Atacar escolas é
tática da extrema-direita para instalar o medo na sociedade
O
que parece somente uma descarga de raiva juvenil contra o mundo esconde um
objetivo maior: instalar o terror na sociedade para enfraquecer a confiança nas
instituições públicas e no coletivo.
Um
crescimento no número de ataques nas escolas públicas do Brasil colocou toda a
comunidade escolar – e a sociedade em geral – em alerta. Se, nas primeiras
décadas deste século, esses eventos eram considerados raros, nos últimos dois
anos ocorreu um crescimento acelerado desse tipo de violência.
Esse
crescimento chamou a atenção até da equipe de transição do Governo Lula, que se
debruçou sobre o tema e elaborou o relatório “O extremismo de direita entre
adolescentes no Brasil: ataques às escolas e alternativas para a ação
governamental”. Segundo o relatório, se, no século passado, não havia relato
desse tipo de crime, já são 16 ataques até o fim de 2022. E, nos últimos seis
meses, foram seis atentados no Brasil (contagem que continua aumentando). Ou
seja, passamos de menos de um ataque por ano para uma média de um por mês.
Além
disso, ocorreu uma explosão no número de denúncias de mensagens incentivando ou
sugerindo massacres em escolas do país. O Ministério da Justiça criou o
programa Escola Segura para o envio dessas denúncias – que já resultaram na
exclusão de contas que apoiavam ações extremistas nas redes sociais e levaram à
prisão de centenas de pessoas suspeitas e à apreensão de armas.
A
defesa da educação no Brasil por parte da população, de educadores(as) e dos
movimentos sociais fez com que as escolas se tornassem um espaço de inclusão,
troca de experiências, respeito à diversidade, de desenvolvimento humano e
social e promotor do pensamento crítico e questionador.
• Tática do caos da extrema-direita
Foram
estudantes e professores que barraram o avanço de ideias fascistas nos últimos
anos no Brasil atuando nas escolas e realizando manifestações fora delas.
Lembremos da grande campanha pela participação da juventude nas últimas
eleições para barrar a vitória do ex-presidente fascista e a defesa da educação
e da ciência no Brasil.
Tentando
barrar essa onda progressista, a extrema-direita virou suas atenções para o
ambiente escolar. E não há ambiente melhor para espalhar o caos do que um
espaço onde estão crianças indefesas e jovens em formação, onde as famílias da
classe trabalhadora esperam que seus filhos e filhas estejam se desenvolvendo
em segurança.
Leis,
projetos e notícias falsas tentam deslegitimar a escola como instituição
social. São exemplos a tentativa de impedir o debate sobre gênero e a educação
sexual ou a imposição de censura nas escolas; a privatização ou a entrega para
militares da gestão escolar e a aprovação da educação domiciliar; a perseguição
de educadores(as) e a invenção da “mamadeira de piroca” e do “kit gay”.
Sabendo
que não pode mais governar pela razão, a classe dominante na sociedade – a
burguesia – busca governar pelo medo e pelo caos. O sistema capitalista
enfrenta uma de suas mais graves crises – econômica, política e social – e a
formação de milhares de jovens conscientes e determinados(as) a construir uma
sociedade mais justa e igualitária se tornou uma grande ameaça ao status quo do
capitalismo.
• Manipulação do discurso
A
extrema-direita iniciou um processo de aliciamento e recrutamento de jovens no
espaço onde eles estão mais desprotegidos, a internet, com suas redes digitais
e seus fóruns sem supervisão de família, governos, Estado ou sociedade. Foi lá
que os responsáveis pelos ataques tiveram contato com um discurso mentiroso de
que a culpa por seus problemas individuais é de determinadas instituições, como
a escola.
A
escola, pelo contrário, é responsável por evitar que pessoas morram devido a
suas condições sociais, políticas, econômicas, de gênero, raça ou religião. Mas
a escola não é responsável pela falta de perspectiva de futuro. Esta
responsabilidade é do sistema capitalista e da sua versão mais violenta – o
fascismo. Sendo assim, a extrema-direita acusa o inimigo de cometer os crimes
que ela comete.
A
extrema-direita usa os ataques para tentar impor sua visão de mundo
individualista. As soluções propostas são sempre populistas e sensacionalistas,
sem eficácia comprovada e sem embasamento científico. Aproveitam-se da
sensibilidade da população após os ataques para espalhar seu discurso barato. O
principal exemplo é a medida tomada pelo governador de Santa Catarina de
contratar um segurança armado para cada escola estadual.
Um
raciocínio simples levaria qualquer pessoa sensata a compreender que um
policial não tem nenhum preparo para circular por um ambiente com centenas ou
milhares de crianças e jovens de diferentes classes e formações culturais e
sociais. Qual seria a posição de um policial ao ver um estudante discutindo com
outro durante um jogo na quadra ou sobre a vestimenta de uma estudante? Além disso,
qual seria o impacto de uma pessoa armada no meio de um fluxo constante de
adolescentes?
Não
bastasse isso, a proposta apresentada por um deputado paulista é de pagar os
policiais de folga com dinheiro da educação! É a lógica fascista levada ao
absurdo: retirar dinheiro da educação para aumentar a repressão.
O
pior é que a ideia nem é nova. Nos EUA, país que possui mais armas do que
habitantes, ter a população armada não significa aumentar a segurança, pelo
contrário. Atingido por uma epidemia de ataques a escolas e outros locais, a
decisão tomada foi ampliar o número de escolas com segurança armada. Qual o
resultado? Recorde de massacres em 2022, sendo que os ataques aumentaram mesmo
nas escolas com segurança armada.
Armar
a população ou as escolas só é interessante para as empresas armamentistas, que
lucrarão enquanto colocam armas nas mãos dos ricos e deixam trabalhadores
desprotegidos e à mercê de morrerem por motivos banais.
• Combater o fascismo
Uma
coisa que a extrema-direita tenta esconder após os ataques é a verdadeira
motivação dos assassinos: a motivação política. Os ataques mais elaborados são
organizados, discutidos, gravados e celebrados por jovens de ideologia fascista
e neonazista. São constantes as apreensões de bandeiras, livros e materiais
relacionados ao nazismo nas casas desses criminosos.
Logo,
precisamos mostrar para a sociedade, para as famílias e educadores como essa
ideologia é inimiga da segurança e do futuro da juventude. Precisamos debater
nas aulas e nas reuniões pedagógicas como combater a disseminação dessas ideias
e formar cidadãos e cidadãs comprometidos com a vida coletiva.
Também
precisamos apresentar saídas para a crise econômica, política, social e
existencial que a humanidade enfrenta. Precisamos dizer e mostrar que é possível
construir um novo mundo onde todos e todas possam viver com dignidade e serem
respeitados na sua individualidade.
Mais livros: governo quer retomar
políticas públicas para leitura
Fazer
uma nação leitora, este é o desafio do atual governo. Em entrevista exclusiva
para a Agência Brasil, o secretário de Formação, Livro e Leitura do Ministério
da Cultura, Fabiano Piúba, destaca as ações de retomada das políticas para a
área, assim como aponta propostas da pasta para o novo Programa de Aceleração
do Crescimento (PAC). De acordo com ele, a formação leitora dos brasileiros é
uma das prioridades da gestão.
"O
próprio presidente Lula, no processo de campanha, trouxe muito essa pauta
quando falava menos armas e mais livros, menos clubes de tiro e mais
bibliotecas. Eu creio que essa política ganha um relevo desde o fato de estar
numa secretaria como também em uma agenda social e política do governo
federal", afirma.
Reduzida
a uma diretoria dentro da Secretaria de Economia Criativa durante o governo
Bolsonaro, a pasta recupera agora um grau institucional maior, segundo Piúba.
Uma das atribuições da atual Secretaria é implementar o Plano Nacional de Livro
e Leitura (PNLL), de forma articulada com o Ministério da Educação. O PNLL
trata de diretrizes básicas para a democratização do acesso ao livro e para o
fortalecimento de sua cadeia produtiva.
"Nós
estamos com um grupo técnico específico para a construção desse PNLL e uma das
linhas é a implementação e a modernização de bibliotecas, tanto da rede pública
como da rede escolar", explica o secretário.
• Criar e recuperar bibliotecas
Para
Fabiano Piúba, é preciso modernizar o próprio conceito de biblioteca. "Ela
deve ser vista como um dínamo cultural, conforme diz a Unesco, não como um
depósito de livros", defende.
Uma
das propostas para levar essa inovação adiante é a implementação das chamadas
Bibliotecas Parque, atualmente em fase de estudo. Criadas na cidade de
Medellín, na Colômbia, essas bibliotecas são centros culturais que desenvolvem
diversas atividades educativas e lúdicas, com forte envolvimento da comunidade.
O
secretário também aponta a experiência das Bibliotecas Parque do Rio de
Janeiro, inauguradas nos anos de 2010 e 2011. "A gente quer desenvolver
também uma ação para as Bibliotecas Parque em áreas de periferia, em áreas de
vulnerabilidade, não necessariamente nas capitais", especifica.
Outro
desafio é recuperar as bibliotecas públicas fechadas nos últimos anos. Segundo
o Censo Nacional das Bibliotecas Públicas Municipais (2009), empreendido pela
Fundação Getúlio Vargas, 1.152 municípios não contavam com este aparelho
cultural.
"Em
2010, a gente zerou o déficit de municípios sem bibliotecas. Isso era uma meta
que estava vinculada à presidência da República à época", afirma.
Segundo
a pasta, atualmente faltam bibliotecas públicas em pelo menos 991 cidades
brasileiras e apenas dois estados – Amapá e Sergipe – estão contemplados em
todos os municípios. A ideia agora é abrir uma linha, por meio de edital, para
que os municípios apresentem seus projetos.
• Bibliodiversidade por princípio
Para
Piúba, o fomento ao livro e à leitura deve ser pensado a partir da
bibliodiversidade. Esse conceito faz referência à diversidade da produção
editorial de um país.
"Uma
política de aquisição e de atualização de acervos [para bibliotecas públicas]
tem que compreender essa bibliodiversidade, isto é, uma diversidade regional,
de editoras, mas compreendendo também que há autores e autoras independentes,
além de uma diversidade cultural e étnica".
A
proposta é que as aquisições de livros para bibliotecas públicas possam
abranger obras variadas e não se concentrar apenas na produção de poucas editoras
da Região Sudeste, como costumava ser feito.
Também
para incentivar a diversidade, a Secretaria lançou o Prêmio Carolina Maria de
Jesus em abril deste ano. O edital prevê a seleção de 40 obras inéditas
escritas por mulheres, destinando o valor de R$ 50 mil reais por agraciada.
"Esse
edital já deu o tom do que vem por aí. Ele estabeleceu cotas importantes, 20%
no mínimo para mulheres negras, 10% para mulheres indígenas, 10% para mulheres
com deficiência, 5% para mulheres ciganas e 5% para mulheres quilombolas",
detalha o secretário. De acordo com ele, as políticas afirmativas também
compõem as estratégias da Secretaria e seguem as diretrizes da ministra da
Cultura Margareth Menezes.
• PAC e livros para exportação
A
Secretaria tem apresentado propostas para o novo Programa de Aceleração do
Crescimento (PAC) do governo federal. "Um dos projetos é que, ao receber a
chave da casa [no programa Minha Casa, Minha Vida], a família receba também um
kit com uma biblioteca básica de literatura brasileira, universal e
infantil", explica Piúba.
Outra
proposta é retomar o programa Agentes de Leitura, que operou entre 2009 e 2011:
"São jovens entre 18 e 29 anos, com ensino médio completo, que passam por
um processo de seleção e formação contínua para criar ambientes favoráveis para
a leitura dentro das casas, só que agora queremos conectar isso com a escola,
em parceria com o MEC". Esta seria uma ação desenvolvida no âmbito do
Programa Nacional de Incentivo à Leitura (PROLER).
• Literatura nacional
A
promoção da literatura brasileira também está na agenda da Secretaria. Dentre
as prioridades, está a participação estratégica de autores em feiras literárias
internacionais importantes, como a Feira de Guadalajara e a Feira de Frankfurt,
que realizam rodadas de negócios para compra e venda de direitos autorais.
"As
editoras brasileiras ainda vão muito mais comprar direitos do que vendê-los e a
gente quer fazer uma via de mão dupla", explica.
Além
disso, existe a expectativa de destacar recursos orçamentários para o programa
de tradução de obras de autores brasileiros, coordenado pela Fundação
Biblioteca Nacional. Dessa forma, a pasta espera repercutir nossa criação
literária em línguas diversas.
• Desafios de um país que lê pouco
Um
dos desafios apontados por Piúba é a formação leitora. Publicada em 2019, a 5ª
edição da pesquisa Retratos da Leitura, do Instituto Pró-Livro, revelou uma
redução no percentual de leitores entre 2015 e 2019. De acordo com os dados
divulgados, passamos de 104,7 milhões de leitores para 100,1 milhões – uma
queda de 4,6 milhões. Além disso, o Brasil continua no patamar de quase 50% de
não leitores.
"A
escola brasileira não tem sido capaz de formar um leitor para a vida inteira e
esse é um desafio".
Segundo
o Indicador de Alfabetismo Funcional (Inaf) de 2018, três em cada dez
brasileiros entre 15 e 64 anos sofrem de analfabetismo funcional, isto é, não
são capazes de compreender aquilo que leem.
"A
criança precisa ser alfabetizada no tempo certo e os jovens têm que chegar ao
ensino médio não com analfabetismo funcional, mas aptos a dar um salto maior
para chegar à universidade com essa capacidade de leitura e escrita",
avalia.
Para
Piúba, um eixo importante para a alfabetização plena é justamente o da formação
leitora. Doutor em educação pela Universidade Federal do Ceará (UFC), ele
defende que os programas de alfabetização enfatizem essa formação específica,
com destaque à literatura infantil e juvenil, o que vem sendo tratado com o
MEC.
"Muito
mais importante do que saber quantos livros a gente lê ao ano, comparando o
Brasil com outros países, é saber o que somos capazes de fazer com aquilo que
se leu", conclui.
Fonte:
A Verdade/Correio Braziliense
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