Por que Bolsonaro e sua caterva se calaram na PF e agora desafiam o
STF?
O Brasil aguardou atentamente o depoimento
simultâneo à PF, na manhã desta quinta-feira (31), de Jair Bolsonaro (PL), sua
esposa Michelle e de um grupo de ex-assessores de confiança do líder da extrema
direita brasileira. Pouco tempo após comparecerem aos locais estabelecidos, vem
a informação de que o ex-presidente, a mulher, o ex-secretário de Comunicação
Fabio Wajngarten e o coronel Marcelo Câmara, ex-assistente pessoal, optaram por
ficar em silêncio quando questionados sobre fatos relacionados ao escândalo das
joias e relógios desviados da Presidência da República para serem vendidos no
exterior.
O ‘argumento’ para tal decisão tomada pelos
diferentes advogados, naturalmente combinado com alguma antecedência, é de que
os depoentes não iriam se submeter à competência do Supremo Tribunal Federal no
inquérito das joias, uma vez que a PGR já teria se posicionado alegando que o
STF não seria o foro adequado para o caso. Eles exigem um “juiz natural”, ou
seja, um magistrado que seja o correspondente para instruir a ação segundo a
lei brasileira. Nada mais correto e justo, não fosse pelo fato de que o juiz
que eles rejeitam é o ministro Alexandre de Moraes.
Trocando em miúdos, Bolsonaro entrou pela sala da
PF onde seria ouvido e já disparou que não falaria nada porque Moraes e o STF
não representam quem, pela lei, deveria estar com a sua ação penal, de acordo
com uma deliberação da vice-procuradora-geral da República, Lindôra Araújo, uma
tese imediatamente acolhida pelos advogados do grupo.
Não precisa ser muito ambientado com o juridiquês
para fazer uma leitura mais simples e evidente do fato: o ex-presidente quer
escolher o juiz que o julgará e quer, obviamente, um ‘amigo’, uma vez que sabe
que o Judiciário está infestado de bolsonaristas. Sobretudo, ele não quer ser
julgado por Moraes, o homem que não engole seus rompantes autoritários e pisa
fundo na condução dos procedimentos delegados à PF na hora de investigar o
antigo ocupante do Palácio do Planalto.
Mas você pode estar se perguntando se isso é tudo
na estratégia da equipe de defesa de Bolsonaro e de sua caterva. Não, não é. O
ex-presidente está apostando num expediente mais do que conhecido e que foi
colocando em marcha durante todo seu mandato, especialmente nos dois anos
finais de sua estadia no poder. Para Bolsonaro a tática consiste em enfrentar a
autoridade de Moraes e do STF.
Qualquer brasileiro que olhe para os inquéritos que
investigam o ex-chefe de Estado verá que sua situação é um caso perdido, seja
nos autos do processo sobre a tentativa de golpe após a derrota na eleição ou
no episódio da espoliação dos itens preciosos do Estado que estavam sendo
comercializados nos EUA. Fora dos círculos dos birutas de sua claque
hipnotizada, as teses de defesa de seus advogados são uma piada infantil.
Tensionar a coisa e jogar seus radicais
lobotomizados e violentos contra “Xandão” e o STF é uma velha artimanha nada
original do ex-capitão que ousou impor-se como ditador no Brasil. Retomar a
guerra com a Corte mais alta do Judiciário brasileiro, na cabeça de Bolsonaro,
seria um caminho para minar a credibilidade do juiz e do tribunal onde tramitam
seus processos, além de servir como intimidação a esses magistrados.
Delação
vai blindar hacker contra vinganças
Diante do aval da Advocacia do Senado para que a
Comissão Parlamentar de Inquérito do 8 de Janeiro firme delações premiadas,
parlamentares governistas afirmam que devem oferecer a possibilidade de acordo
ao hacker Walter Delatti Neto. Em depoimento na semana passada, ele afirmou aos
parlamentares ter participado de reuniões com o ex-presidente Jair Bolsonaro
para tratar de formas de descredibilizar as urnas eletrônicas.
— Vamos oferecer. Se for de interesse do Delgatti,
a CPI está aberta para colher a contribuição dele —disse o deputado Rogério
Correia (PT-MG).
A consulta à Advocacia do Senado foi feita tendo em
vista uma possível delação do ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, o
tenente-coronel Mauro Cid. Em caráter reservado, porém, alguns parlamentares
avaliam como baixa a possibilidade de o militar colaborar com o colegiado. Um
dos obstáculos é a participação de dois filhos de Bolsonaro na CPI, o senador
Flávio (PL-RJ) e o deputado Eduardo (PL-SP). Por isso, há uma avaliação de que
a defesa de Cid dê preferência para uma possível delação com a Polícia Federal.
Neste cenário, para esse grupo, o ideal seria
aproveitar o aval da Advocacia do Senado para a oferta de delação para outros
personagens mais suscetíveis a aceitar o acordo. Em relação a Delgatti, a
possibilidade é dada como certa para alguns, mas há dúvidas se a defesa dele
ainda teria “cartas na manga” para barganhar, após todos os depoimentos já
feitos pelo hacker.
A Advocacia do Senado deliberou na terça-feira, 29,
que a CPI pode fazer essa negociação, em resposta a uma consulta da relatora da
comissão, senadora Eliziane Gama (PSD-MA). O órgão técnico afirmou que a
proposta é legítima, mas condicionou a negociação à participação do Ministério
Público Federal e à homologação de um juiz.
A intenção inicial era a de propor um acordo ao
ex-ajudante de ordens para que ele colabore com as investigações sobre os atos
golpistas. Caso a CPI consiga uma delação premiada, será um feito inédito na
história do Congresso.
Após ficar em silêncio nas primeiras vezes que foi
chamado a depor à PF, Cid já prestou dois depoimentos aos investigadores desde
a semana passada— um na sexta-feira e outro nesta terça.
Os dois depoimentos prestados, segundo informações
da PF, estavam relacionados ao inquérito que investiga a suposta contratação
dos serviços do hacker Walter Delgatti Netto para invasão das urnas
eletrônicas.
De acordo com Delgatti Netto, Mauro Cid teria
participado da reunião em que a deputada federal Carla Zambelli promoveu entre
ele e Jair Bolsonaro, em agosto do ano passado, no Palácio da Alvorada. O
hacker está preso preventivamente por incluir no sistema do Conselho Nacional
de Justiça (CNJ) um falso mandado de prisão contra o ministro Alexandre de
Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), supostamente por ordem da
parlamentar.
PF
impõe condições a CID para aceitar delação
Personagem central no escândalo da joias, o
ex-ajudante de ordens Mauro Cid é um dos oito intimados para depor
simultaneamente à Polícia Federal nesta quinta-feira (31). Dias antes, Cid foi
proibido por Alexandre de Moraes de se comunicar com o ex-presidente Jair
Bolsonaro, com a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro e com outros investigados.
De acordo com os investigadores, a delação premiada
de Mauro Cid no caso das joias não é necessária. Para ser aceita, a delação do
tenente-coronel teria de entregar informações importantes para outros crimes
que estão sendo apurados.
“É uma
investigação que tem cinco troncos. As joias são um desses troncos”, explica
Daniela Lima em entrevista a Natuza Nery. “Cid conhecia tudo e vai ter de
entregar tudo. E ele decidiu falar”, afirma a apresentadora da Globonews e
colunista do g1.
“Bolsonaro usava o telefone de Cid quando queria
falar com alguém e não queria que fosse do próprio número. Esse era o grau de
entrega, de confiança. Se ele, Bolsonaro – que era conhecido por tudo menos
pelo receio – receava usar o aparelho, ele usava o do Cid. E Cid entregava.”
O celular de Mauro Cid foi apreendido pela PF e foi
fundamental para que a investigação descobrisse que Frederick Wassef, advogado
de Bolsonaro, foi aos Estados Unidos para comprar o Rolex dado de presente pelo
governo da Arábia Saudita à comitiva brasileira em 2019.
O dinheiro envolvido na operação foi depositado na
conta do pai de Mauro Cid, o general Mauro César Lourena Cid, que também é alvo
da operação da Polícia Federal.
Confira
versões que casal Bolsonaro ensaiou
O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) disse, este
mês, que seu ex-ajudante de ordens Mauro Cid tinha “autonomia” para agir
enquanto ele ocupou o Planalto. A afirmação, dada ao jornal “O Estado de S.
Paulo” durante viagem a Goiânia (GO), veio acompanhada de negativas sobre o
recebimento de dinheiro oriundo da venda de joias e representa mais uma versão
apresentada por Bolsonaro e seu entorno sobre o caso, investigado pela Polícia
Federal, que mira supostas transações irregulares envolvendo presentes
entregues ao então chefe do Executivo por nações estrangeiras.
No entanto, dias depois, os advogados de Jair
Bolsonaro decidiram colocar em prática uma nova estratégia de defesa: pedir ao
Tribunal de Contas da União (TCU) a devolução das joias que entregaram em março
à Caixa Econômica Federal por ordem da corte. De acordo com a colunista do
GLOBO Bela Megale, o “cavalo de pau” se deu por ser a única tese possível e
sustentável no momento”.
Veja as idas e vindas bolsonaristas sobre o caso
das joias:
Logo depois de o caso vir à tona, em março, em
reportagem do jornal “O Estado de S. Paulo”, o ex-presidente Jair Bolsonaro
afirmou ao canal CNN Brasil que “não pediu, nem recebeu” os presentes.
Inicialmente, foi apontado que o governo passado tentou trazer para o Brasil,
de forma ilegal, um conjunto de colar e brincos recebidos do governo da Arábia
Saudita, avaliado em cerca de R$ 16,1 milhões.
— Estou sendo acusado de um presente que eu não
pedi, nem recebi. Não existe qualquer ilegalidade da minha parte. Nunca
pratiquei ilegalidade — afirmou Bolsonaro em 4 de março.
As joias estavam com um assessor de um ministro de
Bolsonaro e foram retidas pela Receita Federal no Aeroporto de Guarulhos, em
São Paulo, ao chegarem ao país. Em seguida, o governo fez uma série de
tentativas de reaver os conjuntos junto à Receita.
O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), filho “zero um”
do ex-presidente, saiu em defesa do pai logo após a revelação do caso,
afirmando que as joias da marca suíça Chopard foram incorporadas ao seu acervo
pessoal por terem caráter “personalíssimo”:
— Na minha opinião, (a caixa de joias) é
personalíssima, independentemente do valor. O TCU está tendo esse entendimento
agora. A Comissão de Ética falou que não tinha problema. Foi seguindo o que foi
sendo pedido. Não tem nenhum dolo da parte dele, de maldade, ou ato de
corrupção. Zero — disse Flávio Bolsonaro.
A defesa do ex-presidente, depois de ter se
oferecido para fazer a devolução dos conjuntos de joias, afirmou que Bolsonaro “em
momento algum pretende locupletar-se ou ter para si bens que pudessem, de
qualquer forma, serem havidos como públicos”. O posicionamento foi apresentado
pouco depois de o Tribunal de Contas da União (TCU) determinar que o segundo
pacote de joias presenteadas por autoridades sauditas fosse devolvido à
Presidência.
Em Goiânia: ‘Não mandei ninguém fazer nada’, diz
Bolsonaro sobre venda de joias
As investigações da PF, porém, já apontaram que
presentes chegaram a ser colocados à venda em um leilão, em fevereiro deste
ano, com valor estimado entre US$ 120 mil e US$ 140 mil.
Quando voltou ao Brasil, no final de março,
Bolsonaro afirmou que os presentes não entraram “escondidos” no país. A
declaração foi dada no Aeroporto de Orlando, nos Estados Unidos, para onde ele
havia viajado ainda no fim do mandato.
— Não sei por que esse escândalo todo. Vamos em
frente. Nada foi extraviado, nada sumiu. Nada foi escondido. Ninguém vendeu
nada. Acho que a questão desses três pacotes [de joias] está resolvida. Se eu
tivesse pego escondido, ninguém teria conhecimento — afirmou, em 29 de março.
Pouco tempo depois, em abril, o ex-presidente disse
à PF que teve conhecimento do conjunto de joias apreendidas no Aeroporto de
Guarulhos apenas em dezembro do ano passado, duas semanas após o ocorrido. Aos
investigadores, informou que buscou informações sobre o caso para evitar um
“vexame diplomático” e um “constrangimento internacional” caso os itens fossem
leiloados.
— Um presente de chefe de Estado dado ao governo
brasileiro jamais poderia ir a leilão por inação de quem quer que seja —
explicou o advogado e ex-ministro Fábio Wajngarten, na ocasião.
Primeiro filho do ex-presidente a se pronunciar
sobre operação da PF sobre a compra e venda de joias recebidas por Bolsonaro
enquanto esteve na Presidência, desencadeada no início de agosto, o vereador
Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ) afirmou, no último domingo, que o pai
cumpriu “todas as recomendações” do Tribunal de Contas da União (TCU) no caso.
O advogado Paulo Amador da Cunha Bueno, que
representa o ex-presidente no caso das joias, negou, nesta sexta-feira, que o
ex-presidente tenha recebido qualquer valor referente à venda de um relógio
Rolex. A defesa do ex-ajudante de ordens Mauro Cid alega que o montante teria
sido entregue a Bolsonaro ou à ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro.
— O Cid evidentemente tem muita autonomia. Imagina
a quantidade de demandas que chegam a ele e que ele tem que resolver sem o
presidente da República — disse o advogado, em entrevista à GloboNews nesta
sexta-feira, e acrescentou: — O presidente Bolsonaro nunca recebeu nenhum valor
em espécie do Cid referente à venda de nada.
Em entrevista à revista Veja, o advogado Cezar
Bitencourt, que atua na defesa de Cid, afirmou que o ex-ajudante de ordens
teria recebido orientação de passar o dinheiro ao ex-presidente em espécie e
usou a conta do pai, o general Mauro Lourena Cid, para guardar parte da quantia
proveniente da venda das joias.
O próprio Jair Bolsonaro também comentou o caso
nesta sexta-feira. Além de entoar o mesmo discurso sobre a “autonomia de Cid”,
o ex-presidente afirmou, em entrevista ao jornal Estado de S. Paulo, que deseja
ver o caso solucionado o quanto antes.
— Ele (Cid) tinha autonomia. Não mandei ninguém
fazer nada. (…) Eu quero clarear o mais rápido possível — disse Bolsonaro.
O ex-presidente também comentou a decisão do
ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes em autorizar a
quebra do seu sigilo bancário e fiscal, assim como o da ex-primeira-dama,
Michelle.
— Sem problemas. Tudo incomoda, mas sem problemas.
Para justificar a manutenção das joias em seu
patrimônio, Bolsonaro voltou a citar o caráter personalíssimo do item. Como
mostrou o GLOBO, a estratégia de citar uma portaria nula foi aderida por outros
parlamentares de sua base de apoio.
— Ela (a portaria 59/2018) vale pelo menos até a
data em que ela existiu. Quando a portaria é revogada, tem uma vacância. O
acórdão de 2016 provoca o parlamento — disse Bolsonaro.
Os advogados de Jair Bolsonaro decidiram colocar em
prática uma nova estratégia de defesa: pedir ao Tribunal de Contas da União
(TCU) a devolução das joias que entregaram em março à Caixa Econômica Federal
por ordem da corte. A informação foi revelada pela “Folha de S.Paulo”.
Jair Bolsonaro foi emparedado pela operação da
Polícia Federal realizada neste mês que mostrou venda e recompra de um Rolex e
demais peças de um conjunto de joias para devolver ao TCU. O advogado Paulo
Bueno, que capitania a defesa do ex-presidente, diz que a manobra não é uma
mudança de estratégia, mas um “acréscimo”.
Após debates e conversas entre membros da defesa e
conselheiros jurídicos com o próprio Bolsonaro, ficou evidente que o único
caminho viável diante de tantas provas da PF é voltar à carga na tese de que as
joias eram bens personalíssimos.
Essa estratégia é vista como um meio para tentar
derrubar premissas de crimes que devem ser imputados a Bolsonaro, como
peculato, que ocorre quando um servidor se apropria de algo que não é seu, além
de lavagem de dinheiro e associação criminosa.
Fonte: Fórum/O Globo
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