terça-feira, 7 de novembro de 2023

'Bolsonaro faria igual': grupos pró-Israel não impactam posição do Brasil em conflito, diz analista

Grupos de extrema direita e da direita evangélica pró-Israel no Congresso tentam modificar a política externa brasileira em relação à Palestina. Conheça as origens do apoio conservador a "Israel imaginária" e por que nem Bolsonaro conseguiu mudar a posição do Itamaraty sobre o conflito israelo-palestino.

A ofensiva terrestre de Israel na Faixa de Gaza tem dividido a sociedade brasileira entre grupos simpatizantes aos direitos dos palestinos e aqueles sensíveis às demandas de segurança de Israel.

Essas divisões se refletem no Congresso Nacional. Recentemente, o deputado federal do Partido Liberal, Gustavo Gayer, enviou carta à Embaixada dos EUA em Brasília expondo nomes de políticos, professores e intelectuais com visões pró-palestinas atuando no país.

O documento intitulado "Informações sobre apoiadores de grupos terroristas no Brasil que visitam os EUA" gerou notas de repúdio da Universidade de Brasília e temores de forte polarização social em torno do conflito israelo-palestino.

O repúdio de grupos bolsonaristas à causa palestina está intimamente ligado à figura do primeiro-ministro do país, Benjamin Netanyahu, considerado um ícone pelos movimentos de direita radical mundialmente.

"A extrema direita global vê a figura de Netanyahu com muitos bons olhos, colocando-o no mesmo time de líderes conservadores como [presidente da Hungria Viktor] Orbán, [ex-presidente dos EUA, Donald] Trump ou [ex-presidente do Brasil, Jair] Bolsonaro", disse o professor de relações internacionais da Fundação Armando Álvares Penteado (FAAP), Vinícius Rodrigues Vieira, à Sputnik Brasil.

A apoio às políticas de Israel em relação à Palestina também é difundido entre setores da direita evangélica, que consideram a construção do Estado de Israel uma profecia bíblica.

"Há uma interpretação de que Israel precisa estar reconfigurado para que tenhamos a segunda vinda de Jesus Cristo à Terra", explicou Vieira. "Há também uma aproximação religiosa de grupos evangélicos com o judaísmo, se considerarmos a clara ênfase que algumas igrejas evangélicas colocam no Antigo Testamento, em oposição ao Novo Testamento, que basicamente traz a palavra de Cristo."

O professor nota a cobertura do conflito israelo-palestino veiculada pela rede Record, ligada à Igreja Universal, que traz "uma linha editorial pró-Israel, com a visão de que o país deve ser protegido por razões bíblicas".

"Essas interpretações religiosas estão sendo bastante convenientes para selar uma aproximação entre grupos evangélicos e setores da extrema direita brasileira", disse Vieira.

O pesquisador do Centro de Estudos do Antissemitismo da Universidade de Jerusalém e professor de sociologia da UFRJ, Michel Gherman, concorda, e diz que há uma "aliança tática entre a direita evangélica e a extrema direita brasileira em apoio a uma Israel imaginária", bastante distinta da "Israel real".

"A partir das manifestações de 2013, vemos uma conexão poderosa entre a extrema direita [...] e a direita evangélica, na defesa do que eu chamo de 'Israel Imaginária', que é branca, armada, muito capitalista – no sentido de 'startup nation' – e um Estado judeu religioso, integrante da civilização judaico-cristã", disse Gherman à Sputnik Brasil.

Durante o governo Bolsonaro, o apoio a "Israel imaginária" foi alçado a categoria de política de Estado, com o uso de símbolos vinculados ao Estado israelense e "um discurso político de apoio a Israel em todas as vertentes".

"Mas é importante notar que a Israel imaginária que colonizou os corações e mentes da extrema direita e da direita evangélica brasileira não é a Israel real, concreta e cheia de contradições", declarou Gherman.

·         Resposta israelense

Apesar dos claros dividendos políticos que o apoio da direita evangélica e da extrema direita brasileira garantem a Israel, não há provas de que o Estado judeu forneça apoio material a esses grupos no Brasil.

"Não temos provas de que há um vínculo institucional entre o Estado de Israel e o apoio desta aliança tática entre a extrema direita e a direita evangélica", asseverou Gherman. "Por outro lado, existe, sim, um interesse estritamente financeiro em atividades como o turismo evangélico para Israel."

Além disso, nem todas as correntes políticas em Israel querem que a imagem do país esteja vinculada à extrema direita mundial ou a grupos religiosos conservadores, argumentou o pesquisador.

"Israel não mostra interesse em se alinhar diretamente com a extrema direita e direita evangélica brasileira. Um exemplo foi a representação israelense na parada LGBTQIA+ em São Paulo", disse Gherman. "Me parece que Israel busca outro soft power [poder brando] em sua política para o Brasil, que não esteja somente ligado aos grupos de extrema direita."

·         Impacto prático

O apoio da direita evangélica e extrema direita brasileira a Israel ainda teve pouco sucesso em influenciar a política externa brasileira em relação ao conflito, acreditam os especialistas ouvidos pela Sputnik Brasil.

"É natural que grupos de interesses façam lobby no Congresso e nos mais diversos ministérios – como da Saúde e Educação – para serem ouvidos na formulação de políticas públicas. E a política externa também é uma política pública", explicou o professor de Relações Internacionais da FAAP, Vinícius Rodrigues Vieira.

De fato, deputados da bancada do PL utilizaram a tribuna do Congresso Nacional para criticar a posição brasileira sobre o conflito, cobrando que o Brasil reconheça o Hamas como organização terrorista.

O deputado federal Eduardo Bolsonaro, por exemplo, assinou dois requerimentos para convocar o ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, ao Congresso, para elucidar "que medidas estão sendo adotadas após o ataque terrorista do grupo Hamas e qual é a posição oficial do Brasil em relação ao grupo terrorista e às violações que estão sendo praticadas contra o povo israelense", reportou a Folha de São Paulo.

No entanto, as manifestações ainda não foram capazes de modificar o posicionamento oficial do Brasil em relação ao conflito israelo-palestino.

"A questão é que a nossa política externa já é bastante equilibrada na questão israelo-palestina. Sempre reconhecemos Israel e defendemos a criação de um Estado palestino", disse Vieira.

Os analistas notam que mesmo durante a Presidência de Bolsonaro essa política foi mantida, principalmente em função de interesses comerciais do agronegócio brasileiro nos países árabes.

"Bolsonaro foi eleito com a proposta de mudança de mudar a Embaixada de Tel Aviv para Jerusalém, mas não implementou. Ele prometeu reconhecer o Hamas como organização terrorista, mas não se empenhou muito para fazê-lo", lembrou Gherman. "Sou capaz de apostar que, se Bolsonaro fosse presidente, a posição diplomática do Brasil em relação ao conflito não seria tão diferente da atual."

O impacto prático limitado não impede que os grupos de extrema direita e a direita evangélica mantenha o seu apoio a Israel durante o atual conflito, independente da escada das hostilidades.

"A situação atual não contradiz o apoio a Israel imaginária. É uma tragédia de proporções bíblicas, cuja gramática religiosa garante a manutenção do apoio a Israel. [..] A interpretação que certos grupos religiosos fazem da situação atual aponta que estamos nos aproximando do fim do mundo. E a visitação ao armagedon continua", concluiu o especialista.

 

Ø  Israel piora relações com mundo árabe, mas Acordos de Abraão não serão rescindidos

 

Um cientista político criticou as ações de Israel na Faixa de Gaza, que vê como desproporcionais, apesar de ver Hamas como uma organização terrorista. Apesar disso, ele não crê que isso mudará o rumo da região.

A Arábia Saudita denunciou "nos termos mais fortes possíveis" na quarta-feira (1º) o ataque das Forças de Defesa de Israel (FDI) ao campo de refugiados de Jabaliya. Israel disse que o ataque foi parte da ofensiva contra o Batalhão Central de Jabaliya do Hamas, que usa civis palestinos como escudos humanos.

O atual conflito entre Israel e o Hamas, que já levou a vida de mais de 1,3 mil israelenses e mais de 8 mil palestinos, provocou uma série de manifestações em países árabes, inclusive naqueles que têm tratados de normalização com o Estado judeu.

Centenas de pessoas saíram às ruas no Bahrein agitando bandeiras e expressando apoio aos palestinos em frente à embaixada israelense em Manama. Foi relatado recentemente que o governo do Bahrein, um dos países que assinou os Acordos de Abraão com Israel em 2020, com a mediação dos EUA, decidiu retirar seu embaixador em Israel e suspender as relações econômicas com o país.

Como as tensões entre Israel e o mundo muçulmano seguem aumentando, quais são as implicações para as relações de Tel Aviv com Riad e os signatários dos Acordos de Abraão de 2020?

"Acho que para o Marrocos, os Emirados Árabes Unidos e o Bahrein, será muito difícil congelar, é claro", afirmou à Sputnik o dr. Ahmed al Ibrahim. Para o cientista político baseado em Riad, Arábia Saudita, o distúrbio na cooperação continuará devido ao "genocídio" que está ocorrendo.

Ele disse reconhecer o Hamas como organização terrorista, mas respondeu que o lado israelense está "basicamente punindo e conectando pessoas inocentes, especialmente mulheres e crianças", o que complicará as coisas.

"Mas congelar os Acordos de Abraão não será possível, porque você ainda quer esse tipo de documento com Israel, que acabou de ser estabelecido para conter os problemas que estão ocorrendo no momento", segundo Al Ibrahim.

A Arábia Saudita, que recentemente negociou a normalização das relações com Israel, não condenou o ataque do Hamas a Israel em 7 de outubro, e sublinhou a necessidade de um cessar-fogo imediato na Faixa de Gaza, a proteção de civis, a permissão de ajuda humanitária aos palestinos destituídos, e o reinício do processo de paz na região.

"Obviamente, todas as conversas sobre a normalização com Israel têm sido [feitas] através da mídia ligada aos EUA, foram interrompidas e colocadas de lado, e quanto mais Israel estiver matando pessoas, mais difícil será para o príncipe herdeiro devolver tudo ao seu lugar, a menos que haja magia, uma solução mágica que aconteça. Os sauditas sempre apoiam o povo da Palestina, e o príncipe herdeiro mencionou isso algumas vezes", apontou Ahmed al Ibrahim.

"A primeira coisa é dar uma chance à solução de dois Estados, e Jerusalém Oriental é a capital da Palestina. Dar dignidade ao povo da Palestina, encontrar uma solução para eles que seja trabalhada pela Liga Árabe e pelo governo israelense e, basicamente, fazer com que todos estejam seguros e coexistam com todos. Se essa guerra continuar e mais pessoas inocentes forem mortas, será muito difícil voltar e sentar-se à mesa para discutir a normalização novamente."

 

Ø  Situação na Palestina tem sido muito difícil devido ao governo extremista de Israel, diz Hezbollah

 

A situação na Palestina tem sido muito dura nos últimos anos por causa do governo extremista de Israel, disse nesta sexta-feira (3) o secretário-geral do grupo militante libanês Hezbollah, Hassan Nasrallah.

"O povo palestino vem sofrendo há mais de 75 anos. A situação na Palestina tem sido muito dura nos últimos anos devido ao governo extremista e estúpido [de Israel]", disse Hassan Nasrallah.

É seu primeiro discurso desde o início da escalada entre a Faixa de Gaza e Israel.

"O que está acontecendo na Faixa de Gaza mostra a estupidez e a fraqueza de Israel. Israel está repetindo a experiência de 2006 com o Líbano, quando não conseguiu libertar reféns por meio de ações militares, tendo sido forçado a negociar", destacou o líder do grupo.

"Após um mês de hostilidades, Israel não tem qualquer conquista militar real na Faixa de Gaza. A vitória no confronto com Israel acabará por ser da Faixa de Gaza", ressaltou Hassan Nasrallah.

O secretário-geral do Hezbollah declarou estar pronto para qualquer mudança na frente libanesa com Israel. O Hezbollah entrou nas hostilidades contra Israel em 8 de outubro. 57 combatentes já morreram no confronto na fronteira entre Israel e o Líbano, incluindo combatentes das milícias palestinas no Líbano, de acordo com o comunicado de Nasrallah.

"Todos os cenários são possíveis. A probabilidade de uma guerra em grande escala entre o Hezbollah e Israel é real", acrescentou ele.

O movimento se coloca em risco, mas ele é útil porque conseguiu levar um terço do Exército israelense para a fronteira com o Líbano, resumiu ele.

Os Estados Unidos impedem o cessar-fogo na Faixa de Gaza, de acordo com o secretário-geral do Hezbollah.

"Os Estados Unidos são totalmente responsáveis pela guerra em Gaza. Israel desempenha o papel de executor dos EUA, eles são responsáveis por crimes contra os povos no século passado e neste século", afirmou o líder do grupo.

Os ataques contra as bases militares americanas no Iraque e na Síria acontecem porque os Estados Unidos são responsáveis pela situação nesses países e na Palestina, segundo ele.

Na quinta-feira (2), o Hezbollah afirmou que seus combatentes lançaram ataques simultaneamente contra 19 posições militares de Israel. O movimento também disse que usou dois drones para atacar posições israelenses no território das Fazendas de Shebaa, área na fronteira disputada entre o Líbano, Síria e Israel.

·         Especialista britânico revela armadilha em que caiu Israel no conflito com Hamas

Para derrotar o grupo militante Hamas, Israel terá que destruir a Faixa de Gaza com sacrifício do apoio internacional, observa Nicholas Westcott, ex-diretor-geral para o Oriente Médio do Serviço Europeu para a Ação Externa da União Europeia (UE), em um artigo no The Guardian.

De acordo com o especialista, a continuação dos combates em Gaza está enfraquecendo cada vez mais "a posição moral" de Israel, e até mesmo os próprios israelenses reconhecem a limitação das capacidades para "retaliação".

"O problema é que eles [Israel] não podem destruir o Hamas sem destruir a Faixa de Gaza; e ao destruir Gaza eles correm o risco de minar o apoio internacional ao próprio Israel", escreve Westcott.

Ele acrescentou que o Hamas está tão arraigado na sociedade que as ações militares de Israel apenas aumentam seu apoio entre a população.

"Um povo levado ao desespero apoiará ações desesperadas", alerta Westcott.

Vários países convocaram seus representantes oficiais em Tel Aviv, na última semana, como retaliação às operações militares de Israel, dentre eles Chile, Colômbia e Jordânia, já o Bahrein rompeu as relações diplomáticas e comerciais com a nação hebraica.

 

Fonte: Sputnik Brasil

 

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