quinta-feira, 28 de setembro de 2023

Marcelo Auler e a CPMI do Golpe: a Escolha de Sofia

Com apenas três das cinco sessões que estão por acontecer sem uma pauta definida, a CPMI dos Atos Golpistas de 8 de janeiro entra na sua reta final com a perspectiva de não cumprir tudo o que prometeu/anunciou. A pressa em encerrá-la obrigará os políticos governistas a fazerem verdadeira “Escolha de Sofia” com relação ao foco nesse final de jornada.

Com a promessa da relatora, senadora Eliziane Gama (PSD-MA), de apresentação do Relatório Final em 17 de outubro, restarão seis sessões realizadas nas terças e quintas-feiras. Duas dessas, a que aconteceu nessa terça-feira (26/09) e a da próxima quinta (28/09) já estavam com depoentes convocados: respectivamente o ex-ministro chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), General Augusto Heleno Ribeiro Pereira e Alan Diego dos Santos Rodrigues.

Augusto Heleno sempre esteve próximo ao ex-presidente Jair Bolsonaro. Por muitas vezes incitou militantes contra a eleição de Lula, inclusive falando que “o ladrão não subirá a rampa”. Entre novembro e dezembro recebeu em seu gabinete no Palácio do Planalto militantes dos movimentos pró-intervenção militar, Por todo seu comportamento, poderá ser um dos prováveis indiciados da CPMI.

Alan Diego está condenado, junto com George Washington de Oliveira Sousa e Wellington Macedo de Souza, pela tentativa de explodir um caminhão tanque com querosene de aviação no dia 24 de dezembro, nas proximidades do aeroporto de Brasília.

•        Aposta furada da oposição

Para as outras quatro sessões, porém, há um acúmulo de possíveis investigados e/ou testemunhas que senadores e deputados já anunciaram que gostariam de convocar. O General de Exército Walter Souza Braga Netto teve seu depoimento agendado para 5 de outubro, mas isso pode ser modificado, com a CPMI priorizando outros personagens.

O presidente da comissão, deputado Arthur Maia (UB-BA), já deixou claro que atenderá ao menos um dos pedidos dos parlamentares oposicionistas – a convocação do coronel Sandro Augusto Queiroz, que comandava a Força Nacional de Segurança Pública no dia dos ataques.

É mais uma tentativa dos oposicionistas – na sua maioria bolsonaristas – de tentar inverter o jogo e responsabilizar o governo eleito pela tentativa de golpe de 8 de janeiro. Insistem em dizer que os três pelotões da Força Nacional que estavam de prontidão poderiam garantir a integridade dos prédios federais, caso tivessem sido acionados pelo ministro da Justiça, Flávio Dino. Trata-se de uma aposta perdida.

•        Braga Netto dispensado

À base governista restará a possibilidade de convocar apenas novos três depoentes, caso desista de ouvir Braga Netto. Daí surgirá a necessidade de fazer a chamada “Escolha de Sofia”, uma vez que a lista dos possíveis investigados é bem mais ampla.

O ex-chefe da Casa Civil e companheiro de Bolsonaro na chapa à Presidência da República, foi convocado à CPMI pelo deputado Duarte Jr. (PSB-MA) e as senadoras Ana Paula Lobato (PSB-MA) e Eliziane Gama. O depoimento ocorreria em 19 de setembro. Na véspera, porém, a CPMI entendeu priorizar a convocação do ex-coordenador administrativo da Ajudância de Ordens da Presidência da República, o segundo-tenente Osmar Crivelatti. A mudança foi prejudicial e nenhum deles foi ouvido.

Em 18 de setembro, véspera do seu depoimento, Crivelatti recorreu ao Supremo Tribunal Federal (STF). Destoando de decisões anteriores daquela corte, o ministro André Mendonça concedeu liminar desobrigando-o de comparecer. A apresentação de Braga Netto foi remarcada para 5 de outubro, mas pode ser cancelada. Diante do número reduzido de sessões, o ex-chefe da Casa Civil de Bolsonaro pode dar lugar a outro militar considerado mais importante.

•        Requerimentos na gaveta

São vários os militares que despontaram ao longo desse tempo como possíveis golpistas. Alguns já se conheciam quando a CPMI foi instaurada. Mas, na época, prevaleceu o receio de se convocar oficiais das Forças Armadas e essas intimações foram deixadas na gaveta.

É o caso, por exemplo, do General do Exército Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, ex-comandante do Exército (04/2021 a 03/2022) e ex-ministro da Defesa (04/2022 a 12/2022) de Bolsonaro. Pelos cargos que ocupou e pela complacência com os acampamentos nas portas dos quartéis com militantes fanáticos postulando a intervenção militar, desde o início de agosto os políticos governistas requisitaram seu depoimento. Requerimentos que permanecem na gaveta da presidência da CPMI.

Sua convocação ganhou força em agosto quando o hacker Walter Delgatti Neto o apontou como seu anfitrião no ministério da Defesa, em agosto de 2022. Foi na primeira das cinco vezes em que Delgatti esteve no ministério, a pedido de Bolsonaro, para debater com técnicos da pasta as possíveis fragilidades das urnas eletrônicas. Ou seja, para buscar argumentos que reforçassem a tese de possíveis fraudes na eleição.

Apesar de as revelações de Delgatti, em 17 de agosto, terem repercutido, não foram capazes de levar o ex-ministro da Defesa de Bolsonaro a esboçar qualquer desmentido ou esclarecimento para esse possível encontro. Isso reforçou na CPMI a necessidade de convocá-lo. Dez requerimentos convocando-o foram apresentados. O senador Rogério Carvalho (PT-SE) foi além e pediu a acareação dele com o racker. Já a relatora Eliziane Gama requisitou as quebras dos sigilos telemático e telefônico. Tudo ainda guardado na gaveta do presidente da Comissão que agora precisa levá-los à votação.

•        General ‘maluco’

Outro militar que desperta a atenção e o interesse dos parlamentares da CPMI é o último comandante do Exército do governo Bolsonaro, o General Marco Antônio Freire. Sua convocação partiu das senadoras Eliziane Gama e Soraya Thronicke (Podemos-MS). A relatora protocolou ainda um pedido de quebra dos seus sigilos telefônico e telemático.

Tanto na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Atos Antidemocráticos da Câmara Legislativa do Distrito Federal – CLDF (em maio), como mais recentemente na CPMI, o general de Divisão Gustavo Henrique Dutra de Menezes, ex-Comandante Militar do Planalto (CMP), apontou Gomes Freire como responsável pela manutenção do acampamento na porta do QG do Exército, no Setor Militar Urbano (SMU). O movimento que abertamente pregava o golpe de estado com a intervenção dos militares.

A versão de Dutra foi corroborada pela reportagem de Marcelo Godoy, em O Estado de S.Paulo – Comandante do Exército impediu desmonte de acampamento no QG e chamou general de ‘maluco’, na segunda-feira (25/09). Narra que o próprio Gomes Freire, na reunião do Alto Comando do Exército, em 29 de dezembro, classificou Dutra como “um irresponsável, um maluco”, por ter autorizado a Polícia Militar do DF retirar o acampamento da porta do QG naquela data.

Com medo da reação de Bolsonaro, o comandante do Exército cancelou a operação e ordenou a Dutra a dispensa das tropas da Polícia Militar que aguardavam no SMU a operação em conjunto que havia sido acertada.

Já o ex-comandante da Marinha der Guerra, Almirante de Esquadra Almir Garnier Santos, apontado pelo ex-ajudante de ordem de Bolsonaro, o Tenente Coronel Mauro Cid, como o único dos comandantes militares que, em novembro, portanto após a eleição definida, concordou com a proposta de Bolsonaro de um golpe de estado para impedir a posse de Lula.

Tornou-se alvo de quatro convocações – não apreciadas – para depor. São das autorias dos deputados Duarte Jr. (PSB-MA), Jandira Feghali (PCdoB-RJ) e Rogério Correa (PT-MG), além da relatora Eliziane Gama. Essa também quer a quebra dos sigilos bancário, telemático e financeiro.

•        De olho no Gabinete do Ódio

Portanto, focando apenas nos militares suspeitos de, por ação ou omissão, estarem envolvidos com a tentativa de golpe, são quatro para serem ouvidos em apenas três sessões. Isso admitindo que a quarta caberá à oposição.

O problema aumenta ao se constatar que há muito mais suspeitos que a CPMI prometer investigar. Como o ex- assessor Filipe Garcia Martins, na definição da senadora Soraya, “um conhecido extremista, discípulo de Olavo de Carvalho, que auxiliava Bolsonaro em assuntos internacionais e diplomáticos, embora não tivesse qualquer experiência ou expertise nessa área”.

Ele já recebeu um voto público de censura, dado pelo plenário do Senado, por ter feito um gesto associado a supremacistas brancos durante um discurso do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), em 24 de março de 2021, na sessão que cobrava esclarecimentos do então ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, sobre iniciativas da pasta no combate ao Covid-19.

Os primeiros a o convocarem, ainda em maio, foram os deputados Erika Hilton (PSOL-SP) e Pastor Henrique Vieira (PSOL-RJ), entendendo ser ele um dos principais responsáveis pelo chamado “Gabinete do Ódio”, apontado como a origem das fake news disseminadas pelas redes sociais pelos bolsonaristas em geral.

Em setembro, após Mauro Cid, na delação premiada, relacionar Martins à famigerada minuta de golpe militar que circulou no entorno do ex-presidente, outros cinco parlamentares apresentaram convocações para o depoimento do ex-assessor. Mas todos continuam na gaveta da CPMI aguardando serem levados à apreciação dos parlamentares.

Da mesma forma que aguardam apreciações diversos pedidos de informações que poderá revelar os incentivadores, organizadores e/ou financiadores das manifestações golpistas.

•        Empresário espalhava fakes

A investigação em torno dos possíveis financiadores – sempre alardeada como uma das principais metas – ao que parece não será completa. Muitos pedidos de levantamento de sigilos e Relatórios de Informações Financeiras (RIFs) que confirmariam ou não esses envolvimentos continuam pendentes de apreciação.

Um exemplo é o empresário Meyer Joseph Nigri, fundador da Tecnisa, empresa do ramo imobiliário. Em um inquérito da Polícia Federal que tramita no STF, surgiram ao menos 18 mensagens encaminhadas pelo ex-presidente Bolsonaro ao empresário com ataques ao STF e mentiras sobre urnas eletrônicas e o processo eleitoral. Mensagens prontamente repassadas por Nigri, o que o tornou, no mínimo, um disseminador de fake news.

Na CPMI foram apresentados sete convocações para ele ser ouvido, dois pedidos de quebra de sigilos bancário, fiscal, telefônico e telemático e um pedido de Relatório de Inteligência Financeira (RIF) entre maio de 2022 até janeiro de 2023.

Nenhum desses documentos foi apreciado. Se o forem, dificilmente trarão informações a tempo hábil para o trabalho dos parlamentares, nesse exíguo prazo de pouco mais de 20 dias.

Resta portanto aos membros da CPMI decidirem quem convocarão para depor nas últimas três sessões até o dia 12 de outubro. Uma verdadeira Escolha de Sofia.

 

       CPMI: Após mentiras, Heleno deve ser indiciado em relatório final

 

Parlamentares governistas da CPMI do 8 de Janeiro dizem que, após mentir durante seu depoimento na terça-feira (26/9), o general Augusto Heleno deverá ser indiciado no relatório final da comissão junto de Jair Bolsonaro.

Na oitiva, Heleno afirmou, por exemplo, que o tenente-coronel Mauro Cid, então ajudante de ordens de Bolsonaro, não costumava participar de reuniões com o Alto Comando das Forças Armadas.

Rapidamente, porém, fotos antigas foram resgatas, mostrando Heleno e Cid ao lado de Bolsonaro em reuniões com os chefes do Exército, da Marinha e da Aeronáutica.

 “Quero esclarecer que o tenente-coronel Mauro Cid não participava de reuniões, ele era o ajudante de ordens do presidente da República. Não existe essa figura do ajudante de ordens sentar numa reunião dos comandantes de Força e participar da reunião. Isso é fantasia”, disse Heleno.

Como mostrou a coluna, governistas, como o líder do governo no Congresso, senador Randolfe Rodrigues (sem partido-AP), dizem que Bolsonaro será indiciado pelo relatório final da senadora Eliziane Gama (PSD-MA).

 

       Presidente do STM diz que não há “clima” para anistia a militares envolvidos com trama golpista

 

O ministro Joseli Camelo, presidente do Superior Tribunal Militar (STM), disse nesta quarta-feira (27), à GloboNews, que não existe “clima para anistia” a militares envolvidos em tramas golpistas do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). A entrevista foi dada no contexto da delação premiada do tenente-coronel Mauro Cid, que implicou uma série de comandantes das Forças Armadas nas tentativas frustradas de golpe de estado.

“As investigações sobre a tentativa de golpe caminham dentro do devido processo legal, e eu não vejo clima para anistia. Não há nenhuma disposição nem do Supremo Tribunal Federal, nem do Congresso para que nós tenhamos anistia”, declarou o presidente do STM.

O acordo de delação premiada firmado pelo tenente-coronel Mauro Cid causou um rombo no casco da fragata golpista colocada em curso por Bolsonaro após a derrota para Lula nas eleições presidenciais de 30 de outubro passado. Vazadas a conta-gotas nas últimas semanas, as novas informações reveladas por Cid à Polícia Federal (PF) causaram verdadeiro tsunami na cúpula das Forças Armadas. E asfixiaram principalmente o ex-comandante da Marinha, o almirante Almir Garnier Santos.

Segundo Cid, Garnier teria embarcado prontamente na tramoia golpista proposta por Jair Bolsonaro em reunião secreta com os comandantes das Forças Armadas. Servil ao ex-presidente, a quem devia favores, o marinheiro teria colocado a tropa à disposição do golpe, cobiçando surfar no mesmo enredo do vice-almirante Augusto Rademaker, que, juntamente com o general Costa e Silva e o tenente-brigadeiro Correia de Melo, compôs a tríade que decretou o Ato Institucional nº 1 em 9 de abril de 1964.

O golpe só não foi adiante pelo silêncio do tenente-brigadeiro do ar Carlos de Almeida Baptista Junior – que nas redes e em entrevistas nunca disfarçou seu apreço pelo presidente fascista. E, principalmente, pela pronta reação do general Marco Antônio Freire Gomes, então comandante do Exército, que chegou a ameaçar dar voz de prisão a Bolsonaro.

“É verdade que houve aquela reunião? Tudo indica que sim, mas isso não é uma prova de que houve. Houve aquela conversa? Foi colocada à disposição da Marinha? Isso tudo são ilações que são feitas em virtude de alguma coisa que vazou, mas pode ter vazado apenas uma parte”, comentou Camelo a respeito das delações de Mauro Cid.

 

Fonte: Brasil 247/Metrópoles/Fórum

 

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