Lava Jato burlou soberania ao agir em conluio com EUA por dinheiro da
Petrobras, diz jurista
A Polícia Federal anunciou que fará pente-fino nas
operações financeiras realizadas pela Lava Jato, acusada de ter agido em
conluio com os EUA para repartir recursos da Petrobras. A Sputnik Brasil
conversou com especialistas para entender qual o papel de Washington e as
implicações jurídicas para os procuradores da Lava Jato.
Nesta semana, o ministro da Justiça, Flávio Dino,
acionou a Polícia Federal para apurar indícios de conluio entre procuradores da
Operação Lava Jato e autoridades estrangeiras para repartir recursos da
Petrobras.
"Encaminhei hoje à Polícia Federal o caso dos
acordos feitos por procuradores com outros países, sem o procedimento legal. O
objetivo é a investigação sobre a origem e o destino de bilhões de reais e os
motivos que levaram a tais acordos com autoridades estrangeiras", escreveu
Dino nas redes sociais.
A decisão veio após a revelação de diálogos nos
quais Dallagnol negociava com autoridades dos Estados Unidos e da Suíça a
repartição dos recursos oriundos de multas impostas contra a Petrobras no
âmbito da Operação Lava Jato. As negociações eram conduzidas pelo aplicativo de
mensagens Telegram, evitando os canais oficiais previstos em lei, conforme
apuraram os jornalistas Leandro Demori e Jamil Chade.
De acordo com os diálogos, incluídos nos arquivos
da Polícia Federal no âmbito da Operação Spoofing, Dallagnol reporta aos seus
colegas suíços o andamento das negociações com autoridades dos EUA sobre a
repartição do dinheiro.
"Meus amigos suíços, acabamos de ter uma
reunião introdutória de dois dias com a SEC [Comissão de Valores Mobiliários]
dos EUA. Tudo é confidencial, mas eu disse expressamente a eles que estamos
muito próximos da Suíça e eles nos autorizaram a compartilhar as discussões da
reunião com vocês", escreveu Dellagnol.
Ao detalhar os temas tratados na reunião com os
norte-americanos, Dallagnol relata casualmente que "o Departamento de
Justiça dos EUA e a SEC aplicarão uma penalidade enorme à Petrobras", mas
disseram que "se a Petrobras pagar algo ao governo brasileiro em um
acordo, eles creditariam isso para diminuir sua penalidade, e que o valor poderia
ser algo como 50% do valor do dinheiro pago nos EUA".
O montante seria destinado a um fundo privado que o
Ministério Público Federal (MPF) do Paraná planejava criar para gerir os
recursos obtidos em função da Operação Lava Jato. Isto é, a operação buscava
utilizar o seu poder de investigação para angariar fundos para si própria, em
prejuízo da empresa brasileira. A instauração do fundo privado dos procuradores
de Curitiba, no entanto, foi suspensa por decisão do Supremo Tribunal Federal
(STF).
De acordo com o advogado e autor do livro
"Geopolítica da Intervenção", sobre a participação dos EUA na
Operação Lava Jato, Fernando Augusto Fernandes, membros da Lava Jato auxiliaram
autoridades norte-americanas a coletar elementos contra a Petrobras.
"Eles burlaram a soberania nacional para que
esses procuradores [dos EUA] fossem a Curitiba e interrogassem os réus e
delatores da Petrobras, entregando em solo brasileiro elementos que
viabilizaram a imposição de multas bilionárias à empresa", disse Fernandes
à Sputnik Brasil. "Eles se mancomunaram com autoridades dos EUA para que a
Petrobras fosse multada."
Os procuradores chegaram a entregar documentos
sigilosos sobre a empresa brasileira, ferindo não só princípios da
administração pública, mas também segredos comerciais da Petrobras, revelou
Fernandes.
No diálogo clandestino com autoridades suíças,
Dallagnol diz que sua intenção é proteger a imagem da Lava Jato, a sociedade
brasileira e a própria Petrobras.
"Eles [os norte-americanos] não precisariam de
nossa cooperação, mas isso pode facilitar as coisas e, se cooperarmos,
entendemos que não causaremos nenhum dano e poderemos trazer algum benefício
para a sociedade brasileira, que foi a parte mais prejudicada (e não os
investidores dos EUA). Como estávamos preocupados com uma penalidade enorme
para a Petrobras, muito maior do que tudo o que recuperamos no Brasil, e
preocupados com o fato de que isso poderia prejudicar a imagem de nossa
investigação e a saúde financeira da Petrobras, pensamos em uma solução
possível, mesmo que não seja simples", escreveu Dallagnol.
Para o advogado membro do Instituto dos Advogados
Brasileiros (IAB) e professor da Universidade Cândido Mendes (UCAM), Sérgio
Sant'Anna, o argumento exposto pelo ex-procurador "não faz nenhum
sentido".
"Esse argumento só teria lógica, se
estivéssemos pensando nos interesses particulares desses agentes, que buscam
justificar as inúmeras ilegalidades que cometeram durante a operação",
disse Sant'Anna à Sputnik Brasil. "Se ele realmente tivesse essa preocupação,
as negociações teriam que ter sido oficializadas junto ao Estado brasileiro e
percorrido as instâncias do MPF."
O advogado ainda nota os prejuízos diretos e
indiretos que a Operação Lava Jato gerou na economia brasileira, comprovados em
relatório da Comissão de Direito Constitucional do Instituto dos Advogados
Brasileiros.
"O relatório prova o prejuízo causado ao
Estado brasileiro, à cadeia produtiva da Petrobras, à geração de empregos, à
arrecadação e atividade econômica do país", relatou Sant'Anna. "Dizer
que isso foi feito para proteger a Petrobras e a sociedade é realmente um
escárnio."
O jurista ainda lembra que "todos os
brasileiros concordam que precisamos de investigações para o combate a
corrupção e irregularidades. Isso é uma missão do Ministério Público que todos
nós apoiamos. Mas não podemos combater a corrupção com corrupção. Combater
irregularidades à margem da Constituição e do devido processo legal".
• Influência
dos EUA
A revelação de conluio entre procuradores e
autoridades estrangeiras recoloca a influência dos EUA na Operação Lava Jato no
topo da agenda.
Em seu livro "Geopolítica da
Intervenção", o advogado Fernando Fernandes revela que a Operação Lava
Jato foi um aperfeiçoamento das estratégias norte-americanas de intervenção na
política doméstica brasileira.
"Essas estratégias tiveram início junto aos
militares brasileiros, no âmbito da Doutrina de Segurança Nacional, que
culminou no golpe militar de 1964", explicou Fernandes.
"Posteriormente, tivemos a fase de influência sob a égide DEA [Administração
de Fiscalização de Drogas dos EUA], no âmbito da Guerra às Drogas."
Em 2009, os EUA inauguraram o Projeto Pontes, com o
objetivo de cooptar procuradores e juízes brasileiros, conforme detalhou
telegrama entre autoridades norte-americanas revelado pelo site WikiLeaks.
"Os telegramas chegam a dizer que o projeto
foi um sucesso, já que grande número de procuradores e juízes brasileiros se
portariam contra o governo brasileiro e passariam a encabeçar forças-tarefas em
São Paulo, Brasília e Paraná", revelou Fernandes. "No final, a
força-tarefa que vingou foi a do Paraná, se transformando na Operação Lava
Jato."
• Consequências
para Dallagnol?
As revelações sobre o conluio de Dallagnol com
autoridades de EUA e Suíça reforçam elementos já revelados pelas conversas
entre procuradores obtidas pelo portal Intercept Brasil, no âmbito da Vaza
Jato. As consequências jurídicas para os agentes da operação, no entanto,
deixam a desejar.
"Espero que, dessa vez, tenhamos uma
investigação real", disse o advogado. "Esses assuntos são
estratégicos para o desenvolvimento nacional e não podem se limitar a denúncias
feitas nas páginas dos jornais", disse o advogado.
Para Fernandes, Dallagnol e os demais procuradores
deveriam ser processados por quebra de sigilo de documentos sobre a Petrobras e
responsabilizados civilmente pelas vultuosas multas aplicadas contra a empresa.
"Também defendo que os diálogos entre
procuradores [no Telegram] são provas lícitas contra autoridades que cometeram
abusos, apesar de terem sido obtidas por hackers. A ilicitude da prova serve
para proteger o cidadão perante o Estado, e não para proteger autoridades
públicas de abuso", argumentou Fernandes.
Nesta terça-feira (25), o portal UOL reportou que a
Polícia Federal (PF) fará um pente-fino em todas as movimentações financeiras
realizadas conduzidas por contas bancárias abertas pela 13ª Vara Federal de
Curitiba, que ainda estão em operação e sob gestão do judiciário relacionadas à
Operação Lava Jato.
Ø Acordos de leniência vão ao Plenário do STF
Relator de uma ação que tenta derrubar, no STF,
acordos de leniência firmados pela Lava-Jato, o ministro André Mendonça enviou
ao plenário da Corte a matéria, para que todos os ministros decidam sobre o
mérito do pleito apresentado por três partidos: PSOL, PCdoB e Solidariedade.
A matéria questiona os parâmetros adotados nos
acordos de leniência celebrados com empresas flagradas no esquema de corrupção
que alimentava os bolsos de políticos e campanhas de partidos durante o
petrolão.
As legendas argumentam que os pactos, considerados
demasiadamente prejudiciais às empresas, foram celebrados antes do Acordo de
Cooperação Técnica, firmado em 2020, que sistematiza regras para o
procedimento.
Os partidos também reclamam a suposta atuação
abusiva do MPF na negociação e celebração dos acordos e pedem que o STF
reconheça que os termos anteriores ao entendimento vigente foram firmados em
“situações de anormalidade político-jurídico-institucional”.
Para Mendonça, a relevância da matéria debatida na
ação autoriza que a decisão seja tomada em caráter definitivo pelo plenário.
Ø Tebet chama de “desastre” recondução de Aras
A ministra do Planejamento, Simone Tebet, afirmou
nesta quarta-feira (26) que uma eventual recondução de Augusto Aras ao cargo de
procurador-geral da República seria “decepcionante” e um “desastre”.
Tebet deu a declaração em entrevista à jornalista
Miriam Leitão, na GloboNews.
“Decepcionante [a defesa de aliados ao PT pela
recondução de Aras]. E, se isso [a recondução] efetivamente acontecer, ao meu ver,
seria um desastre. E eu ficaria extremamente decepcionada.”
“Fala alguém que votou, em um primeiro momento, na
indicação de Aras, mas votou contra a recondução dele justamente por ver que
ele estava fazendo o Ministério Público, que é um órgão de fiscalização e
controle da máquina pública, uma gestão de subserviência e de aceno político ao
presidente de plantão”, disse.
Aras foi indicado ao cargo por duas vezes pelo
ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). O mandato do atual chefe da
Procuradoria-Geral da República (PGR) e dos Ministério Públicos Federal e
Eleitoral se encerra em setembro deste ano.
Segundo a Constituição, a escolha do nome do novo
PGR é competência do presidente da República, que deve nomear um integrante da
carreira de procurador da República com mais de 35 anos.
Nos bastidores, como mostrou o blog da Natuza Nery
no g1, Augusto Aras mantém a crença de que poderá ser reconduzido, pela
terceira vez, ao cargo por decisão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva
(PT).
Em quatro anos à frente da PGR, Augusto Aras
colecionou, no entanto, críticas de opositores a Bolsonaro. Entre eles estão
membros do PT, partido ao qual Lula é filiado, e a própria ministra Simone
Tebet.
No último ano, quando ainda era candidata a
presidente, Tebet chegou a dizer que daria nota “zero” para a atuação do
procurador-geral da República. Ela fazia referência à postura de Aras diante
dos pedidos de apuração enviados pela CPI da Covid sobre possíveis crimes
cometidos pelo governo Bolsonaro no combate à pandemia.
Com a proximidade do término do mandato de Aras,
membros de partidos do chamado Centrão e políticos aliados ao Planalto têm
defendido reconduzi-lo ao cargo.
A avaliação é de que o atual PGR segue a linha
jurídica chamada de “garantismo”, que prioriza as liberdades individuais, em
contraposição aos defensores do “legalismo” que defendem uma interpretação fria
da lei. Políticos críticos da Lava Jato atribuem os desdobramentos da operação
à tese legalista.
A escolha do nome PGR é considerada estratégica.
Isso porque é ele quem atua em processos que tramitam no Supremo Tribunal
Federal (STF), no Superior Tribunal de Justiça (STJ) e no Tribunal Superior
Eleitoral (TSE).
Cabe ao procurador-geral da República, por exemplo,
propor investigações e processos contra autoridades com foro privilegiado —
presidente da República, parlamentares e governadores.
Desde 2003, presidentes têm utilizado a chamada
lista tríplice da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) como
orientação para a escolha do comandante da Procuradoria-Geral da República. O
documento apresenta os três nomes mais votados pelos pares do Ministério
Público.
A Constituição não obriga que o presidente decida
entre os integrantes da lista enviada pela ANPR.
Em mandatos anteriores, no entanto, Lula e os presidentes
Dilma Rousseff (PT) e Michel Temer (MDB) levaram a lista tríplice como base. A
exceção foi Jair Bolsonaro, com a escolha de Augusto Aras em 2019.
No último mês, a ANPR concluiu a definição do
documento:
# Luiza Frischeisen
# Mario Bonsaglia
# José Adonis
Lula, porém, tem sinalizado que não deve acatar a
proposta da associação.
No ano passado, quando candidato a presidente, ele
declarou que não iria informar se iria acatar ou não a lista tríplice da ANPR
caso fosse eleito.
Em março deste ano, questionado sobre o assunto,
Lula disse não penar “mais em lista tríplice”.
“Não penso mais em lista tríplice. Não penso mais,
porque quando vim para a presidência, trouxe a minha experiência do sindicato.
Então, tudo para mim era lista tríplice. Já está provado que nem sempre a lista
tríplice resolve o problema. Então, vou ser mais criterioso para escolher o
próximo procurador-geral da República”, afirmou.
O escolhido do presidente para o cargo precisa
passar por sabatina e votação no Senado e tem mandato de dois anos, podendo ser
reconduzido.
<><> Tebet prega “paz institucional”
A ministra do Planejamento e Orçamento, Simone
Tebet, afirmou que “o Brasil precisa de paz institucional”. Ela fez as
declarações ao ser questionada sobre a relação que mantém com o ministro da
Fazenda, Fernando Haddad. Tebet declarou que a economia tem uma agenda extensa
até o final de agosto, quando deve ser discutido o novo arcabouço fiscal, em
tramitação no Senado, a Lei Orçamentária Anual (LOA) e outros temas econômicos.
Tebet concedeu entrevista à jornalista Miriam
Leitão, da Globo News. Ela afirmou que tem boa relação com o ministro da
Fazenda, Fernando Haddad. “O Brasil está precisando de paz institucional E isso
interfere nos números. Não só as medidas que foram colocadas no inicio do
governo pelo ministro, mas por que estão vendo essa sinergia. Não só entre o
ministério da Fazenda e do Planejamento, mas também com o Ministério da
Indústria e Comércio Exterior (Mdic), do vice-presidente”, disse.
Tebet defendeu a responsabilidade fiscal, mas sem a
retirada de recursos das áreas sociais. “Eu não sou economista, mas sou mais
liberal. Sei que não existe responsabilidade social sem responsabilidade
fiscal. Mas tanto no Brasil que temos quanto no Brasil que teremos, tenho
sinergia com o ministro Haddad”, disse.
Ao ser questionada sobre o nome do economista
Marcio Pochmann para presidente do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE), Tebet afirmou que não tinha conversado com o presidente
Lula sobre o tema e que não conhece o profissional. O IBGE é uma autarquia
subordinada a pasta de Tebet.
“Eu vou estar ouvindo se esses ruídos estão
surgindo, provavelmente já deve ter nomes circulando. Eu não conheço, então não
posso dizer. No momento em que ele estava no governo, eu estava no meu estado.
Como não sou economista e não o conheço, não posso fazer nenhuma consideração”,
disse.
Ex-presidente do Instituto de Pesquisa Econômica
Aplicada (Ipea) e da Fundação Perseu Abramo, Pochmann, atualmente, é presidente
do Instituto Lula para o triênio 2020-2023. O economista integra a ala mais
heterodoxa do governo, na contramão da cartilha mais fiscalista e liberal que
Tebet e seus secretários respeitam e que ajuda a amenizar a desconfiança do
mercado financeiro em relação ao atual governo.
O nome dele foi confirmado pelo governo horas após
a entrevista ser gravada, indicando que a ministra pode não ter sido ouvida no
processo. A notícia da escolha foi repassada pelo ministro da Secretaria de
Comunicação (Secom), Paulo Pimenta.
Fonte: Sputnik Brasil/Veja/g1/Correio Braziliense
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