quarta-feira, 5 de julho de 2023

Aliados orientam Lula a não falar de Venezuela, e petista deve manter posição

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ouviu conselhos de pessoas próximas nos últimos dias para deixar de comentar a situação política da Venezuela, mas a tendência é que mantenha sua posição sobre o país vizinho e também a defesa do ditador Nicolás Maduro.

A avaliação de interlocutores é de que a relação com Caracas se tornou a principal fonte de desgaste nesse início de terceiro mandato.

A declaração de inelegibilidade da principal oposicionista do país, María Corina Machado, na última sexta (30) é vista por interlocutores do Palácio do Planalto como uma boa oportunidade para iniciar um processo de distanciamento de Maduro. Na prática, a medida da Controladoria-Geral ligada ao regime de Maduro sepultou quaisquer perspectivas de eleições livres no país, que deve ir às urnas em 2024.

Entretanto, pessoas próximas consideram improvável que Lula mude de postura e passe a criticar a ditadura no país vizinho. O presidente tem afirmado a aliados que precisa ajudar no processo de politização da população e que tem, sim, de comentar assuntos espinhosos.

Ele também tem dito que mantém sua opinião de que o conceito de democracia é relativo, como disse na semana passada, quando se tornou alvo de muitas críticas.

Para fazer uma analogia com o Brasil, ele lembra que foi preso, diz que o tiraram da eleição de 2018 de forma injusta e que isso prejudicou a democracia brasileira, mas que essa relativização não foi dita pelos formadores de opinião que agora o atacam devido à Venezuela.

"O conceito de democracia é relativo para você e para mim. Gosto de democracia porque a democracia me fez chegar à Presidência pela terceira vez. Por isso gosto de democracia e a exerço na sua plenitude", disse Lula na última quinta-feira (29).

A afirmação foi dada em entrevista após ser questionado acerca dos motivos pelos quais ele e seu governo hesitam em cravar que o regime de Maduro não é uma democracia. Lula comparou os países ao classificar de tentativa de interferência o fato de que algumas nações, incluindo o Brasil sob Jair Bolsonaro (PL), reconhecerem o opositor Juan Guaidó como líder legítimo da Venezuela.

A posição do presidente sobre o país vizinho tem dividido o governo. Parte do PT faz coro à tese de Lula e entende que a Venezuela é um parceiro estratégico e que não pode ser deixado de lado.

De outro lado, porém, a avaliação é que a relação com o país traz muitos desgastes a Lula e que o ideal seria endurecer o discurso ou evitar o tema para não gerar mais prejuízos à sua imagem.

A ministra do Planejamento, Simone Tebet (MDB), por exemplo, já foi na contramão do chefe do Executivo e repreendeu o regime venezuelano. "Quando você tem um governo que impede direitos fundamentais, que são previstos e que são absolutos para uma democracia, você não tem um governo democrático", disse ela.

Antes da afirmação da semana passada, Lula foi criticado por ter preparado uma recepção de gala para Maduro no Planalto no fim de maio, quando recebeu os presidentes da América do Sul em Brasília e, um dia antes, teve uma agenda à parte com o líder venezuelano.

Ambos deram entrevista juntos, e o petista afirmou que tratava-se de um "momento histórico" que "reflete uma política externa séria". "Cabe à Venezuela mostrar a sua narrativa para que possa efetivamente fazer as pessoas mudarem de opinião. É preciso que você [Maduro] construa a sua narrativa. E a sua narrativa vai ser infinitamente melhor do que o que eles têm contado contra você."

Na ocasião, uma ala do governo lamentou as declarações. A avaliação é que os louros de reunir pela primeira vez em anos líderes da América do Sul, de diferentes correntes ideológicas, foram ofuscados por reações negativas à tentativa de reabilitar o regime vizinho.

Os acenos à Venezuela fazem parte da estratégia de Lula de liderar toda região para se fortalecer perante o mundo. No entanto, as declarações não tiveram consenso nem dentro do continente.

No encontro dos presidentes em Brasília, por exemplo, o líder do Uruguai, Luis Lacalle Pou, abriu uma live nas redes sociais para todos ouvirem sua condenação à fala de Lula. O esquerdista Gabriel Boric, do Chile, também não poupou o brasileiro.

 

       'Nada de parceiro botar espada na cabeça do outro', diz Lula sobre acordo UE-Mercosul

 

Horas antes de participar da cúpula semestral do Mercosul, o presidente Lula (PT) voltou a afirmar nesta terça-feira (4) que a carta da União Europeia que propõe novas exigências ambientais no acordo de livre comércio com o Mercosul é "inaceitável" e que é necessário estabelecer uma relação de igualdade entre os dois blocos econômicos.

"Nós queremos discutir o acordo, mas nós não queremos imposição para cima de nós. É um acordo de companheiros, de parceiros estratégicos, então nada de um parceiro estratégico colocar a espada na cabeça do outro. Vamos sentar, vamos tirar as nossas diferenças e vamos ver o que é bom para os europeus, para os latino-americanos, para o Mercosul e para o Brasil", afirmou em live nas redes sociais.

"Tal como [a carta] foi escrita ela era inaceitável, e é inaceitável. Porque você não pode pensar que um parceiro comercial seu pode te impor condições: 'Se você não fizer tal coisa eu vou te punir, se você não cumprir o acordo de Paris eu vou te punir'. Acontece que os países ricos não cumprem nenhum dos acordos", continuou, citando como exemplo os protocolos de Kyoto, de Paris e do Rio de Janeiro.

Negociado oficialmente desde 1999, o acordo entre Mercosul e União Europeia foi concluído em 2019, no primeiro ano do governo de Jair Bolsonaro (PL), mas ainda não foi ratificado pelos dois blocos. O principal impasse para isso agora é um anexo ao texto, chamado de "side letter", proposto pelos europeus no início deste ano, que tornaria obrigatórios alguns compromissos ambientais antes voluntários.

Enquanto a Europa quer garantir que a exportação de commodities com problemas ambientais seja vista como uma violação passível de sanções, o governo brasileiro considera as condições muito rígidas e vem subindo o tom das críticas. "Não é possível que haja uma carta adicional fazendo ameaças a parceiro estratégico", repetiu Lula na França, no último dia 23.

Nesta segunda (3), o chanceler brasileiro, Mauro Vieira, afirmou que deve apresentar a resposta à carta nos próximos dias. "Em alguns dias, pretendemos apresentar para exame de todos uma contraproposta de reação à carta adicional da União Europeia, com o intuito de destravar a negociação birregional", discursou ele durante reunião de ministros do Mercosul em Puerto Iguazú, do lado argentino das Cataratas do Iguaçu.

Outro ponto do acordo que Lula tem insistido publicamente em rever são as compras governamentais. Esse capítulo prevê "tratamento nacional" a fornecedores estrangeiros contratados pelos Estados, mas também várias exceções para proteger as empresas nacionais. Ainda assim, Lula e principalmente o argentino Alberto Fernández veem prejuízos às suas indústrias.

O país vizinho, que passará a presidência semestral do Mercosul a Lula nesta terça (4), reforçou sua posição semelhante à do Brasil e defendeu uma "atualização" do acordo que não implique na reabertura das negociações. O chanceler argentino, Santiago Cafieiro, também criticou o texto aprovado: "Colocar em funcionamento o acordo de 2019 é diminuir nossas exportações atuais", disse.

•        Queremos fazer política do ganha-ganha, diz Lula sobre Mercosul e EU

No dia em que assumiu a liderança temporária do Mercosul, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse nesta terça-feira (4) que os países que integram o bloco buscam uma política de ganha-ganha com a União Europeia. Em seu programa semanal Conversa com o presidente, Lula, que está em Puerto Iguazú, na Argentina, voltou a classificar as exigências feitas por países europeus como inaceitáveis.

 “Estamos aqui para discutir o futuro do Mercosul, o aprimoramento das relações entre Brasil, Argentina, Uruguai, Paraguai e Bolívia. E nós queremos também preparar aqui a proposta de acordo para a União Europeia. Eles fizeram uma proposta, fizemos uma resposta. Mandaram uma carta para nós impondo algumas condições. Não aceitamos a carta. Estamos, agora, preparando uma outra resposta”, afirmou.

Acrescentou que “queremos fazer uma política de ganha-ganha. A gente não quer fazer uma política em que eles ganham e a gente perca. Por exemplo: eles querem que a gente abra mão de compras governamentais, ou seja, aquilo que o governo compra das empresas brasileiras. Se a gente abrir mão das empresas brasileiras para comprar de empresas estrangeiras a gente simplesmente vai matar pequenas e médias empresas brasileiras, pequenos e médios empreendedores e vamos matar muito emprego aqui no Brasil.”

Meio ambiente

Durante o programa, Lula comentou ainda as condições impostas pela União Europeia ao Mercosul no que diz respeito a energias limpas. Na avaliação do presidente, nenhum país tem autoridade moral para discutir com o Brasil sobre o tema. “Obviamente que tivemos a grosseria de um governo que desrespeitava o desmatamento, não respeitava terra indígena, florestas, reservas florestais. Tudo isso acabou” disse o presidente.

Ele assegurou que “agora vamos diminuir o desmatamento, respeitar os indígenas, cuidar das nossas reservas florestais e respeitar terras quilombolas. Da sua matriz energética, 87% da energia [elétrica] brasileira é renovável. O mundo só tem 27%. Se você pegar a matriz energética como um todo, envolvendo combustível, o Brasil tem 50% de energia limpa. O mundo tem 15%. O Brasil tem muita autoridade moral para cuidar corretamente da preservação da nossa floresta.”

Desmatamento zero

O presidente Lula lembrou que o governo brasileiro assumiu o compromisso de chegar ao desmatamento zero até 2030 e reforçou que a meta será cumprida. “Queremos discutir um acordo, mas não queremos imposição para cima de nós. É um acordo de companheiros, de parceiros estratégicos. Então, nada de um parceiro estratégico colocar espada na cabeça do outro. Vamos sentar, vamos tirar nossas diferenças e vamos ver o que é bom para os europeus, para os latino-americanos, para o Mercosul e para o Brasil.”

“Para todos eles, eu disse que a carta era inaceitável. Tal como ela foi escrita, ela era inaceitável e é inaceitável. Você não pode imaginar que um parceiro comercial seu pode impor condições. ‘Se você não fizer tal coisa, eu vou te punir. Se você não cumprir o acordo de Paris, eu vou te punir.’ Acontece que os países ricos não cumprem um dos acordos. Não cumpriram o Protocolo de Kyoto, as decisões de Copenhague, do Rio 2002 e não vão cumprir o Acordo de Paris,”, finalizou o presidente.

•        Mercosul deve adiar reinserção da Venezuela e acordo com EU

O chanceler brasileiro, Mauro Vieira, defendeu ontem a ampliação do Mercosul durante a abertura da cúpula do bloco em Puerto Iguazú, na Argentina. Vieira citou alguns países como aspirantes à adesão, como a Bolívia, mas não mencionou a Venezuela, que tenta retornar ao Mercosul com o apoio do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que assume hoje a presidência do bloco pelos próximos seis meses. Em agosto de 2017, Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai reconheceram a “ruptura da ordem democrática” e suspenderam formalmente a participação da Venezuela no bloco, conforme previsto no Protocolo de Ushuaia. Também não deve haver agora uma resposta comum à carta de compromissos ambientais proposta pelos europeus no âmbito do acordo entre União Europeia e Mercosul.

Em entrevista à Rádio Eldorado, o professor de Relações Internacionais no Ibmec SP, Alexandre Pires, avaliou que a situação da Venezuela deve ser discutida em outro momento porque a prioridade é a aproximação entre Uruguai e China, em negociações bilaterais que preocupam os outros países do bloco. Ele também apontou dificuldades para a solução do impasse na negociação do acordo Mercosul-União Europeia.

 

Fonte: FolhaPress/Agencia Brasil/Agencia Estado

 

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