Os povos indígenas
são essenciais na luta pela preservação do meio ambiente
A
demarcação de terras indígenas tem sido uma pauta bastante discutida no Brasil
nos últimos anos. Após quatro anos de negligência, 2023 já ficou marcado por
uma série de acontecimentos que reaqueceram o debate. Um desses eventos foi a
aprovação, pela Câmara dos Deputados, do Projeto de Lei 490/2007, que
estabelece o Marco Temporal como limite no tempo para a demarcação de terras
indígenas.
Esse
projeto de lei coloca em risco diversas conquistas e a própria existência dos
povos indígenas, além de ameaçar a fauna e a flora brasileiras e a existência
desses povos, comprometendo o futuro do nosso clima, das nossas águas, da nossa
alimentação e da nossa saúde. Tamanho retrocesso resultaria do fato de que o
Marco Temporal tem como premissa redefinir a forma como uma terra indígena (TI)
é demarcada. O PL propõe que a demarcação dessas terras só aconteça uma vez que
seja comprovada a presença de povos originários vivendo nela na data da
promulgação da Constituição brasileira, do ano de 1988.
A
questão do Marco Temporal deixou de ser uma pauta nacional para ser abordada
globalmente. No dia 13 de junho, o relator da ONU sobre os direitos dos povos
indígenas, José Francisco Calí Tzay, afirmou que aprovar o projeto de lei seria
contrário aos padrões internacionais e que é preciso proporcionar maior
proteção para as comunidades indígenas. Diante deste contexto, é necessário
enfatizar que o projeto coloca em risco 63% das reservas indígenas atuais,
deixando essas terras expostas ao garimpo ilegal, ao desmatamento, à mineração
e a outro agentes comprometedores para a saúde do planeta.
Por
isso, é necessário ter em mente o papel das organizações e comunidades
indígenas como as grandes aliadas para o enfrentamento do aquecimento global e
a preservação do ecossistema brasileiro. De acordo com o levantamento divulgado
em 2022 pelo Instituto de Recursos Mundiais e Climate Focus, o Brasil não será
capaz de cumprir as metas climáticas definidas pela Agenda 2030 da ONU, plano
global para promover um planeta melhor até o tempo pré-determinado, a não ser
que proteja os territórios indígenas.
Segundo
a mesma pesquisa, 92% das zonas protegidas absorvem mais carbono do que emitem,
e cada hectare é responsável pela captura de cerca de 30 toneladas desse gás de
efeito estufa por ano. Isso ocorre, principalmente, devido às comunidades
adotarem uma economia de subsistência, respondendo somente por 1,6% do
desmatamento da Amazônia nos últimos 36 anos, segundo o estudo lançado pelo
MapBiomas no ano de 2021. Em contrapartida, os locais ocupados pelo grande
setor da agropecuária totalizam 52,3% da degradação do ecossistema, de acordo
com o censo do IBGE de 2010.
O
PL 490/2007, que ainda vai passar pela apreciação do Senado, agora chamado PL
2903/2023, também é preocupante para as aldeias isoladas. Dados de um estudo do
Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam) em parceria com a Coiab
(Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira) divulgado em
2023, revelam que 34% das 44 reservas com presença dos povos isolados não
tiveram seus processos de regularização de demarcação de terra concluído, sendo
que 12 estão sob grande ameaça de garimpo e queimada ilegal.
A
história dos povos indígenas no Brasil é marcada pela luta contínua contra
todas essas violações de direitos. Hoje, a defesa dos nossos direitos tem
ganhado cada vez mais visibilidade, mas é preciso reforçar a necessidade da
participação de toda a sociedade nessa luta. Para isso há diversos mecanismos e
entidades que ajudam a fazer a conexão com a nossa causa, como o Fundo Brasil
de Direitos Humanos, que sistematicamente promove campanhas a favor dessa e de
outras iniciativas emergentes.
A
preservação das terras e das vidas indígenas é a preservação da vida como um
todo e do futuro do nosso país e do planeta. Por isso, enquanto não houver
garantia de sobrevivência e da manutenção da qualidade de vida dos povos
indígenas, continuaremos nos mobilizando e ocupando mais espaços na política
para, desse modo, garantir liberdade e dignidade aos nossos povos e proteção às
florestas brasileiras.
Ø
A
natureza também tem seus direitos. Por Felício Pontes
A
discussão sobre os direitos da Natureza vem ganhando força pelo mundo. Há
diversos exemplos de conquistas relacionadas ao Direito da Natureza, como a
nova Constituição do Equador, a primeira no mundo a reconhecer expressamente no
seu texto os Direitos da Natureza.
A
Constituição do Equador foi um marco para todos que defendemos os direitos da
natureza. Ela surge através do pensamento dos povos indígenas do Equador.
Trata-se de novidade para a sociedade dominante, oriunda do neocolonialismo.
Porém, não para os povos originários da América Latina, os quais sempre
mantiveram uma relação de respeito para com a Natureza.
Se
conseguirmos no Brasil fazer com que também sejam reconhecidos os direitos de
Natureza, a primeira grande consequência será fazer com que esses grandes
projetos que afetam de modo irremediável os ecossistemas, sobretudo na
Amazônia, não possam ser realizados, pois afetariam de maneira a não permitir
sua regeneração, o que, na prática, equivaleria a um ecocídio. Um exemplo disso
é a Hidrelétrica Belo Monte, no rio Xingu, Pará.
Recentemente,
o rio Laje, em Guajará-Mirim (RO), foi reconhecido como um ente vivo e sujeito
de direito. Essa foi a primeira vez que um rio teve seus direitos reconhecidos
por lei no país. Este marco legal estabelece que o Rio Laje possui o direito de
“manter seu curso inalterado”, de “prover e receber nutrição” e “coexistir com
condições físico-químicas que garantam seu equilíbrio ecológico”.
A
partir de agora, a própria mentalidade do Judiciário poderá mudar no sentido de
fazer com que esse reconhecimento seja efetivo, o que significa que nenhum
projeto que cause morte no rio possa ser implantado na sua bacia. O STF já deu
sinais de que nossa Constituição é ecocêntrica, e não antropocêntrica.
O
reconhecimento do Rio Lage é um passo gigantesco para que outros rios, ou
outros ecossistemas no Brasil, tenham esse reconhecimento até que se chegue ao
nível que chegou a Constituição do Equador e, em seguida, da Bolívia.
Diante
da emergência climática em que vivemos hoje, o reconhecimento dos direitos da
Natureza pode nos ajudar a sair desse caminho rumo a um abismo que coloca em
risco a própria espécie humana.
Trata-se
de uma nova relação com a Natureza. O pensamento de René Descartes, que via o
homem como mestre e senhor da Natureza, não mais deve vigorar. Em seu lugar,
deve-se colocar o pensamento dos povos originários. Esse será nosso grande
passo civilizatório deste século.
Ø
Garimpo
ilegal devasta área de 118 hectares em Rondônia e no Amazonas
Agentes
da Polícia Federal (PF), com servidores do Instituto Chico Mendes de
Preservação da Biodiversidade (ICMBio), desarticularam uma estrutura de
extração ilegal de cassiterita em uma região de divisa entre os estados de
Rondônia e do Amazonas. No local, foi encontrada uma área de devastação de 118
hectares, equivalente ao tamanho de 118 campos de futebol.
O
delegado da Superintendência da Polícia Federal em Rondônia, Thiago Peixe
explicou que o local foi localizado por meio do sistema de monitoramento via
satélite, associado às denuncias da população local. “É uma região distante
tanto das unidades de policiamento de Rondônia, quanto do Amazonas, uma espécie
de zona cinzenta, onde só conseguimos chegar com a ajuda das aeronaves”, diz
sobre os dois equipamentos disponibilizado pelo ICMBio.
Segundo
o delegado, com a aproximação das aeronaves ao local, os garimpeiros fugiram e
se esconderam na mata para evitar o flagrante. O garimpo ilegal atuava em uma
área do Parque Nacional Campos Amazônicos e da Terra Indígena Tenharim
Marmelos.
A
operação, chamada pela PF de Retomada, contou com a participação 20 policiais
federais, além de oito servidores do ICMBio, que atuaram na região entre os
dias 29 de junho e 2 de julho. No local, foram identificadas a extração ilegal
de cassiterita, de onde é extraído estanho.
Segundo
Thiago Peixe, esse tipo de garimpo ilegal causa graves prejuízos ambientais.
Além do desmatamento, há ainda o risco de contaminação por combustível e
substâncias tóxicas usadas na resumidora, equipamento que separa o minério da
terra. “Na região há rios de menor volume que alcançam rios maiores e os
próprios buracos escavados na mineração representam um risco à contaminação do
lençol freático”, explica.
Na
estrutura utilizada pelos garimpeiros havia dez áreas de acampamento, onde
foram encontradas duas escavadeiras hidráulicas, 11 motores de dragagem, quatro
geradores de energia elétrica, oito veículos, entre motocicletas e
caminhonetes. Toda a estrutura foi destruída pela polícia, que estima um
prejuízo de R$ 8 milhões à organização criminosa.
Fonte:
Le Monde Diplomatique Brasil/Brasil de Fato
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