sábado, 8 de julho de 2023

Herdeiros de Lula e Bolsonaro se aproximam

A reforma tributária pôs cara a cara o ministro Fernando Haddad (Fazenda) e o governador Tarcísio Gomes de Freitas (SP). Um é do PT, nome forte do presidente Lula e chegou ao segundo turno da eleição à Presidência em 2018. O outro é do Republicanos e estreou na política já como candidato vencedor ao governo do principal Estado do País, graças ao ex-presidente Jair Bolsonaro. Adversários em 2022 em São Paulo, são virtuais herdeiros do espólio de Lula e Bolsonaro e podem se enfrentar de novo em 2026.

A votação da reforma consolidou a posição de Haddad como o maior articulador político de Lula e catapultou Tarcísio à política nacional, como líder de uma nova direita mais moderna e pragmática. O risco dele é perder o que já tem, ou tinha – o apoio de Bolsonaro – e não ganhar o que ainda não tem – a simpatia do centro e da maioria da centro-direita.

Na reunião do PL nesta quinta-feira, 6, Bolsonaro assumiu o ciúme do sucessor natural e parte da bancada vaiou o governador. Tarcísio, porém, tinha de aproveitar a reforma para usar seus trunfos: o governo de São Paulo, o conhecimento do Congresso (foi assessor parlamentar) e a capacidade de aprender e se adaptar rapidamente. E, cá entre nós, é bom para o governador ser alvo de Bolsonaro. Mostra força.

Há duas avaliações sobre suas articulações. Uma é de que ele desembarcou em Brasília disposto a marcar posição contra a reforma, mas teve de recuar para entrar em sintonia com sua base em São Paulo, onde as indústrias, o setor financeiro, a direita liberal e milhões de eleitores são a favor da reforma. A outra é que ele já chegou ao debate disposto a aprovar a reforma, mas deixando suas digitais, ou seja, negociando mudanças.

O fato é que Haddad e Tarcísio, apesar das eleições no ano passado, aproximaram-se, conversam civilizadamente. Um episódio foi decisivo: no primeiro debate de 2022, Tarcísio jogou no ar contra Haddad a versão do “pior prefeito de São Paulo”, mas chegou ao segundo debate pedindo desculpas. Haddad gostou.

Três outros fatores empurraram a reforma tributária na Câmara: o comando do presidente Arthur Lira, a opinião pública e os R$ 5,1 bilhões em emendas parlamentares, a velha “compra de votos”. Bolsonaro ficou falando sozinho, contra a reforma e tentando levar o debate para o campo do “governo contra oposição”. Venceu o coro de Lula, Haddad, Tarcísio, Lira e o relator, deputado Aguinaldo Ribeiro: revisar o cipoal tributário não é parte da guerra entre Lula e Bolsonaro, esquerda e direita, PT e PL, mas sim uma necessidade do País. E não é de hoje…

 

       Zema quer ser o novo Bolsonaro

 

Cotado como um dos possíveis herdeiros políticos do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), o governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), abriu conversas com rivais do PT e interlocutores do chefe do Executivo paulista, Tarcísio de Freitas (Republicanos), de olho na próxima corrida ao Palácio do Planalto, em 2026. Durante viagem a Brasília nesta semana, agendada inicialmente para discutir ajustes na reforma tributária, Zema se reuniu com lideranças de PP, Republicanos e União Brasil que se alinham à oposição a Luiz Inácio Lula da Silva, e conversou sobre uma aliança voltada à próxima eleição presidencial.

O périplo de Zema começou na manhã de terça-feira numa reunião com o vice-presidente nacional do União Brasil, Antonio Rueda. Também participaram do encontro, revelado pelo jornal Folha de S.Paulo, lideranças do partido na Bahia, como o atual prefeito de Salvador, Bruno Reis, e seu antecessor, ACM Neto, que enfrentam a concorrência do PT pela capital baiana em 2024.

Na quarta, Zema conversou com o senador Ciro Nogueira (PI), presidente do PP, e com o deputado federal Marcos Pereira (SP), presidente do Republicanos.

— Nosso foco foi a reforma tributária, mas obviamente no caso de Republicanos, União Brasil e PP os encontros também serviram para falar dos rumos desse campo da direita e da centro-direita. A caminhada (até 2026) é longa, mas é importante que esses atores políticos estejam alinhados e construam esta unidade — afirmou o chefe da Casa Civil do governo de Minas, o ex-deputado Marcelo Aro (PP).

Ao GLOBO, um cacique partidário que participou dos encontros disse que Zema mostrou foco “total” na construção de uma aliança com outros possíveis herdeiros do espólio do bolsonarismo. Na avaliação de parlamentares, o governador de Minas tem evitado disputar protagonismo e adota uma postura estratégica de aliado de Tarcísio.

O deputado José Rocha (União-BA), aliado de ACM Neto e que defende o apoio a Tarcísio na próxima disputa presidencial, vê abertura para uma chapa com Zema.

— Se tiverem juízo, vão relembrar a aliança do “café com leite” (de Minas e São Paulo, na República Velha). Uma chapa com os dois seria muito forte — declarou Rocha.

Assim como o governador de São Paulo, Zema mostrou objeção ao modelo do novo Conselho Federativo, responsável por distribuir os valores arrecadados com o futuro IVA dual, e pressionou para que a composição do colegiado leve em conta o peso populacional ou o volume de arrecadação. O pleito favorece estados como Minas e São Paulo. Tarcísio, contudo, virou o principal alvo de aliados de Bolsonaro ao tomar a dianteira e declarar apoio ao texto da reforma, após sinalizações do relator, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), de que atenderia as solicitações.

Interlocutores avaliam o governador de Minas como mais “acanhado” e com menos traquejo político do que outros cotados à corrida presidencial, como o próprio Tarcísio e o governador do Paraná, Ratinho Jr. — a quem Zema já visitou. No entanto, consideram que ele tem melhorado a relação com a classe política, além de acenar à base bolsonarista.

No sábado, dia seguinte ao julgamento no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que condenou Bolsonaro à inelegibilidade, o governador de Minas publicou uma frase, atribuída ao ditador italiano Benito Mussolini, que chama atenção para tentativas de “restringir a liberdade do indivíduo”. Essa retórica constantemente é levantada pelo ex-presidente, por exemplo, ao criticar a atuação do Judiciário em casos em que é alvo.

Para um interlocutor de Bolsonaro e de Tarcísio, Zema procura dosar os acenos para que não pareçam “artificiais”, levando em conta o fato de não ser tão próximo ao ex-presidente quanto o governador de São Paulo.

A movimentação nacional de Zema ocorre em paralelo a uma fase de turbulências envolvendo seu governo e a oposição em Minas, capitaneada pelo PT. Na semana passada, após um vácuo na articulação do seu governo, a oposição obstruiu trabalhos na Assembleia Legislativa de Minas e adiou a votação do Programa de Acompanhamento e Transparência Fiscal , pré-requisito para a adesão do estado ao regime de recuperação fiscal.

Como o prazo vencia em junho, a situação abriu brecha para que o Tesouro Nacional executasse uma dívida de R$ 16,4 bilhões do estado com a União. O governo de Minas criticou ontem a cobrança, afirmando que ela representaria o “colapso das contas públicas”, e ingressou no Supremo Tribunal Federal para anular a execução, alegando que a exigência de aval dos deputados estaduais é ilegal. Ainda ontem, após acordo, parlamentares aprovaram o PAF, com voto contrário da oposição.

 

       Tarcísio mantém estratégia de afastamento gradual de Bolsonaro

 

O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), tentou equilibrar forças durante os seis primeiros meses de gestão — ao mesmo tempo em que participou de eventos com Jair Bolsonaro (PL) e permaneceu como seu aliado, não deu as costas para o Planalto e o Judiciário. Ontem, entretanto, ficou explícito que a relação com o padrinho político está em crise — Tarcísio foi vaiado em reunião do PL após ser interrompido pelo ex-presidente.

•        Reuniões com STF

Como governador de São Paulo, Tarcísio se encontrou com quase todos os ministros do STF — a Corte foi alvo constante de críticas do padrinho político. A agenda oficial registrou reuniões com oito dos dez ministros: Alexandre de Moraes, André Mendonça, Cármen Lúcia, Dias Toffoli, Gilmar Mendes, Luiz Fux, Luís Roberto Barroso e Nunes Marques. Só Rosa Weber e Edson Facchin não foram visitados.

Gilmar, Moraes e Fux se reuniram duas vezes, cada um, com Tarcísio. Já Barroso, Mendonça, Nunes Marques e Toffoli só conversaram uma vez com o governador desde janeiro. Aposentado em abril, Ricardo Lewandowski esteve com Tarcísio em 21 de março.

•        Bolsonaristas e suas indicações políticas não foram privilegiados na montagem do primeiro escalão do governo de Tarcísio

À Folha de S.Paulo, aliados do ex-presidente reclamaram que Tarcísio ignorou e se negou a dar cargos a indicados por eles. Apenas dois dos 24 secretários são considerados bolsonaristas raiz — Sonaira Fernandes (Políticas para a Mulher) e Guilherme Derrite (Segurança Pública).

•        Tarcísio não foi ao evento do PL Mulher em São Paulo com a presença de Bolsonaro e da ex-primeira-dama Michelle

O prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), e Valdemar Costa Neto, presidente do PL e desafeto do governador paulista, participaram da cerimônia, realizada em maio.

A interlocutores, Tarcísio, que se apresenta como técnico, já criticou Valdemar, um articulador político. Quinta, houve uma escalada da tensão entre Tarcísio e aliados do ex-presidente.

O governador foi alvo de queixas e vaias na reunião do PL sobre a reforma tributária, em Brasília, um dia depois de ter dado entrevista junto do ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT).

Bolsonaro criticou publicamente o governador.

A crise com o padrinho político ocorre logo após o TSE tornar Bolsonaro inelegível — Tarcísio foi apontado como herdeiro político do ex-presidente.

•        Tarcísio e Valdemar não são próximos, mas Republicanos e PL negociaram posições estratégicas na Câmara dos Deputados e na Alesp

O deputado federal Marcos Pereira (Republicanos-SP) teve apoio do partido de Bolsonaro para ocupar 1ª vice-presidência em Brasília. Em troca, a legenda de Tarcísio apoiou André do Prado (PL) para presidente da assembleia paulista.

Em fevereiro, bolsonaristas já tinham ficado incomodados com Tarcísio por ele ter aparecido ao lado do presidente Lula (PT) em viagem ao litoral norte de São Paulo. Enchentes causaram 36 mortes e deixaram mais de 330 pessoas desabrigadas — a região mais prejudicada foi a de São Sebastião e Bertioga. Tarcísio passou “tempo demais” no litoral norte, disse um aliado ao UOL. Um membro da base do governador afirmou que uma viagem de dois ou três dias seria suficiente, além da melhor divulgação das ações. À época, Tarcísio seguiu para Ubatuba no sábado, 19 de fevereiro, e voltou a ter eventos na capital na segunda-feira, dia 27, de acordo com a agenda.

Houve também polêmicas locais — uma delas é a sugestão da mudança da sede administrativa do governo para o Centro de São Paulo. Hoje, o Palácio dos Bandeirantes, no Morumbi, zona oeste, desempenha as duas funções — sede administrativa e residência oficial. A nova sede é promessa de campanha. A primeira-dama, Cristiane Freitas gosta de morar no Morumbi, segundo interlocutores de Tarcísio. O atual governador mantinha um apartamento no bairro antes da eleição. Hoje, o casal vive na ala residencial do palácio — que, sozinha, mede 668 metros quadrados.

A feijoada no Palácio dos Bandeirantes mudou para sexta-feira, dia em que é tradicionalmente servida no Rio — em São Paulo, é o prato das quartas e sábados. Responsável por restaurantes que funcionam no local, a SHA (Santa Helena Alimentação) afirma que percebeu queda nas vendas às sextas e, por isso, promoveu a mudança no cardápio. A SHA diz que não houve pressões por mudanças. De acordo com empresa, a alteração não foi feita a pedido do governador nem de qualquer outra pessoa. Tarcísio é carioca. O governador não costuma frequentar restaurantes dos Bandeirantes e, geralmente, almoça no próprio gabinete. Já os secretários que trabalham no palácio — como Gilberto Kassab, de Governo, e Guilherme Afif Domingos, de Projetos Estratégicos — são vistos eventualmente em um dos dois restaurantes mantidos no local.

Dentro do governo, as alas técnica e política se envolvem constantemente em discussões e disputas. Técnicos são liderados por Arthur Lima, secretário da Casa Civil — enquanto Gilberto Kassab comanda os políticos. Apesar de relatos de bastidores, os envolvidos negam publicamente rusgas. Integrantes da ala política reclamam da falta de traquejo do governador. Ontem, Bolsonaro reforçou essa crítica: “Todo mundo aqui sabe que o Tarcísio não entende nada de política”, disse. Nos primeiros seis meses, a Secretaria dos Direitos da Pessoa com Deficiência foi a única sem reuniões com o governador. Responsável pelo órgão, Marcos da Costa não participou de nenhuma das mais de 450 atividades registradas na agenda oficial entre 1º de janeiro e 30 de junho. A venda da Sabesp, outra promessa de campanha, é vista como o maior desafio do governo — mesmo entre aliados. Deputados estaduais da base e da oposição veem a medida como impopular. A equipe de Tarcísio contratou o Banco Mundial para um estudo sobre viabilidade do negócio e espera que as análises estejam concluídas até meados de 2024.

A Secretaria Especial de Projetos Estratégicos considera que a transferência da residência oficial não é a prioridade nos estudos de viabilidade do projeto de transferência da estrutura de governo para o Centro. A realocação dos cerca de 24.000 funcionários públicos estaduais para um único local, sim.Secretaria Especial de Projetos Estratégicos, em nota enviada ao UOL A escolha da feijoada passada para sexta-feira é devido à queda do movimento no restaurante. Percebemos que, às sextas-feiras, o consumo e venda caíram e os funcionários saíam para almoçar fora do palácio. Assim, para continuar e manter o movimento, alteramos o prato de quarta para sexta-feira, visto que é um prato bem aceito pelos clientes.SHA, em nota enviada ao UOL A empresa [SHA] tem liberdade e é responsável pela refeição que será servida em cada dia da semana, desde que cumpra todos os requisitos do contrato. Portanto, o cardápio das unidades é elaborado e definido exclusivamente pela equipe de nutricionistas da empresa, que tem a obrigação contratual de oferecer diariamente aos comensais opções de refeições balanceadas e nutricionalmente completas.Governo do Estado, em nota enviada ao UOL Os dois grupos estão em sintonia perfeita. A gestão política é muito integrada com a técnica.Gilberto Kassab, secretário de Governo, sobre disputa entre alas técnica e política

 

Fonte: Agencia Estado/g1/UOL

 

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