Após superarem o câncer de mama, mulheres vivem uma nova filosofia de
vida
Em um mundo em que a coragem se transforma em força
e a esperança brilha mais forte que nunca, o câncer de mama esbarra em mulheres
fortes, que se recusam a se render. Juntas, elas compõem a paleta cor de rosa
de resiliência, amor e determinação, revelando ao mundo que a batalha contra a
doença é uma história de superação que merece ser contada. Por isso, são
retratadas nas telas da vida como símbolos de amor-próprio.
Neste último fim de semana de outubro, contamos as
histórias de Cristina Roberto, Eciliane de Sousa, Wanessa Andrade e Rosa Maria
Mororó, que personificam a vitória diante da guerra contra o câncer de mama. Ou
melhor, cânceres de mama e seus diversos tratamentos, como bem explica o médico
Cristiano Resende, oncologista da Oncoclínicas Brasília e especialista em
câncer de mama. "O tratamento envolve várias abordagens, dependendo do
estágio e do subtipo. Isso inclui cirurgia, radioterapia e tratamento
medicamentoso como quimioterapia, endocrinoterapia, terapia alvo e
imunoterapia."
O acompanhamento médico é vital, com consultas
regulares, exames laboratoriais e mamografias anuais. O apoio multidisciplinar,
chamado de survivorship, garante o bem-estar pós-tratamento e vem sendo cada
vez mais estudado, valorizado e disseminado, inclusive em congressos médicos. O
suporte multidisciplinar feito por meio da equipe médica, nutricionistas,
enfermeiros e psicólogos é fundamental para reinserir a mulher em sua vida
pessoal e profissional.
O estigma e o medo do câncer de mama são
desafiadores, mas a informação de qualidade e o suporte podem mudar a
perspectiva. A evolução nos tratamentos aumentou as chances de cura e melhorou
a qualidade de vida após a doença. "Ter o diagnóstico de câncer de mama
nunca é uma situação fácil. O desconhecimento e o medo, associados à imagem
pré-concebida das mutilações e limitações que o tratamento dessa neoplasia
envolve, assim como a finitude da vida, geralmente pautam a primeira consulta
de uma paciente recém-diagnosticada", reforça Cristiano.
Uma pesquisa do Datafolha revela que a maioria das
mulheres se considera bem-informada sobre o câncer de mama, mas possui pouca
compreensão sobre os tipos da doença e seus estágios. A empresa Gilead Sciences
divulgou um estudo que destaca a falta de equidade na saúde, especialmente
entre mulheres negras de classes C/D e com níveis mais baixos de escolaridade.
O câncer de mama é uma das principais causas de morte entre as mulheres,
tornando a informação e o diagnóstico precoce cruciais.
Nas regiões Norte e Centro-Oeste do Brasil, por
exemplo, cerca de 49% das mulheres reconhecem que têm conhecimento limitado ou
insuficiente sobre a doença. Entre as mais jovens, com idades entre 25 e 29
anos, esse índice atinge 45%. Além disso, outras categorias que demonstraram
enfrentar desafios na obtenção de informações adequadas foram pessoas das
classes D/E (42%); as que possuem apenas o ensino fundamental (36%); e mulheres
negras (35%).
Cristina, Eciliane, Wanessa e Rosa Maria vivem hoje
uma nova filosofia de vida, seja ressignificando o lado profissional,
produzindo um livro, cursando uma faculdade ou viajando o Brasil dentro de uma
Doblô. Cada dedicação se tornou um refúgio de conexão e aprendizado, espalhando
a mensagem de respeito ao próprio corpo e vivendo com gratidão.
• Mudança
de hábitos
Na trajetória de Cristina Roberto, 68 anos, cada
detalhe assume uma importância única, uma peça fundamental no quebra-cabeça de
sua jornada de superação após o diagnóstico de câncer de mama. Cada ação, cada
escolha, cada passo tomado é um fragmento de sua história, composta com cuidado
e determinação. "Quando eu recebi o diagnóstico, eu me disse assim:
'agora, você é sua, cuide de você!'."
Esta determinação a levou a uma busca incansável
por conhecimento. E um livro se tornou seu guia: Dieta anticâncer, do médico e
pesquisador francês David Servan-Schreiber. A obra não apenas delineou um
protocolo de tratamento, mas também enfatizou a necessidade de assumir o
controle da própria saúde.
"Fiquei procurando coisas de autocuidado. E
teve algo que foi muito importante para mim, que é o livro de um médico que
teve um câncer, conviveu com isso por 20 anos, fez um trabalho maravilhoso de
pesquisa e de mudança de hábitos. Ele tinha um tumor superagressivo e conseguiu
viver muitos anos bons, com exercícios, horário de dormir, para comer. E eu fui
colocando isso na minha vida", detalha.
Cristina admite que tinha uma vida muito
estressada. Dona de um bufê, fazia vários eventos. "Era uma correria para
lá e para cá. Eu não dormia e não comia direito. Respeitar o seu corpo, o
horário de comer, de dormir e de acordar é fundamental. O ciclo circadiano é
real e ele precisa ser respeitado, o nosso corpo tem um reloginho
próprio."
A alimentação se tornou um elemento crítico em sua
busca pela cura. A eliminação do açúcar de sua dieta foi uma decisão marcante.
Ela mergulhou nos princípios da medicina chinesa e Ayurveda, buscando
equilíbrio e vitalidade por meio da comida.
Hoje, Cristina comanda seu próprio restaurante, o
Cura Cozinha Orgânica. O novo trabalho permitiu encontrar alegria na interação
com as pessoas, tornando um local de conexão, onde compartilha sua sabedoria e
amor com aqueles que a visitam. Apesar dos desafios, aprecia a interação com
clientes, e o restaurante a ajudou a lidar com preocupações de saúde e a
sensação de envelhecimento, proporcionando-lhe gratidão pela oportunidade de viver
essa experiência.
"Quando eu vejo o pau quebrando, eu entro e
ajudo a servir e faço todas as coisas que é preciso. Tenho trabalhado bastante,
às vezes é cansativo, porém me permitiu interagir mais com as pessoas e
reacender minha vida social, então isso está sendo muito rico para mim."
• Respeitando
o próprio corpo
Após o diagnóstico, Cristina buscou uma
nutricionista e incorporou exercícios físicos à sua vida, fortalecendo corpo e
mente. "Ela me deu algumas vitaminas, então isso me aprumou, porque o meu
diagnóstico chegou no meio da pandemia, em 2021, e eu tinha tido outros
problemas de saúde, uma diverticulite muito pesada, e estava muito debilitada
fisicamente, então o primeiro caminho foi fortalecer meus músculos. Caminhadas
diárias e a prática da meditação me tornaram mais forte, não apenas
fisicamente, mas também emocionalmente. Eu acho que isso é muito importante
para enfrentar uma cirurgia e um tratamento."
Além disso, encontrou apoio em óleos como o
canabidiol (CBD) e derivados da cannabis, que proporcionaram serenidade e
aceitação durante sua jornada e desempenharam um papel surpreendente,
oferecendo uma sensação de paz e aceitação para enfrentar o câncer de maneira
mais suave e suportável.
• Cuidando
do coração
É essencial lembrar que a vitória contra essa
doença não marca o fim da jornada. Para milhares de mulheres, após a fase do
tratamento, inicia-se uma nova batalha, muitas vezes negligenciada: a proteção
do coração. Com base na estimativa do Instituto Nacional do Câncer (Inca), de
73.610 novos casos de câncer de mama no Brasil em 2023, o Outubro Rosa traz à
tona não apenas a importância da detecção precoce, mas também a necessidade de
entender os desafios que surgem após a vitória na luta contra o câncer.
Uma pesquisa conduzida pelo Journal of Cancer
revelou que mulheres sobreviventes do câncer de mama enfrentam um risco
significativamente maior de desenvolver doenças cardiovasculares. A
cardiologista Edna Marques, eletrofisiologista do Instituto do Coração de
Taguatinga (ICTCor), alerta para os perigos potenciais que podem surgir durante
e após o tratamento, relacionados a medicamentos e terapias específicas, como
os inibidores de aromatase.
É fundamental que essas mulheres compreendam a
importância do acompanhamento cardiológico e a identificação precoce de
sintomas que podem indicar problemas cardiovasculares. Muitas vezes, os
sintomas de infarto nas mulheres são diferentes e subestimados, o que destaca a
necessidade de educação sobre a saúde cardíaca.
Edna Marques também destaca fatores de risco, como
hipertensão, tabagismo, obesidade e depressão, que podem agravar essas
condições. Dietas equilibradas e atividades físicas desempenham um papel
crucial na prevenção de doenças cardíacas e câncer.
• Sonho
que nasce da empatia
Pacientes acometidos pelo câncer comumente
desabafam sobre como o diagnóstico costuma vir acompanhado pelo amargo gosto da
angústia e do receio daquilo que era, até então, desconhecido pelo próprio
corpo. Com Eciliane de Sousa, 37 anos, não foi diferente. Ela lembra o quão aflitivo
foi o período em que teve de conviver com a doença, mas expõe a felicidade de
ter encontrado uma nova paixão no caminho até a cura — a psicologia.
Aos 35 anos, Eciliane vivia uma rotina considerada
normal. Alternava os cuidados com as filhas, a mais velha, à época, com 15 e as
gêmeas de 9 anos, com os trabalhos, os estudos voltados para concurso público e
a prática de atividades físicas, quando possível. Diligente com a saúde, sempre
fez questão de observar o próprio corpo e percebeu, em um dia como qualquer
outro, uma mancha avermelhada, sem nodulação, em sua mama — imediato motivo
para preocupação.
Buscando entender do que se tratava a alteração,
foi avaliada por quatro médicos da família, sendo que todos falaram que se
tratava de mastite, uma inflamação nas glândulas mamárias. Voltou para casa,
mas, pouco tempo depois, a mancha passou a coçar e a esquentar, então recorreu
a uma ultrassom, que novamente não apontou nenhuma anormalidade.
Tranquila por estar, aparentemente, tudo bem,
Eciliane viajou para o Maranhão, sua terra natal, e foi lá que percebeu que, de
fato, havia algo errado, pois, com o passar dos dias, a mama apresentava cada
vez mais características duvidosas. Ainda no Nordeste, buscou um médico, que
solicitou uma biópsia. Poucos dias depois, recebeu o diagnóstico de câncer de
mama HER2 positivo.
"Foi devastador e angustiante, mas, para mim,
o pior não foram os sintomas nem os efeitos dos medicamentos, mas a queda do
cabelo. Passar a mão e sentir as mechas caindo foi como uma cena de terror."
É assim que Eciliane descreve os momentos que sucederam o diagnóstico, foram 16
sessões de quimioterapias realizadas em meio a uma depressão profunda.
Para cuidar da saúde mental e aliviar os sintomas
de desânimo e isolamento que a acometeram, teve de ir à terapia, entretanto as
consultas foram exatamente o contrário do esperado. "Eu passei por alguns
psicólogos, mas eu me senti pior do que já estava. Eles falavam coisas como 'eu
sinto muito', 'eu sei pelo que você está passando' e, naquele momento, ninguém
sabia pelo que eu estava passando porque nenhum daqueles profissionais tinham
câncer, então, não, eles não sabiam da minha dor nem da sensação angustiante de
observar os cabelos caírem sem poder fazer nada."
Com a mãe morando no Maranhão e as filhas ainda
menores de idade, Eciliane precisou ir às consultas e frequentar a terapia
sozinha, o que a deixou ainda mais vulnerável. Para que pudesse focar
inteiramente no tratamento, a mãe de Eciliane veio a Brasília em dezembro de
2022, e, após acompanhar a cirurgia de mastectomia da filha, levou as netas
para passarem um tempo com ela no outro estado.
Em 2023, Eciliane segue indo em consultas para
fazer acompanhamento, especialmente por ter sido diagnosticada com um tipo
delicado da doença, mas conta, emanando gratidão, que olha para trás e ri.
Praticante da religião evangélica, acredita que a sua fé foi um dos pilares
principais para que pudesse ser curada.
• Um
novo caminho
Movida pelo nó na garganta que vivenciava sempre
que não se sentia acolhida durante as consultas de terapia, Eciliane tomou uma
decisão que nunca havia cogitado antes — estudar psicologia. Conseguiu bolsa
integral para capacitar-se no tão sonhado curso e, então, ingressou na
Faculdade Mauá, no início de 2023. Agora, cursando o segundo semestre, conta
que busca conhecimento para ajudar homens, mulheres e crianças diagnosticadas
com câncer.
"A vontade de cursar psicologia nasceu a
partir do momento que eu não senti o acolhimento adequado para mim. Muitas
vezes, por não se sentirem acolhidos, pacientes desistem do tratamento e,
quando têm metástase, desconhecem a existência das casas de acolhimento,
desacreditam que existe a possibilidade de cura e que podem, sim, ter qualidade
de vida durante o percurso do tratamento."
Eciliane conta que ninguém a informou sobre os
projetos que abraçam pacientes oncológicos e que tudo o que sabe é conhecimento
adquirido por ter ido atrás, sozinha. No empenho por buscar informações,
conheceu projetos que a ajudaram de forma inimaginável. Por meio do Hospital Regional
da Asa Norte, (HRAN) descobriu a Recomeçar. "Ela me deu um suporte
maravilhoso, deu a minha prótese e mostrou os meus direitos e as medicações
disponíveis para o tratamento. Na Sara Mulher, instituição em Águas Lindas de
Goiás, eu tive apoio psicológico e jurídico, além de me oferecerem cesta básica
e pagarem o meu aluguel durante todo o processo. "
A agora estudante declara querer trabalhar
incansavelmente para que os pacientes oncológicos estejam sempre informados
sobre os seus direitos, pois foi a informação que a fez não desistir.
"Existe vida com qualidade depois do câncer, existe uma evolução contínua
dos tratamentos de combate ao câncer de mama, as tecnologias favorecem o
tratamento e quanto mais precoce descoberto, melhor. Você, mulher, não pode
desistir da vida, pois dentro de você habita uma avó, uma mãe, uma filha e uma
tia e você pode, sim, ser exemplo de força."
• Cuidado
integral
Para além do histórico familiar, fatores ambientais
são profundamente relevantes no diagnóstico do câncer de mama. Ingestão de
bebida alcoólica, sobrepeso e obesidade, inatividade física e exposição à
radiação ionizante podem estimular o aparecimento da doença.
Letícia Có, fisioterapeuta e profissional de
educação física, aponta que nos últimos anos o número de estudos que relacionam
a atividade física à prevenção do câncer de mama tem aumentado. "A prática
de atividade física incorporada na rotina é um fator importante na prevenção,
pois ajuda a promover um equilíbrio nos níveis hormonais e um fortalecimento do
sistema imune."
Quanto aos exercícios, durante e após o tratamento,
há evidências de que a atividade física reduz o risco de mortalidade em
decorrência da doença. A profissional explica que, com a prática dos
exercícios, alguns efeitos colaterais, como linfedema, fadiga e fraqueza,
sintomas depressivos e ganho de peso, podem ser atenuados, além de melhorar a
qualidade de vida dos sobreviventes do câncer. "De forma geral, a
atividade física é tolerável e segura durante o tratamento oncológico, porém é
importante avaliar as contraindicações e particularidades de cada pessoa, além
dos possíveis efeitos adversos causados pelo tratamento."
Suelen Lima, nutricionista oncológica da
Oncoclínicas Brasília, destaca a importância da alimentação durante o
tratamento, incluindo o suporte nutricional de um profissional especializado.
Alimentos ricos em antioxidantes, como frutas vermelhas e vegetais, ajudam a
proteger as células saudáveis. "Manter a hidratação é fundamental para
reduzir os efeitos colaterais dos tratamentos. Uma dieta equilibrada com foco
em proteínas magras, grãos integrais e a limitação de carboidratos simples é
eficaz."
Alimentos como gengibre em pó, açafrão, ferro,
carnes magras, peixes ricos em ômega-3 podem ser benéficos. Pequenas refeições
ao longo do dia são recomendadas para pacientes com inapetência. A prevenção da
recidiva do câncer de mama envolve hábitos saudáveis, enfatizando alimentos
vegetais, controle de estresse, alimentos in natura, atividade física,
microbiota intestinal saudável, sono regular e manutenção do peso. Isso
contribui para uma maior remissão e qualidade de vida.
Luciana Hotz, fundadora e presidente do Instituto
Oncoguia, ressalta que é essencial que os pacientes conheçam os próprios
direitos para que, assim, alcancem bem-estar e qualidade de vida durante o
tratamento. "Para a gente ajudar esses pacientes, é necessário bater na
tecla do que não é qualidade de vida. Ter dor, náuseas e vômito não é qualidade
de vida, o impacto na questão financeira não é qualidade de vida. Aqui no Oncoguia
a gente tem discutido essa questão de explicar para o paciente coisas que não
são normais e que não podem fazer parte do tratamento para que geremos um modo
mais consciente de se cuidar."
• Saúde
mental
Falar sobre saúde mental também é essencial. Segundo
a Archives of Clinical Psychiatry (São Paulo), a depressão é o transtorno
psiquiátrico mais comum em pacientes com câncer, com prevalência variando de
22% a 29%. A psicóloga Vanessa Mello afirma que o acompanhamento psicológico,
no caso de pacientes oncológicos, serve exatamente para que consigam lidar com
as emoções que aparecerão ao longo do processo.
"Para lidar com todos esses sentimentos, como
a tristeza, a raiva e o medo de morrer, o paciente precisa de ajuda
profissional, porque os amigos e a família não conseguirão lidar da mesma forma
e, muitas vezes, também estarão tristes e chateados. Por isso, é importante ter
um espaço com uma escuta qualificada para ouvir." Vanessa salienta que,
para mulheres diagnosticadas com o câncer de mama, o acompanhamento auxilia nas
questões que surgem acerca da sexualidade e da feminilidade, que são
normalmente abaladas após as intervenções cirúrgicas.
De acordo com a psicóloga, estar com a saúde mental
preservada contribui para o êxito do tratamento, porque o emocional influencia
diretamente no sistema imunológico. "Já existem estudos que falam da
questão psicossomática, que relaciona o emocional com as doenças. Então, toda
doença pode ser, de certa forma, criada ou piorada, a depender do estado
emocional."
• O desabrochar
da Rosa
Rosa Maria Mororó, 51 anos, trabalhava em órgão
público há quase 20 quando repentinamente teve de encarar um diagnóstico de
câncer de mama. Mãe de dois filhos e avó de três, conta que não se orgulha de
como levava a vida antes da doença. Doava-se integralmente aos cuidados com a
casa, não praticava nenhum exercício, alimentava-se mal e vivia desde a
adolescência às sombras da angústia, insegurança e depressão.
Apesar dos maus hábitos, nunca deixou de realizar
os exames periódicos anualmente e os resultados eram sempre bons. Contudo, em
2016, por meio de uma ecografia, o médico notou a presença de um pequeno nódulo
e alertou Rosa de que ele deveria ser acompanhado.
A próxima consulta, porém, aconteceria somente no
ano seguinte. Mas, meses depois da visita ao médico, Rosa teve um sonho em que
acredita ter recebido um alerta. "Eu estava com uma dor na barriga, por
ter feito alguns abdominais e, no sonho, escutei uma voz que falava que na
barriga não era nada, mas que o meu peito me daria um pouco de trabalho. De
acordo com o que eu acredito, o Espírito Santo falou comigo."
Rosa acordou preocupada e logo se lembrou dos
exames que havia feito tempos antes, passou a apalpar a mama esquerda, no
entanto não notou a presença de nada diferente. "O nódulo que apareceu na
mama esquerda durante o exame era minúsculo, milimétrico, muito pequeno e sem
formato suspeito."
Em junho de 2017, Rosa voltou ao consultório para
repetir o exame e, mais uma vez, foi tranquilizada pelo médico, que a informou
que o nódulo não havia crescido e estava exatamente igual. Desinquieta, porém,
com o que havia escutado no sonho, explicou a situação ao profissional, que
concordou em fazer um exame específico para que a paciente pudesse dormir
tranquila.
Em uma segunda-feira de manhã, no mês de agosto de
2017, recebeu a notícia que tanto temia. "Recebi o resultado 'nódulo
ductal invasivo grau 3 — carcinoma'. Fui pesquisar e descobri que era um
câncer, então veio aquele momento em que eu perdi o chão e fiquei
emotiva."
Rosa acredita que os fatores emocionais
contribuíram diretamente para que a doença se manifestasse em seu corpo.
Recebeu a notícia de que estava com a doença dois anos após o divórcio de um
casamento de 26 anos. "A minha alma era triste, então o meu corpo gritou.
Nenhuma mulher da minha família havia sido diagnosticada com esse câncer antes,
eu fui a primeira."
Rosa conta que, à época, tinha acabado de iniciar
um namoro e que o parceiro, Sávio Mororó, 58, foi essencial para que pudesse
superar a doença com sucesso. "Eu não sabia como contar para ele. A
primeira esposa, com quem ele conviveu por muitos anos, faleceu de câncer de
mama e eu cheguei na vida dele pouco tempo depois. Imaginei que ele não
aceitaria passar por isso novamente."
Sávio não desistiu da relação; muito pelo
contrário, declarou que a entregaria total apoio. Apenas dois dias depois do
diagnóstico, fizeram uma união estável para que Rosa pudesse ter direito ao
plano de saúde do companheiro. Ela conta, orgulhosa, que em todas as consultas
e nas sete cirurgias, Sávio se fez e se faz presente ainda hoje.
• Um
pós de descobertas
Desde o diagnóstico, Rosa imergiu em uma jornada de
autoconhecimento. Logo que as sessões de quimioterapias começaram, passou a
visitar nutricionistas e psicólogos, mudando a forma de se alimentar e
abordando na terapia não só as reflexões sobre a doença, mas sobre tudo que a
atormentava anteriormente e que antes acreditava ser normal.
Todas as distrações que pudessem contribuir para o
sucesso do tratamento foram aceitas. "Em meio às cirurgias, eu fui
autorizada pelo meu médico a viajar. Fazia parte da terapia, eu esqueci que
tinha tratamento, esqueci que estava com cirurgia marcada."
Durante a árdua trilha do tratamento, o inchaço no
corpo se tornou evidente e, mesmo com a alimentação monitorada, Rosa teve
sobrepeso, então as caminhadas e os exercícios leves faziam parte do dia a dia,
enquanto a quimioterapia acontecia.
Após as cirurgias para reconstrução da mama e
colocação das próteses, Rosa teve complicações e o emocional, que estava ótimo,
acabou abalado novamente. "Eu tive uma infecção e foi necessário retirar a
prótese da mama esquerda. O meu emocional fraquejou naquele momento, porque
mexeu bastante com a minha autoestima."
A última cirurgia para reconstrução aconteceu em 4
de setembro de 2022 e, agora, Rosa faz fisioterapia, consultas periódicas de
acompanhamento e frequenta academia, além de participar do projeto Canomama,
voltado para mulheres que tiveram câncer de mama. "Eu era outra pessoa
antes. A tristeza me consumia, minha alma era abatida e o meu corpo gritou,
ficando doente, então eu tive que curar a minha alma para curar o meu
corpo."
Hoje, Rosa leva uma vida completamente diferente da
que costumava ter. "Eu sou cheia de cicatrizes no corpo, mas sinto a minha
alma curada. Quero falar para outras mulheres, que podem ter adoecido também
pelo estilo de vida que levavam, para se revigorarem, se reinventarem e
entenderem que são novas pessoas, com uma nova oportunidade dada por
Deus."
Para além das atividades físicas, da alimentação
saudável e do remo no lago, Rosa, ao lado do esposo e da cadelinha Megan,
descobriu uma nova paixão: viajar. Juntos, compraram uma Doblô, onde montaram
uma cama, anexaram um fogão e uma minigeladeira e fazem pequenas viagens.
"Eu já conheci vários lugares, O Cânion do Xingó, o Rio São Francisco,
Porto de Galinhas. A gente dorme dentro do carro, em postos de gasolina e
estacionamentos."
A tristeza era um sentimento tão corriqueiro na
vida de Rosa, que todos que a conheciam antes da doença se admiram com a mulher
em que ela se converteu. "Minha amiga brinca que antes eu era uma rosa
murcha e que agora sou uma rosa que, finalmente, desabrochou."
• Leveza
e confiança
Após vencer o câncer de mama por duas vezes,
Wanessa Andrade transformou sua experiência em uma missão de compartilhar força
e otimismo com outros guerreiros da doença. Graduada e pós-graduada em
administração de empresas, apaixonada pelas terapias integrativas, conta que
sua missão é servir a todas as mulheres que passaram pelo tratamento e pensam
que a saída é se entregar à doença.
"Neste primeiro trabalho, meu objetivo é falar
da minha experiência e de outras pacientes que enfrentaram a doença com leveza
e confiança. Trazer para as sobreviventes informações importantes sobre os
direitos legais de cada uma de nós, que, às vezes por pura desinformação, não
têm o tratamento que deveriam ter."
Wanessa travou sua primeira batalha contra o câncer
de mama em 2015, quando tinha 38 anos. Em outubro de 2022, a doença surgiu
novamente em sua axila. O que poderia ter abalado a fez ter coragem para
enfrentar a situação. "Eu sempre tratei o câncer como uma doença, por que
não dizer uma gripe", diz Wanessa, destacando que, apesar das cirurgias e
da radioterapia, sua trajetória é marcada pela ausência de reações negativas.
Para a administradora, superar o câncer é mais do
que apenas vencer a doença; é sobre superar os desafios que vêm com ela. Seu
tratamento terminou em setembro de 2023, mas as medicações continuarão por uma
década. Ela não apenas sobreviveu, mas prosperou e transformou sua experiência
em uma oportunidade de ajudar os outros.
• Voz
ativa
Durante sua segunda batalha contra o câncer,
Wanessa enfrentou desafios pessoais e profissionais, incluindo problemas com
plano de saúde e INSS. Contudo, vê essas dificuldades como lições valiosas que
a fortaleceram. Hoje, é uma voz ativa de apoio para outras mulheres. Ela lançou
o e-book Estou com câncer de mama, e agora?, repleto de conselhos e dicas,
compartilhando sua mensagem de que o tratamento pode ser mais leve do que se
imagina, e de que, mesmo nos momentos mais desafiadores, é possível encontrar
oportunidades de crescimento.
A escritora também adotou um estilo de vida
saudável após o tratamento, incluindo exercícios físicos e reeducação
alimentar. Além disso, envolve-se em terapias integrativas e trabalha com
pessoas que enfrentam desafios semelhantes. Seu compromisso é ajudar os outros
a encontrar bem-estar físico e mental.
"O e-book é um presente para as mulheres que
enfrentaram ou enfrentam a doença. O câncer de mama não é o fim, mas, sim, um
capítulo em nossa história de vida. Com determinação, esperança e amor podemos
superá-lo, inspirando outros pelo caminho. Juntas, podemos mostrar ao mundo que
a força interior é a chave para enfrentar qualquer desafio."
• Os
homens não estão livres
"O câncer de mama em homens é um evento raro,
por isso não existe recomendação de mamografia de rastreio no sexo masculino.
Mas, apesar de raro, pode acontecer, e os sintomas são exatamente os mesmos das
mulheres: nódulo palpável, endurecimento da glândula mamária, rachadura ou
erosão da pele, vermelhidão na mama, etc. É sempre importante lembrar que o
câncer de mama em homens é um alerta para testagem genética para avaliar
predisposição hereditária ao câncer."
Fonte: Correio Braziliense
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