quarta-feira, 28 de junho de 2023

Neonazista francês afirma em julgamento que seu objetivo era matar líder da esquerda

Um dos membros do movimento neonazista acusados de planejar ataques terroristas no território francês afirmou nesta terça-feira (27/06) durante seu julgamento em Paris que um de seus alvos era o ex-candidato à presidência e chefe do partido da esquerda radical França Insubmissa, Jean-Luc Mélenchon.

A ideia era “matá-lo a tiros no meio de um evento de campanha para que isso fizesse muito barulho e fosse noticiado nos jornais”, disse durante seu interrogatório Evandre Aubert, que está sendo julgado com outras três pessoas.

Os quatro homens, com idades entre 22 e 28 anos, estão sendo julgados há uma semana na França sob a acusação de conspiração, com o objetivo de cometer terrorismo. Esse é o primeiro julgamento de um caso de terrorismo da extrema direita perante um júri popular em um tribunal na França.

De acordo com as informações fornecidas desde o início da audiência, o grupo queria atacar “eventos de campanha de Jean-Luc Mélenchon”, embora não esteja claro se eles queriam atacar o político ou a multidão que participava da reunião. Mélenchon entrou com uma ação civil no início do julgamento.

·         Atirador no porta-malas

De acordo com Evandre Aubert, estudante de 28 anos, foi outro réu, Alexandre Gilet, quem mencionou esse plano para atacar Jean-Luc Mélenchon, durante um fim de semana de treinamento de tiro do grupo neonazista em uma floresta perto de Tours (centro), em julho de 2018.

Alexandre Gilet mencionou na ocasião um atirador “no porta-malas do carro entreaberto, com um rifle de precisão”, disse Aubert. “Isso me impressionou, porque era um nível de precisão operacional que eu não tinha visto antes. Foi um dos elementos que me fez dizer que havia um nível de periculosidade em Gilet que eu talvez tivesse subestimado”, acrescentou o acusado.

Nas trocas de mensagens online, no aplicativo Discord, Alexandre Gilet, que na época atuava como aprendiz policial, também teria evocado a possibilidade de “fazer algo” sobre um show planejado no Bataclan, que acabou sendo cancelado, do rapper francês Médine, confirmou Aubert. O artista é regularmente acusado pela direita e pela extrema direita de complacência com o islamismo.

A Liga Internacional Contra o Racismo e o Antissemitismo (Licra) e o Conselho Representativo das Instituições Judaicas da França (CRIF) também foram citados “repetidamente” como organizações que deveriam ser alvo (de possíveis ataques terroristas), acrescentou. Alexandre Gilet, apresentado como o líder do grupo, será interrogado nesta quarta-feira (28/06). O veredito é esperado para sexta-feira (30/06).

 

Ø  Para além da AfD: onde mais a ultradireita avança na Europa?

 

No último domingo (25/06), o resultado das eleições regionais na Alemanha chacoalharam as redes sociais e soaram os alarmes em Berlim: Robert Stuhlmann, da AfD (Alternativa para a Alemanha), venceu a eleição no distrito de Sonneberg, no estado da Turíngia, tornando-se o primeiro político da sigla de ultradireita a ser eleito chefe de uma autoridade distrital no país.

O pleito de domingo é o mais recente sucesso da legenda que atingiu níveis recordes de popularidade em sondagens nacionais recentes: com 19% a 20% de apoio nas pesquisas, logo atrás dos conservadores, a AfD tem explorado os temores dos eleitores sobre recessão, migração e transição verde, afirmam analistas. O partido planeja inclusive lançar um candidato a chanceler federal nas eleições de 2025.

Mas a Alemanha não é o único país europeu que parece se inclinar cada vez mais para um dos extremos. A seguir, um apanhado de onde a direita avança na Europa.

·         Espanha: Isabel Díaz Ayuso nos passos da AfD

O último bastião da esquerda na Europa caiu há exatamente um mês com a derrota da aliança governista espanhola nas eleições regionais e municipais na Espanha. O resultado levou o primeiro-ministro Pedro Sánchez a dissolver o parlamento e convocar novas eleições para o dia 23 de julho.

Quem saiu vitorioso foi o conservador Partido Popular (PP), com as promessas de esperança depositadas em Isabel Díaz Ayuso, de Madri. Ao estilo da AfD, a política tem como bandeiras a ridicularização do feminismo, da igualdade, da proteção das minorias, dos direitos das pessoas trans e da proteção do clima.

Acima de tudo, porém, ganhou destaque o partido extremista de direita Vox, que no futuro provavelmente irá participar do governo em muitos municípios e regiões autônomas espanholas. Não por acaso, entre os primeiros a parabenizarem o Vox pela vitória estavam o premiê húngaro Viktor Orbán, que se regozijou com o progresso da "reconquista de direita" na Espanha.

·         Hungria: Orbán como "modelo"

O primeiro-ministro húngaro forneceu o caminho para a guinada da Europa para a direita, provocando uma espécie de efeito dominó. Em abril do ano passado, Orbán garantiu seu quarto mandato consecutivo, apesar de uma oposição unida e que contava com uma chance de mudança de governo.

Em 2014, Orbán e seu partido nacionalista de direita Fidesz proclamaram a "democracia iliberal" baseada no modelo russo.Os tons xenófobos são parte integrante de seu programa de governo há anos. Sua recusa em receber refugiados foi justificada pelo fato de os húngaros "não quererem se tornar uma raça mestiça" e que os países multiculturais da Europa Ocidental "não são mais nações".

·         França: a relativa discrição de Le Pen

Após a vitória eleitoral de Orbán, há um ano, Marine Le Pen não teve pressa em enviar parabéns a Budapeste. Nas eleições parlamentares de 2022, seu partido Reagrupamento Nacional, de ultradireita, conseguiu multiplicar em catorze vezes o número de deputados que possui. Le Pen segue com seu projeto de longo prazo de se mudar para o Palácio do Eliseu.

Neste sentido, o próximo passo de Le Pen deverá mirar uma vitória nas eleições europeias em 2024. Nada impossível hoje em dia, já que, nos últimos dez anos, cada vez mais franceses têm votado na ultradireita.

·         Itália: Meloni e Mussolini

Giorgia Meloni nem precisou ir muito longe: seu partido extremista de direita Irmãos da Itália, enraizado no fascismo, surgiu praticamente do nada. Apesar disso, a sigla venceu as eleições parlamentares em setembro 2022, fazendo de Meloni a primeira mulher a ocupar o cargo de premiê da Itália.

No brasão do partido, nada menos que a chama verde, branca e vermelha, que para a direita italiana simboliza a chama eterna no túmulo de Mussolini.

E falando em Mussolini: trata-se de "uma personalidade complexa que tem que ser vista dentro do contexto", diz Meloni, que começou sua carreira política em uma organização juvenil neofascista.

·         Suécia: populistas como a segunda maior força política

Jimmie Åkesson, líder do populista de direita Democratas Suecos, por outro lado, teve que percorrer um longo caminho rumo ao extremo. Em sua juventude, ele ainda era considerado moderado.

Hoje, ao estilo de Donald Trump, ele quer "tornar a Suécia grande novamente". Nas eleições parlamentares do ano passado, o partido, fundado em 1988 por membros da cena de extrema-direita, cresceu até se tornar a segunda maior força política do país.

Desde então, os Democratas Suecos têm conduzido o governo de centro-direita com um discurso antiimigração e islamofóbico. Os muçulmanos, para Åkesson, são a "maior ameaça à Suécia desde a Segunda Guerra Mundial".

·         Finlândia: "Os finlandeses primeiro"

Os velhos populistas bem-sucedidos na Escandinávia há muito encontraram solo fértil em outras paragens — como na Finlândia. Lá, os "verdadeiros finlandeses" chegaram ao governo em uma aliança de quatro partidos. O partido populista de direita, cuja líder Riikka Purra tem chances até de ser promovida a ministra das Finanças, garantiu sete cargos no gabinete.

Purra, que anteriormente apoiava os Verdes, quer agora colocar a Finlândia de volta no "caminho certo". E isso através de uma "mudança de paradigma" na migração, que deve reduzir a cota de refugiados para 500.

Eslováquia: neonazistas no Parlamento

Mas em comparação com Marian Kotleba, Purra até que é bastante compassiva. O líder do partido neofascista L'SNS gosta de ser chamado de "líder" por seus partidários e figura entre os neonazistas mais radicais da Eslováquia. Tendo como alvo frequente ciganos, judeus e homossexuais, o político foi condenado em 2022 por "promover uma ideologia que põe em risco a democracia", e embora tenha tido a pena suspensa, acabou tendo que abrir mão de seu cargo no parlamento nacional.

No entanto, isso não afetou o sucesso de seu partido no passado: nas eleições parlamentares de 2020, a sigla obteve 17 assentos (8%) no Conselho Nacional da Eslováquia. Para as eleições antecipadas de 30 de setembro próximo, o partido neonazista espera conquistar ainda mais.

·         Grécia: guinada radical para a direita

Para resumir a atual conjuntura política do continente, basta um olhar para a Grécia, onde o primeiro-ministro conservador Kyriakios Mitsotakis venceu as eleições no último domingo. A manchete da eleição, porém, também podia ser: "Grécia observa guinada maciça à direita". Lá, o populista de direita Elliniki Lysi (Solução Grega), o ultranacionalista e ultra-religioso Niki (Vitória) e os Espartanos (sucessores do partido neonazista Chrysi Avgi, ou "Aurora Dourada", banido em 2020), conquistaram juntos quase 13% do Parlamento grego.

 

Ø  Conservador Kyriakos Mitsotakis presta juramento para novo mandato na Grécia; migração é um desafio

 

Após o seu partido ter conquistado ampla maioria nas eleições legislativas de domingo (25/06), o líder da direita grega, Kyriakos Mitsotakis, fez nesta segunda-feira (26/06) o juramento para começar um novo mandato como primeiro-ministro. A cerimônia oficial ocorreu no palácio presidencial, onde o chefe de governo, de 55 anos, se manifestou perante autoridades da poderosa Igreja Ortodoxa, segundo a tradição grega.

O conservador Kyriakos Mitsotakis venceu com folga as eleições legislativas na Grécia apostando na recuperação econômica de seu país. Porém, ele é criticado por sua posição sobre a questão migratória e agora terá que governar reunindo diferentes demandas da sociedade.  

“Estamos começando um trabalho árduo para grandes reformas”, disse o primeiro-ministro, após ser recebido pela presidente grega, Katerina Sakellaropoulou. "Estou empenhado em implementar grandes mudanças. Temos uma maioria parlamentar confortável para fazer isso", comemorou o chefe de governo. 

Primeiro-ministro de 2019 até ao fim de maio, o líder da Nova Democracia (ND) irá reassumir o cargo depois que seu partido de centro-direita obteve 157 das 300 cadeiras do Parlamento, segundo resultados parciais. 

“Pela segunda vez em poucas semanas, os cidadãos não apenas enviaram uma mensagem de continuidade, mas também nos deram um forte mandato para avançarmos mais rapidamente no caminho das grandes mudanças que nosso país precisa", disse Mitsotakis após a divulgação dos primeiros resultados. 

O adversário, o ex-primeiro-ministro Alexis Tsipras, da Coligação da Esquerda Radical Syriza lamentou. “O resultado da eleição é obviamente negativo para nós. Sofremos uma grave derrota eleitoral. No entanto, creio que o resultado das eleições é ainda mais negativo para a sociedade e para a democracia", afirmou o candidato esquerdista derrotado. 

·         O peso da economia nos resultados eleitorais

Durante a campanha eleitoral, Kyriakos Mitsotakis prometeu aumentos salariais, principalmente para a população de menor renda, uma grande preocupação entre os gregos que viram o seu poder aquisitivo diminuir nos últimos anos, em um contexto de custo de vida elevado. 

"Ele pôde se apoiar sobre seus resultados econômicos e o fato de que ele gera confiança sobre o futuro econômico do país, ao contrário de Alexis Tsipras, que preocupa", analisa Joelle Dalegre, especialista em Grécia pelo Inalco, o Instituto Nacional de Línguas e Civilizações Orientais, na França, sobre a vitória da direita. "As pessoas tiveram uma experiência difícil com o Siryza, o que muitos não querem repetir. Essas pessoas se sentem decepcionadas com a esperança que havia sido depositada na esquerda", completa a analista em entrevista à RFI.   

O líder conservador também prometeu realizar contratações em massa no setor público de saúde, afetado por uma escassez grave de recursos desde a crise financeira e os programas de austeridade impostos a numerosos serviços públicos. 

Família de políticos

Originário de uma dinastia política da ilha de Creta, Kyriakos Mitsotakis é filho do ex-primeiro-ministro Konstantinos Mitsotakis (1990-1993). Sua irmã foi ministra das Relações Exteriores e um de seus sobrinhos é o atual prefeito de Atenas.

Formado pela Universidade de Harvard, nos Estados Unidos, Mitsotakis fez carreira como consultor financeiro em Londres, antes de seguir o caminho político de sua família. 

Deputado pelo ND pela primeira vez em 2004, o líder conservador atuou como ministro da Reforma Administrativa em meio à crise e aplicou cortes em massa de cargos no funcionalismo público. 

Em 2016, um ano após a derrota de seu campo para a esquerda de Alexis Tsipras, Mitsotakis foi eleito líder do Nova Democracia, antes de chegar ao poder, três anos depois. 

·         Fatos marcantes de seu governo

O primeiro mandato de Mitsotakis foi marcado pela recuperação de uma economia ainda convalescente, após anos de planos de austeridade drásticos, em que o país perdeu um quarto do Produto Interno Bruto. No ano passado, o crescimento grego atingiu 5,9%. 

Nos últimos quatro anos, Mitsotakis também fez uma guinada em matéria de segurança, ao reforçar o dispositivo policial grego. Seu mandato, entretanto, foi marcado por escândalos, entre eles um caso de escutas ilegais envolvendo figuras políticas e jornalistas. 

Onipresente nas redes sociais, o líder conservador teve uma política de comunicação agressiva, em um ambiente midiático caracterizado pela concentração dos principais veículos e canais de TV nas mãos de grandes grupos financeiros  

Em março passado, o premiê enfrentou uma onda de protestos devido ao desastre ferroviário que causou 57 mortes e foi atribuído a negligências no sistema de sinalização da linha férrea grega. 

Mitsotakis tem enfrentado ainda acusações recorrentes de devolução de migrantes para a vizinha Turquia antes de eles poderem apresentar um pedido de asilo em território da União Europeia (UE). O político sempre negou a prática, comprovada por vídeos e investigações detalhadas feitas por veículos internacionais. 

Os quatro anos de Mitsotakis no poder ainda foram marcados pelo retrocesso do Estado de Direito e da liberdade de imprensa. Desde o ano passado, a Grécia ocupa uma posição ruim nesse quesito na UE, segundo o ranking anual da ONG Repórteres sem Fronteiras, atrás da Hungria e da Polônia.

 

Fonte: RFI/Deutsche Welle

 

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