A extrema direita
com o retorno de Bolsonaro ao Brasil
Na
manhã dessa quinta feira (30/03), Jair Bolsonaro desembarcou no Aeroporto
Internacional de Brasília, recebido por uma comitiva do PL formada por Michelle
Bolsonaro, Valdemar Costa Neto e o General Braga Neto, além de outros
simpatizantes.
As
convocações nas redes sociais da "Volta triunfal", reuniu algumas
centenas de apoiadores no saguão principal, porém eles tiveram que se contentar
em cantar o hino nacional, e como de costume provocar jornalistas. Isso porque,
a PF já havia organizado junto com a Polícia Militar do DF, um esquema de
contenção, no qual Bolsonaro teve que sair por uma rota alternativa e em carro
fechado, sem passar pela aglomeração.
Segundo
a assesoria de imprensa do PL, seguiu direto para a sede do partido, onde foi
recebido por parlamentares aliados e participou de evento fechado. Contrariando
o esperado, o ex-presidente golpista a noite não participou presencialmente da
posse oficial da deputada bolsonarista Bia Kicis (PL- DF) como presidente
estadual da legenda. Limitou-se a mandar uma mensagem por ligação transmitida
no evento pelo celular de Michelle.
O
retorno de Bolsonaro ocorre em meio a um contexto contraditório. Por um lado, oportuno,
quando o governo Lula-Alckmin passa pelo seu primeiro desgaste político e
econômico, principalmente na relação com Arthur Lira no Congresso. De outro,
pressionado pelas instituições, e pelos inquéritos abertos, como a oitiva na PF
marcada já para quarta feira (05/04) do caso das joias sauditas trazidas
irregularmente ao Brasil.
Além
disso, Bolsonaro é alvo de mais duas investigações. Uma aberta pelo STF, que
apura a sua relação com os atentados golpistas do dia 08/01 no Palácio do
Planalto. E a outra pelo TSE, sobre a reunião com embaixadores no Palácio da
Alvorada durante as eleições do ano passado, transmitida pela TV pública, onde
as declarações de Bolsonaro colocavam questionamentos infundados de fraude no
processo eleitoral. Essa última, Bolsonaro se condenado, corre o risco de
cassação, o que o deixaria inelegível para uma eventual disputa presidencial em
2026.
Por
mais que minimize em suas declarações recentes, Bolsonaro é a principal figura
da extrema direita para liderar a oposição, com a poderosa bancada de deputados
e senadores do PL no congresso e no Senado. Nesse cenário, recentemente
reverberou nas redes um dos centros da política da extrema direita de "CPI
do MST". Justamente com o objetivo de criminalizar os movimentos sociais,
unificando a sua base de apoio na bancada ruralista, e também para conter as
iniciativas de Lula no Agro, como sua recente viagem a China com empresários
bolsonaristas.
Entretanto,
essa liderança é acompanhada de rusgas com seus aliados, como o proprio
comandante do PL, Valdemar Costa Neto.
Ao
mesmo tempo que Bolsonaro é empossado presidente honorário do PL e fala em
"ajudar o Partido se fortalecer nas eleições municipais de 2024", em
recente evento marcado pela posse de Michelle como presidente do PL Mulher, foi
nítido o incômodo de Bolsonaro com Costa Neto. Por vídeo deu um recado direto a
legenda, dizendo ser ele o responsável pelo crescimento do Partido, e que pode
sair quando quiser. Nos bastidores, Bolsonaro também proibiu a participação de
Michelle em viagens oficiais sem a companhia dele.
A
aproximação de Costa Neto oferecendo cargo e verbas partidárias a Michelle, não
somente atua para fomentar o racha na família Bolsonaro, contra os 3 filhos do
Presidente. Como também, ressalta o pragmatismo estratégico do presidente do
PL, que se sobrepõe ao projeto golpista de Bolsonaro. Costa Neto está
fundamentalmente preocupado em ampliar o número de prefeituras do PL em 2024, e
assim ter condições de eleger mais deputados que corresponde, consequentemente,
ter mais verba de fundo partidário em 2026.
A
aposta em Michelle se dá por alguns fatores:
a-)
pelo maior controle da ala bolsonarista que Costa Neto consegue exercer do
ponto de vista partidário.
b-)
Michelle representa um eleitorado estratégico que são as mulheres. Segundo
dados do IPEC, o núcleo duro do bolsonarismo é representado por 51% de
mulheres, índice superior ao próprio correspondente Lulista, representado por
49% de mulheres (apesar que em números absolutos o eleitorado feminino petista
é bem superior). E isso ocorre pela influência da Igreja Evangélica, a qual
Michelle é uma representante mais "orgânica" do que os filhos do
presidente. Apesar de ser pouco atuante nas redes sociais, no Instagram já é a
segunda da família a ter mais seguidores.
c-)
2026 ainda está longe para o líder do PL. Permanece incerto a elegibilidade até
lá do próprio Bolsonaro, e Costa Neto não descarta, como já faz menções
públicas de apoio a candidatura de Michelle.
Essas
movimentações, todavia, não podem distorcer a real análise da relação de forças
da capacidade que Bolsonaro possui como representante máximo das forças
políticas e sociais da extrema direita. Esse capital político, não foi
derrotado após os atentados golpistas do dia 08/01 pela reação institucional
articulada entre o novo Governo de Frente Ampla, e o STF, na figura de
Alexandre de Moraes.
Vladimir
Safatle, em seu recente artigo publicado na Revista Piauí- A insurreição da
extrema direita, ao analisar os episódios do "capitólio brasileiro",
caracteriza como o Brasil é um laboratório para, segundo o filósofo, a fase
insurrecional da extrema direita mundial. Em suas palavras:
"Nesse
contexto, ’fase insurrecional’ significa que a extrema-direita mundial tenderá,
cada vez mais, a operar como força ofensiva anti-institucional de longa
duração. Força essa que pode se expressar em grandes mobilizações populares, em
ações diretas, em formas de recusa explícita das autoridades
constituídas."
Safatle,
problematiza, como a luta anti-institucional, através de metodos, no passado
capitaneados pela esquerda. Combinado da abnegação e sacrifício individual para
destruição de representações de poder e construção de um novo tipo de
estruturas dominação, são os principais fatores que explicam hoje o fenômeno
social do bolsonarismo. Essas causas, são diferentes para ele, dos efeitos
aparentes que geralmente são utilizados para retratar a extrema direita. Um
conjunto de explicações deficitárias, baseadas em aspectos cognitivos,
psicológicos e morais.
Para
isso, Safatle, utiliza-se de uma interessante metáfora do conceito estético,
demonstrando como o modernismo brasileiro, além de um movimento artístico,
constituiu-se no Brasil como um projeto de estado. Baseado em conciliar os
interesses de modernização da burguesia brasileira, pela via de uma revolução
por cima, integrado ao conservadorismo do regime comandado por Vargas na década
de 30. Em contrapartida, o filósofo demonstra como o integralismo (versão do
fascismo brasileiro) possuía uma estética que se contrapounha ao modernismo,
sem contestar o capitalismo, porém extraindo dele o ideário de resgate da
essência do homem colonial.
Se
tal reflexão é profunda no sentido de explicar o fenômeno do Bolsonarismo. Ela
é insuficiente, no sentido de localizar as tarefas hegemônicas da esquerda
operária na etapa de crise orgânica internacional, marcada pela crise de
dominação burguesa.
A
compreensão desse processo significa em primeiro lugar na superação de
mediações de conciliação de classe, como alternativa ao projeto de poder da
extrema direita. No Brasil, passa em estabelecer uma visão contestadora do
pacto social burguês objetivado pelo PT, na sua constituição de um governo de
Frente Ampla, junto com golpistas de outrora, para preservar os interesses
econômicos do capital imperialista e nacional.
O
papel do PT exerce conscientemente uma pressão institucional em toda a
esquerda. Exemplo mais evidente é o PSOL que integra o governo, compartilhando
dessa maneira da sua agenda anti-operaria, e neutralizando alternativas
independentes que possam surgir a esquerda do PT. Mas não só isso, toda a
esquerda, inclusive os setores mais radicais hoje são pressionados a defender
medidas bonapartistas do STF, que estrategicamente atuam contra a classe
trabalhadora. Desde comemorar e exigir acriticamente prisões, até defender
teorias que lutar hoje é um fator de instabilidade que só favorece a ação da
extrema direita.
Ou
seja, se a extrema direita assume uma localização "anti-institucional
", a resposta da esquerda não pode ser, transformar-se na guardiã da
constituição das instituições burguesas. Essa estratégia rompe com o princípio
fundamental da independência de classe, determinante para consolidar a
hegemonia operária na superação capitalista.
Cabe
aos revolucionários orientarem a sua intervenção na geopolítica e na estrutura
econômica, a partir da perspectiva estratégica da luta de classes. O processo
histórico de revoltas que ocorrem na França são provas cabais de como a fase
insurrecional da atual etapa não está condicionada apenas as forças da extrema
direita. Pelo contrário, reforçam a necessidade de uma estratégia da esquerda
que transformem essas revoltas em revolução, e não em conservação da ordem
econômica dominante.
Se
no Brasil, a dinâmica francesa ainda não está colocada, isso não resulta dizer
que tal conjuntura não pode mudar de forma abrupta. E no mínimo, devemos
considerar que já há sinais subjetivos, diferentes do momento anterior, na
classe trabalhadora.
A
greve dos Metroviarios de SP, na semana passada, a primeira realizada na gestão
de extrema direita do bolsonarista Tarcísio de Freitas, foi uma enorme
demonstração do potencial da classe trabalhadora em movimento. Não por acaso,
após a greve, o sindicato foi alvo de ações covardes da extrema direita, com
ameaças de morte a Presidenta Camila Lisboa e de ataques a diretores da
entidade que participaram dos piquetes.
Que
devem ser rechaçadas por todos os lutadores, justamente para defender o
importante saldo político e organizacional dessa luta, que contagiou e
fortaleceu outros setores da classe. Através de um sindicato que está nas mãos
dos trabalhadores, e não da política de contenção da burocracia sindical.
Apesar da direção do PSOL, que diga-se de passagem foi contrária a realização
da greve, movida pela "teoria da instabilidade", mencionada anteriormente.
Para
encerrar, as lições históricas são essenciais para aprender a luta política. O
integralismo brasileiro, na década de 30, dispersou-se e foi derrotado, não
pela política stalinista do PCB que chegou apoiar em vários momentos Getúlio
Vargas e setores nacionalistas da burguesia. Os camisas verdes, liderados por
Plínio Salgado, que se apoiavam na ascensão do fascismo italiano e nazismo
alemão, perderam sua capacidade de influência na política nacional, por conta
da política de frente única operária dos trostkistas brasileiros.
Particularmente, no episódio que ficou conhecido como a Arrevoada dos galinhas
verdes, na Praça da Sé em SP, que recomendo todos os leitores a conhecer mais
na série de artigos já publicados na plataforma digital do Esquerda Diário.
Ø
Bolsonaro
ingressa no “clube da direita mundial”, que vai se reunir em Lisboa
No
próximo mês de maio, Lisboa será a sede de uma espécie de “Rock in Rio” da
ultradireita. As margens plácidas do rio Tejo ouvirão o brado retumbante – e
frequentemente xenófobo – da francesa Marine Le Pen, do espanhol Santiago
Abascal, da italiana Giorgia Meloni e do português André Ventura, anfitrião da
festa.
Jair
Bolsonaro foi convidado e deverá se juntar a eles. Em coletiva sobre o evento
na semana passada, em Lisboa, Ventura destacou Bolsonaro como um dos principais
nomes do “combate ao socialismo” na América Latina.
Em
meados de março, Bolsonaro ainda tinha dúvidas sobre quando voltaria ao Brasil.
Temia a ação da Justiça e o desgaste provocado pelo escândalo das joias,
revelado pelo Estadão em furo de reportagem.
Na
ocasião, Jair recebeu um conselho do filho Eduardo: aproveitar o exílio para
estreitar laços com seus pares internacionais, nomeadamente Ventura e Abascal –
que, a exemplo de Donald Trump e do húngaro Viktor Orbán, haviam gravado vídeos
apoiando Bolsonaro durante a campanha eleitoral.
Em
conversa com Ventura na semana passada, Bolsonaro foi convidado para participar
do evento de Lisboa.
Se
confirmar presença, Bolsonaro reafirmará sua filiação ao grupo da ultradireita,
que combate a direita moderada em vários países europeus. Na Espanha a guerra é
sangrenta entre o Vox, partido de Abascal, e o tradicional Partido Popular
(PP). Em Portugal, Ventura quer superar o Partido Social Democrata (PSD),
reduto da direita moderada. Na Itália – país que Bolsonaro também pretende
visitar nas próximas semanas – a sigla Fratelli d’Italia (FdI), herdeira do
fascismo de Benito Mussolini, aniquilou a centro-direita e chegou ao poder.
Em
sua vinda ao Brasil, Bolsonaro enfrentará uma batalha semelhante, contra
adversários que pertencem a alas menos radicais da direita.
A
centro-direita brasileira conquistou governos no Rio Grande do Sul e em
Pernambuco, e Tarcísio de Freitas, em São Paulo, vem-se afastando
cuidadosamente do bolsonarismo com o intuito de se tornar uma opção moderada.
Para
liderar seu campo político, Bolsonaro terá que derrotar seus potenciais rivais
para 2026. Assistiremos nos próximos três anos à versão brasileira da guerra
fratricida das direitas que se desenrola já há algum tempo na Europa.
Bolsonaro
irá trabalhar para que no Brasil – a exemplo do que ocorreu na Itália e nos
Estados Unidos – a porção radical da direita aniquile a ala moderada.
Fonte:
Esquerda Diário/Agencia Estado
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