Governo precisa tratar agroecologia como saída para crise climática
urgentemente
“SE 50 ANOS ATRÁS alguém dissesse que botos iriam morrer de calor,
ninguém acreditaria”, falou Ailton Krenak, o primeiro indígena imortal na
Academia Brasileira de Letras, no encerramento do 12º Congresso Brasileiro de
Agroecologia, em 23 de novembro. Mas estamos vendo não só o rio Solimões seco,
cheio de barcos atolados e motocicletas por seu leito, em plena Amazônia,
esperança da salvação do planeta.
No Sul, as inundações
matam e botam a perder toda a lavoura, enquanto São Paulo
fica no escuro por cinco dias. Dias antes do início da COP 28, a
maior conferência mundial do clima, a resposta de Krenak para a
emergência climática foi categórica: “A agroecologia tinha que acontecer agora,
numa escala planetária”. Mas o que isso quer dizer, exatamente?
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Desigualdades sociais, devastação ambiental, crise climática, má
alimentação e fome são fenômenos socioecológicos associados à forma como
os alimentos são produzidos, transformados, distribuídos e consumidos. Não
podem ser tratados como problemas isolados a serem ponderados por políticas
setoriais.
A agroecologia é um enfoque científico que busca reconciliar os sistemas
alimentares com os ecossistemas e com as culturas dos povos. Sua prática
combate as mudanças climáticas e a fome, conserva a biodiversidade e contribui
para a promoção da saúde pública. Tudo isso com comida de verdade, produzida
pela agricultura familiar, no campo e nas cidades.
A agroecologia não se reduz a questões de manejo agrícola, como a
implantação de sistemas agroflorestais ou a produção sem veneno. Ela está
orientada a reestruturar os sistemas alimentares, desde a produção até o
consumo.
É importante entendermos que a questão social não se resolve
separadamente da questão ecológica, e vice-versa. Se nossos problemas sociais
forem enfrentados só com respostas sociais, a tendência é que aprofundem as
questões ecológicas, poluindo mais. E políticas ambientais podem ser
francamente antissociais.
Um exemplo é a transição
energética via parques eólicos na região de atuação do Polo da
Borborema, na Paraíba. Neste território em que a agroecologia vem sendo
promovida há décadas, os parques eólicos são impostos de cima para baixo,
levando violência, poluição sonora e, principalmente, inviabilizando uma
transição socioecológica em curso, apoiada inclusive com recursos de políticas
públicas.
O discurso que sustenta esse tipo de projeto defende que as soluções
para os problemas da humanidade virão das tecnologias voltadas à
descarbonização da economia. No entanto, as tecnologias propostas só são
acessíveis pela via dos mercados e são controladas por grandes empresas. O que
precisamos neste momento é do desenvolvimento de outras economias, que sejam
reconectadas às dinâmicas da natureza e da sociedade e que dependam menos dos
mercados globalizados.
A agroecologia defendida por Ailton Krenak representa esse tipo de
economia. Uma que equilibra os dois lados da balança, enfrentando a insegurança
alimentar e nutricional com soberania. Ao produzir em bases agroecológicas e
escoar a produção em circuitos curtos de distribuição, baixa-se a emissão de
gases de efeito estufa, promovendo uma agricultura resiliente às mudanças
climáticas, conservando a biodiversidade, os mananciais hídricos e os
solos.
Alimentos saudáveis e adequados são produzidos em quantidade para
abastecer toda a população. Postos de trabalho são gerados. De ciclos viciosos
degenerativos, parte-se para ciclos virtuosos regenerativos. Esse é o sentido
da transição ecológica justa.
Se queremos de fato encontrar soluções para as crises que enfrentamos,
precisamos tratar os problemas como socioecológicos. Por isso, a agroecologia é
emergencial. No entanto, para que ela avance, precisamos de políticas e
legislações adequadas.
Enquanto a maior parte dos orçamentos e o apoio ideológico forem
orientados para o agronegócio, a agroecologia ficará confinada a experiências
bem sucedidas emblemáticas, mas incapazes de dar respostas amplas à crise
socioecológica.
É preciso, por exemplo, que o Programa Nacional de Redução de
Agrotóxicos, o Pronara, seja instituído. Algo no sentido diametralmente oposto
ao Pacote do
Veneno que acaba de ser aprovado pelo Senado. É necessário também
impor limites ao consumo de alimentação
ultraprocessada e à concentração de terra no Brasil.
Políticas favoráveis à agroecologia não podem ser pensadas
setorialmente. Isso significa a necessidade de envolvimento ativo de toda a
Esplanada dos Ministérios. O Ministério da Economia, por exemplo, deve apoiar a
transição agroecológica com políticas fiscais, hoje totalmente
favoráveis às monoculturas e ao uso de agrotóxicos.
É preciso inverter essa lógica. O agronegócio não paga imposto para
exportar e conta com pesados subsídios públicos. Sua propalada eficiência
econômica é falsa.
No 12º Congresso Brasileiro de Agroecologia – organizado pela Associação
Brasileira de Agroecologia, em parceria de inúmeras redes por todo o país –
foram lançadas políticas importantes, como a retomada do programa Ecoforte e a
instalação da Comissão Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica.
Sem dúvida, são conquistas a serem celebradas. Mas não podemos perder de
vista que são muito restritas diante da emergência climática e do
aprofundamento da crise socioambiental.
Ø
Brasil deve bater recorde de abertura de novos
mercados para o agro, diz secretário
O Brasil deve bater o recorde de abertura de novos mercados para
exportação de produtos do agronegócio nacional em 2023.
A expectativa do Ministério da Agricultura é de ultrapassar, até o fim
deste mês, a marca de 77 acordos com permitem a participação de produtos
agropecuários brasileiros no comércio internacional.
“Devemos passar até o final do ano, o ano não acabou ainda. Faltam
alguns dias e estamos trabalhando intensamente, fazendo negociações, nossa
equipe esta toda dedicada a esses acordos”, disse o secretário de Comércio e
Relações Internacionais do Ministério da Agricultura, Roberto Perosa.
Nos últimos 12 meses, o país alcançou a abertura de 73 novos mercados.
Segundo o secretário, deve ser anunciado nos próximos dias novos acordos.
“Não podemos avançar o que estamos em negociação, mas temos focados
aberturas tanto ao redor do Brasil, no continente americano, mas também com um
grande mercado consumidor que é o asiático. Então, em uma dessas duas regiões
nos com certeza teremos mais anúncios”, antecipou Perosa.
·
Para CNA, europeus querem “asfixiar” agronegócio brasileiro
O acordo de livre comércio entre Mercosul e União Europeia ainda tem
pontos pendentes para o agronegócio, que precisam ser esclarecidos antes de uma
eventual conclusão das negociações, segundo a Confederação da Agricultura e
Pecuária do Brasil (CNA).
“Ainda há pontos que precisam ser equacionados”, disse a diretora de
relações internacionais da entidade, Sueme Mori.
O presidente da entidade, João Martins, foi mais duro e afirmou que as
exigências feitas pela UE ao Mercosul evidenciam um desejo de que “sejamos
submissos”. Para ele, os europeus têm adotado posições para “asfixiar” o
agronegócio brasileiro.
Sueme lembrou que a UE pediu compromissos adicionais do Mercosul em uma
“side letter” (protocolo adicional ao acordo) apresentada no início deste ano e
aprovou uma lei antidesmatamento que contraria o Código Florestal, com risco de
novas barreiras aos produtos agropecuários brasileiros.
Para escapar dessas eventuais barreiras provenientes da nova legislação
europeia, que entra em vigência no fim de 2024, o Mercosul quer garantias de um
“reequilíbrio das concessões comerciais” no âmbito do acordo – se barreiras
protecionistas aos produtos brasileiros forem impostas no futuro.
“Ao negociar um acordo [de livre comércio], falamos em abertura
bilateral dos mercados. Se não temos segurança de que essa abertura vai se
manter, precisamos colocar isso no acordo”, explicou Sueme, referindo-se à
cláusula exigida pelo Mercosul sobre o reequilíbrio das concessões comerciais.
Para ela, não era mesmo possível fechar um acordo nesta semana. “Ainda
há pontos a serem negociados antes do fechamento”, concluiu a diretora.
Fonte: The Intercept/CNN Brasil
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