terça-feira, 6 de agosto de 2024

 Supremo fere o Congresso em sua parte mais sensível: o bolso

Ai do governo que desrespeitar uma decisão do Supremo Tribunal Federal: o presidente da República poderia ser acusado de cometer crime de responsabilidade e acabar deposto pelo Congresso.

Quantas vezes Bolsonaro não atacou o Supremo, disse que não respeitaria mais as ordens de certos ministros, sem jamais ousar fazê-lo? Bolsonaro não rasga dinheiro, ele põe no bolso.

Deputados federais e senadores também não rasgam. A não ser quando agem em conjunto sob o nome de Congresso. Nesse caso, sentem-se protegidos porque não há punição coletiva.

Para livrar-se de ser derrubado como foram os presidentes Fernando Collor e Dilma, Bolsonaro criou o Orçamento Secreto que deu mais poderes ao Congresso sobre o dinheiro público.

Há anos, o Supremo julgou que o Orçamento Secreto fere princípios da Constituição e que por isso não seria permitido. O Congresso arranjou um jeito de driblar a decisão do Supremo.

O orçamento secreto e a emenda Pix, de pagamento imediato, somaram R$ 67 bilhões até o momento e evidenciam o que se transformou o trato com o dinheiro da União.

A saber: apagão de planejamento, falta de transparência, desigualdades regionais e corrupção. O Congresso não renuncia ao bônus de alocar os recursos, mas não fiscaliza sua aplicação.

Em duas decisões tomadas ontem, o ministro Flávio Dino, do Supremo, mandou abrir os porões do Orçamento Secreto e determinou uma varredura nas emendas Pix. E não ficou só nisso.

Daqui para frente, o governo não poderá mais pagar sobras do Orçamento Secreto sem transparência, como faz hoje. Emenda Pix, só se antes se souber onde e no que o dinheiro será gasto.

Dino mexeu no que os parlamentares têm de mais sensível: o bolso. As decisões do ministro alimentam a esperança do governo Lula de recuperar parte do Orçamento que o Executivo perdeu.

Disse Dino:

“Temos um encontro marcado com o tema relativo à parlamentarização da elaboração orçamentária no Brasil e das despesas públicas no Brasil”.

Outro fato relevante: Dino devolveu ao Tribunal de Contas da União e a Controladoria-Geral da União o poder que lhes fora cassado de fiscalizar a aplicação das emendas parlamentares.

Espera-se para já a gritaria de deputados e senadores atingidos pelas decisões do ministro, e a reação do Congresso por meio dos seus atuais dirigentes. Em fevereiro, eles serão substituídos.

•        Cartão amarelo do Supremo Tribunal Federal para o Congresso: Judiciário breca o ‘orçamento secreto’

O Congresso retoma os trabalhos nesta terça-feira, após recesso desde 18 de julho, com um cartão amarelo do Supremo Tribunal Federal em relação aos subterfúgios do Orçamento Secreto da Câmara e do Senado, já declarado inconstitucional pelo próprio Supremo. É que enquanto deputados e senadores aproveitavam as férias de meio do ano para fazer campanha política para os aliados nas eleições municipais, o Judiciário, que voltou ao batente no dia 1º de agosto, fez o dever de casa nas férias e surpreendeu o Legislativo na questão das emendas PIX.

Deve-se ao ministro do STF Flávio Dino, que se debruçou nas férias com sua equipe sobre a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7.688, apresentada pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), pedindo mais transparência ao uso do dinheiro público nas emendas parlamentares, uma decisão lapidar. Ao Supremo, a Abraji argumentou que os dispositivos que autorizam a transferência de recursos, sem vinculação a projetos e sem convênio, violam princípios fundamentais, como os da publicidade, da moralidade, da eficiência e da legalidade. A Abraji sustenta que a emenda PIX “torna a execução orçamentária da União desprovida de transparência, muitas vezes favorecendo entes federados ao bel prazer de escolhas parlamentares, sem qualquer justificativa, controle ou responsabilização para tanto”.

O ministro determinou que as transferências especiais somente sejam feitas com o atendimento aos requisitos constitucionais da transparência e da rastreabilidade. Para isso, os beneficiários deverão inserir na plataforma Transferegov.br, previamente ao recebimento dos recursos, informações como plano de trabalho, objeto a ser executado, finalidade, estimativa de custo e o prazo, assim como a classificação orçamentária da despesa. É o mínimo. Já houve casos de político de um estado transferir, dentro da sua cota, recursos para parente ou parceiro político de outro estado da federação.

Na decisão, Flávio Dino destaca trecho de voto do ministro Luís Roberto Barroso na ADPF 854, no qual afirmou que “em uma democracia e em uma República não existe alocação de recurso público sem a clara indicação de onde provém a proposta, de onde chega o dinheiro”. Em consequência, Dino determina que “o Poder Executivo só poderá liberar os recursos oriundos das “emendas PIX” após o atendimento da referida obrigação pelos futuros destinatários da transferência especial”. No caso das transferências especiais na área de saúde, será necessário apresentar parecer das instâncias competentes de governança do SUS. A decisão, em caráter liminar, deverá, ainda, ser submetida a referendo do pleno da Corte, mas já abriu uma jurisprudência que deve ser seguida pela maioria do plenário. Dino fixou um prazo de 90 dias para que a CGU faça auditoria em todos os repasses por emendas PIX realizados entre 2020 e 2024 em benefício de ONGs. Essas instituições e demais entidades do terceiro setor também terão 90 dias para informar os valores que foram recebidos e sua destinação.

O Orçamento Secreto foi um artifício usado no governo Bolsonaro para cooptar as mesas da Câmara e do Senado e os deputados e senadores a “morderem” mais o Orçamento Geral da União e fecharem os olhos a abusos do Executivo. Graças a esse “suborno”, que alcançou R$ 59 bilhões este ano, não deu em nada (até aqui) a CPI da Covid no Senado. Com as travas impostas por Flávio Dino, é de se esperar que os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PDS-MG), protestem na reabertura dos trabalhos. As restrições ao uso das emendas do orçamento (que teve de ser contingenciado em R$ 15 bilhões para não estourar os limites) seria medida de equidade entre os Poderes Executivo e Legislativo, que não abre mão de nada. Mas deve ter influência nas sucessões de Lira e Pacheco, em fevereiro de 2025.

•        Emendas Pix: Câmara reage às restrições de Dino ao uso dos recursos

Um dia depois de o ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), exigir transparência e fiscalização no repasse das chamadas "emendas Pix", a Câmara reagiu e anunciou que recorrer da decisão do magistrado.

O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e a consultoria jurídica da Casa analisavam qual forma de recurso será apresentada. A "emenda Pix" é o tipo de verba distribuída diretamente por parlamentares às prefeituras e governos estaduais sem necessidade de prestação de contas, projetos, convênios e justificativa. E permite ao chefe do Executivo gastar essa verba de acordo com sua vontade.

"A assessoria jurídica da Câmara dos Deputados está analisando tecnicamente a decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal Flávio Dino para recorrer ao pleno da Corte Suprema do país", informou oficialmente a assessoria da Casa.

Dino decidiu ainda que o governo federal só libere os recursos dessas emendas após cumpridas exigências como apresentação do plano de trabalho; o objeto a ser executado, se uma obra ou alguma reforma; a finalidade e o prazo de execução.

Na decisão, o ministro determinou que o Tribunal de Contas da União (TCU) e a Controladoria-Geral da União (CGU) fiscalizem as transferências das emendas Pix. O magistrado fixou um prazo de 90 dias para a CGU auditar os repasses em benefício de ONGs, feitos de 2020 a 2024, e para que as instituições e demais entidades do terceiro setor informem na internet os valores recebidos no mesmo período, bem como em que foram aplicados.

Segundo o ministro, os repasses devem seguir, essencialmente, o princípio da transparência e da rastreabilidade. Esse tipo de recurso só será liberado após os parlamentares inserirem na plataforma Transferegov.br informações que garantam transparência.

•        Prevenção

Pela decisão, fica determinado que o parlamentar — deputado ou senador — só pode enviar emendas dessa categoria para o estado pelo qual foi eleito. O ministro  afirmou que a intervenção do STF se justifica para "impedir a continuidade de caminhos incompatíveis com a Constituição".

"Isso visa, inclusive, prevenir que posteriormente haja a promoção de responsabilidade penal e civil de agentes públicos — em decorrência de inconstitucionalidades perpetradas", destacou o magistrado.

O plenário virtual do STF vai analisar, entre 16 e 23 de agosto, a decisão de Dino. A expectativa é de que a ordem do magistrado seja acatada por unanimidade pela Corte.

O orçamento secreto, outra prática de repasse de emenda sem qualquer fiscalização, foi suspenso pelo STF em 2022. Mas para a Transparência Brasil, o surgimento das "emendas Pix" substituíram essa forma nada às claras de distribuição de verba pública para os redutos eleitorais dos parlamentares.

Na avaliação da entidade, o Congresso e o Executivo continuaram a repassar parcelas significativas do Orçamento da União "sem transparência, longe dos olhos da sociedade e dos órgãos de controle".

A decisão de Dino atende a ação ajuizada pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji). Na petição encaminhada ao Supremo, a entidade aponta que os repasses não podem ser realizados sem vinculação a projeto ou atividade específica.

 

¨      Livro critica o excesso de penduricalhos que favorecem as elites dos servidores. Hélio Schwartsman, na Folha

Sou fã de Bruno Carazza desde os tempos em que ele mantinha um blog no qual tentava introduzir medidas objetivas para analisar questões de direito. É com satisfação, portanto, que o vejo agora envolvido no ambicioso projeto de escrever uma trilogia que atualiza “Os Donos do Poder”, o clássico de Raymundo Faoro, que mostrou como alguns estamentos sociais conseguem sequestrar o poder do Estado brasileiro para beneficiá-los.

O título da obra de Bruno é “O País dos Privilégios”, da qual acaba de sair o primeiro volume.

OS SERVIDORES

Neste tomo inicial, Bruno se debruça sobre o funcionalismo público. Esse livro teria potencial de ser um dos mais aborrecidos do mundo. O que Bruno faz essencialmente é comparar tabelas com rendimentos de servidores e outros dados que não despertam entusiasmo. Mas ele consegue transformar isso numa leitura interessante.

Eu exageraria se afirmasse que a obra se lê como um romance de Agatha Christie, mas o texto é agradável e prende a atenção. Até desperta algumas emoções no leitor, quando descreve as formas criativas pelas quais certos estamentos extraem benefícios da sociedade.

O número de funcionários públicos no Brasil não é exagerado –12%, bem menos que o registrado em algumas economias avançadas–, mas empenhamos em suas remunerações a formidável fatia de 13% do PIB, padrão só verificado nos países nórdicos.

MUITA DESIGUALDADE 

A distribuição é, como tudo no Brasil, desigual. Enquanto funcionários municipais ganham em média menos que trabalhadores da iniciativa privada em funções semelhantes, grupos de elite do funcionalismo federal ganham bem mais, além de gozar de outros privilégios.

Estamos falando de juízes, membros do Ministério Público, fiscais de renda etc.

O livro não é uma diatribe contra servidores públicos. Bruno é muito cuidadoso ao lembrar que eles desempenham um papel importantíssimo na administração, que justifica alguns (mas não todos) os privilégios.

 

Fonte: Metrópoles/Jornal do Brasil/Correio Braziliense

 

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