis.

No primeiro, real, Lula é legítimo presidente da República, com dezenas de milhões de seguidores. No segundo, irreal, o outro perdeu a eleição, mas ainda não lhe caiu a ficha nem a de seus aderentes, o que pavimenta o caminho patafísico dos absurdos.

Patafísica é a “ciência” das soluções imaginárias, uma invenção de literatos franceses para jogar criativamente com distorções da realidade. Nesse país distorcido por hipótese, sombra projetada sobre o real, o portador da caveira de burro nada em seco, o pão lhe caindo com leite condensado para baixo. Ainda assim, trafega nos índices e nas barricadas da direita. Aos contratempos: na posse de Milei, tentou bancar o papagaio de pirata numa foto de presidentes, foi por eles repelido. Um vexame, que não pareceu constrangê-lo.

Mas a hipótese deixa intocado o enigma dos personagens tóxicos na política: Bozo teratológico, Milei que diz ter “filhos de quatro patas”, Maduro em colóquio com passarinhos, Trump que prega abertamente a ditadura etc.

Nenhuma doutrina salvífica explica as bizarrices, apenas o traço comum de uma tirania prometida e, religiosamente, aguardada.

É que existe um laço íntimo, místico entre tiranos e escravos: “O grande segredo do regime monárquico consiste em enganar os homens, travestindo com o nome de religião o temor com que os mantém acorrentados; de maneira que lutam por sua servidão como se tratassem de sua salvação” (Espinosa, “Tratado Teológico-Político”).

Para o filósofo, isso se deve à paixão triste, “um complexo que reúne o infinito dos desejos, a perturbação da alma, a cupidez e a superstição”. O tirano, para triunfar, precisa da alma triste e vice-versa, pois o que os une é “o ódio à vida, o ressentimento contra a vida”.

A palavra tirania, obsoleta, retorna na afirmação da vice-presidente argentina de que é preciso um arrocho tirânico para repor nos eixos o seu país. É um toque sombrio e mais opressivo do que autocracia, com a qual os analistas políticos vestem as inclinações da ultradireita.

Mas tirano e autocrata rezam pela mesma cartilha da violência antidemocrática, atrativa para o sujeito do ressentimento, adulto ou jovem, que faz da estreiteza vingativa seu único afeto. Uma besta triste, de tocaia no pior. Não com volátil estado de ânimo, mas com tristeza como paixão profunda, afecção contagiosa da alma que faz cadeia com medo, inveja, ódio e crueldade.

É uma negação da alegria vital, da qual não dá conta nenhum psicologismo, nenhuma política. Talvez a patafísica, quem sabe?

 

       Um desafio! A difícil aproximação de Lula com os eleitores evangélicos

 

O segundo turno das eleições para a Presidência da República, em 2022, foi marcado por intensos discursos com apelo religioso tanto pelo atual presidente, Lula da Silva, quanto pelo seu então adversário, o ex-mandatário Jair Bolsonaro. Apesar de o derrotado nas urnas contar com o apoio de vários líderes evangélicos, a preferência de eleitores sem religião pode ter sido decisiva para o retorno do petista ao comando do Executivo.

Lula pode ter aberto uma vantagem superior a cinco milhões de votos para Bolsonaro entre os eleitores que não declararam uma religião específica, o que contribuiu para a vitória do petista na disputa mais apertada desde a redemocratização, segundo estudo divulgado à época.

Já neste mês, uma pesquisa do Datafolha divulgada no último dia 7, mostrou que Lula ainda continua a enfrentar resistência entre os evangélicos, que compõem 28% do eleitorado brasileiro. A reprovação ao petista nesse grupo é de 38%, enquanto entre os católicos esse índice é de 28% (52% da população ouvida). No geral, segundo o levantamento, Lula fechará o ano em estabilidade, com 38% de aprovação, enquanto 30% consideram seu trabalho regular e outros 30% o definem como ruim ou péssimo.

Mas, voltando ao relacionamento em questão, nas últimas semanas Lula fez duas referências aos evangélicos. A primeira ocorreu durante um ato do PT, no qual reconheceu que a legenda tem dificuldade em se comunicar com o grupo. Já a segunda, foi durante um evento do governo em que Lula reclamou dos ataques da campanha. “Se tem um cara neste país que acredita em Deus, é este que está vos falando”, declarou.

Apesar de Lula muitas vezes extravasar além do que deveria, sobretudo quando improvisa, a disputa do eleitor evangélico no campo da fé é um passo arriscado, pois essa alternativa indicaria empunhar uma bandeira conservadora, o que se afasta do argumento da esquerda.

Existe hoje uma ligação já cristalizada desse eleitor com o bolsonarismo e que não caminha por análises racionais, ainda que o mesmo se depare com resultados positivos na economia ou em outros segmentos. O senso de pertencimento acaba sendo maior do que qualquer realidade, tornando, para uma certa parcela, as ações governamentais advindas sempre como representativas de uma esquerda adversária.

Desta forma, e de olho em uma nova estratégia, o governo incluiu numa campanha publicitária um cantor gospel e uma personagem que dá “glória a Deus” quando recebe o Bolsa Família. Em outra iniciativa, o Ministério do Desenvolvimento Social passou a oferecer financiamento a projetos de combate à fome tocados pelas igrejas e começou a treinar seus integrantes para cadastrar beneficiários de programas sociais. Uma forma de amenizar o domínio dos templos evangélicos nas periferias.

A ideia é evitar com que os evangélicos passem a se identificar com a direita de forma definitiva. E, de fato, há espaço para reverter uma parte desse quadro. Exemplo disso é que uma pesquisa recente do PoderData mostra que 52% dos evangélicos acham que o governo Lula é pior que o governo Bolsonaro, enquanto 30% consideram o petista melhor, e 15% veem os dois da mesma maneira.

Discutir que religião e política não deveriam se misturar é inviável. Ao menos por enquanto. O caminho para uma possível dissociação é longo, ainda. E, sabendo disso, vários líderes religiosos barganham benefícios, apostando na persuasão dos seus seguidores.

Porém, ainda que uma perspectiva de mudança se encaixe no longo prazo, é possível acreditar que um dia, sob o cenário democrático, seja possível que cada cidadão escolha de forma individual os seus representantes, analisando sem a influência ou a ameaça da religião, e sobretudo vendo as contradições entre os discursos e as promessas dos falsos profetas e os valores da fé professada.

•        Lula agora anuncia que ninguém acredita em Deus mais do que ele

Após resistência no ano de campanha, petistas tentam disputa nos campos da fé e dos cofres do governo. Nas últimas semanas, Lula fez duas referências aos evangélicos. Num ato do PT, o presidente reconheceu que a sigla tem dificuldade em se comunicar com o grupo.

Depois, num evento do governo, ele reclamou dos ataques da campanha e emendou: “Se tem um cara neste país que acredita em Deus, é este que está vos falando”.

Conselheiros influentes de Lula sempre resistiram à ideia de disputar o eleitor evangélico no campo da fé. O argumento era que a esquerda jamais empunharia certas bandeiras conservadoras. Entrar nessa briga, portanto, evidenciaria uma diferença brutal de valores. O melhor, segundo esses auxiliares, seria fisgar o segmento pelo bolso.

O vínculo cristalizado desse eleitor com o bolsonarismo sugere que talvez não seja suficiente contar com uma melhora da economia. Há uma barreira anterior, ligada a um senso de pertencimento, que faz com que muitos evangélicos ainda vejam a esquerda como adversária.

Se Lula disser uma ou duas vezes que acredita em Deus, pouca coisa vai mudar. Mas a mensagem indica que o presidente busca um caminho diferente para falar com aquele eleitor. Também nas últimas semanas, o governo incluiu numa campanha publicitária um cantor gospel e uma personagem que dá “glória a Deus” quando recebe o Bolsa Família.

Outra iniciativa tem o objetivo de amenizar o domínio dos templos evangélicos nas periferias. O Ministério do Desenvolvimento Social passou a oferecer financiamento a projetos de combate à fome tocados pelas igrejas e começou a treinar seus integrantes para cadastrar beneficiários de programas sociais.

O governo quer evitar que a identificação dos evangélicos com a direita se torne definitiva. Pode haver espaço para reverter uma parte desse quadro.

Uma pesquisa recente do PoderData mostra que 52% dos evangélicos acha que o governo Lula é pior que o governo Bolsonaro, enquanto 30% consideram o petista melhor, e 15% veem os dois da mesma maneira. Em 2022, Bolsonaro teve 69% dos votos válidos no grupo.

 

Fonte: Agencia Estado/Folha Press/Tribuna da Internet

 

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