As digitais dos
militares e os militares digitais
Nas
últimas semanas, graças ao trabalho de jornalistas e das polícias Federal e
Civil do DF, ficou mais claro que a tentativa de golpe de 8 de janeiro teve
mesmo enorme participação de militares, se é que não foi mesmo uma quartelada
muito canhestra.
A
coluna de Guilherme Amado mostrou que o carro
usado na tentativa de ataque a bomba ao aeroporto de Brasília, na véspera de
Natal, foi encontrado duas semanas depois com um sargento da Marinha – da ativa
– também suplente de deputado federal pelo Republicanos, conhecido como
Sargento Paulo. Segundo a Polícia Civil, a Hyundai Creta saiu de Brasília em 9
de janeiro.
No
celular do ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, tenente-coronel Mauro Cid – da ativa –,
encontrou-se um documento que relata
passo a passo o plano para o golpe: Bolsonaro encaminharia relatos de
inconstitucionalidades do Judiciário aos comandantes das Forças Armadas e estes
interviriam com base no famigerado artigo 142.
No
mesmo aparelho, a PF recuperou conversas do grupo de WhatsApp “…Dosssss!!!”,
que reunia oficiais, incluindo atuais e ex-comandantes de unidades. As
mensagens golpistas vão desde gente dizendo que o Exército poderia ter atuado
“há muito tempo” através de operações de contrainteligência até ex-comandante
do Batalhão de Apoio às Operações Especiais afirmando que a ruptura “já
aconteceu” e subchefe do Estado-Maior do Exército implorando para Mauro Cid
convencer Bolsonaro a dar um golpe de Estado. “Se a cúpula do EB [Exército
Brasileiro] não está com ele, da divisão para baixo está. Assessore e dê-lhe
coragem”, escreveu o coronel Jean Lawand Júnior, segundo revelou Robson Bonin,
da Veja.
O
assalto de Brasília em si incluiu ações coordenadas que podem bem ser parte do
arsenal de sabotagem aprendido nos cursos de operativos especiais – assim como
os atos terroristas de incêndio ao prédio da PF e derrubada de torres de
energia em Rondônia – como apontou o repórter
Allan de Abreu na revista Piauí.
Tem
mais. PMs do DF contaram que houve não apenas inação do Batalhão da Guarda
Presidencial, mas negativa de ajudar a PM a formar um cordão de contenção
contra os invasores em 8 de janeiro. Um subtenente enquadrou os militares para
que eles parassem de “frouxura”. Após a invasão, a PM foi até o Quartel-General
do Exército com o objetivo de efetuar prisões de golpistas que estavam ali
acampados. Foram impedidos pelo Exército, como mostrou a reportagem de Aguirre
Talento, do UOL.
Isso
permitiu aos invasores fugir de Brasília dentro de carros como a Hyundai
encontrada com o sargento Paulo.
Sabemos
que o acampamento montado diante do QG do Exército foi o celeiro de onde
partiram tanto a invasão quanto o ataque à sede da PF e a tentativa de explodir
o aeroporto de Brasília.
Sabemos,
ainda, que a cúpula do Exército nada fez para desmontar esse acampamento e
resistiu a diversas tentativas da PM.
(Por
muito menos, o Exército fuzilou com 62 tiros o carro em que o músico Evaldo
Rosa levava sua família para um chá de bebê, justamente sob a justificativa de que ele
estava em área de proteção de uma unidade militar.)
E
quem estava nos acampamentos? Familiares e esposas de militares. Não podemos
esquecer que, desde o começo da carreira política de Bolsonaro, sempre foram as
mulheres de militares da ativa que fizeram protestos, já que os maridos são
proibidos de se pronunciar publicamente.
Esse
contexto é essencial para entender o que significa a presença constante da
esposa do general Villas Bôas no acampamento, assim como as conversas golpistas
entre a esposa de Mauro Cid e Adriana Villas Bôas, filha do ex-comandante do
Exército.
Se
a história recente ensina algo, é que essas senhoras estavam apenas dando voz
aos maridos, covardes, que queriam um golpe, mas tinham medo de serem punidos
por isso.
Há
mais elementos, mas vou parar por aqui. Diante da gravidade do que já se sabe,
o mínimo que as Forças Armadas deveriam estar fazendo é começar um processo
sério de purga contra aqueles que não só falaram, mas se envolveram em uma
conspiração para derrubar nossa democracia.
Não
é, obviamente, o que está acontecendo. Repetem-se explicações evasivas e
lacônicas dizendo que as Forças abriram “um processo administrativo” e que
“tais opiniões não representam o posicionamento oficial da força”. O ministro
da Defesa, José Múcio, e o comandante do Exército, general Tomás Paiva,
decidiram impedir que o golpista Jean Lawand Júnior assumisse uma representação
militar em Washington, mas disseram a Lula que não expulsariam ninguém antes do
fim da investigação do STF. Enquanto isso, a semente daninha do golpismo se
amplia dentro da força.
A
coisa é mais complicada do que se pensa.
Como
demonstram as conversas no grupo de WhatsApp, é impossível manter controle
sobre o que dizem oficiais em ambientes semiprivados, como serviços de
mensageria instantânea. Ou saber se conspiram dentro desses ambientes
digitais.
Com
a revolução digital, entramos em uma era em que a proibição dos militares de
falar de política torna-se, por questões técnicas, antiquada. Mesmo sendo
improvável que “todos da divisão para baixo” sejam a favor de uma quebra
democrática, os poucos que se aventuraram a conspirar mantêm, ainda, enorme
poder social.
Estamos
falando de uma casta de servidores públicos com estabilidade financeira,
liderança hierárquica, presença em todo o território, e que, portanto, são
referências sociais e culturais. Como lidar com esse grupo altamente
radicalizado em um mundo digital fragmentado em que eles se tornaram
microinfluenciadores?
Parece-me
que a digitalização da política só aumenta os demais problemas da caserna que
tardamos em enfrentar. Não será possível manter a hierarquia e disciplina num
mundo do debate digital; nossa única saída é construir um Exército realmente
legalista e democrático, de cabo a general. Isso passa pela punição, claro, mas
também pela mudança radical do ensino militar e pela ampliação da participação
da sociedade.
Não
me parece ser esse o caminho que está sendo adotado nem por José Múcio nem pelo
general Tomás Paiva. Nem por Lula.
Ø
Influencer
evangélica pede prisão de Bolsonaro e Michelle em show
A
influenciadora digital evangélica Irmã Mônica subiu ao palco durante show do
cantor pernambucano Johnny Hooker, no sábado (1.jul.2023), e disse que estava
“orando pela prisão de Jair Bolsonaro e Michelle [mulher do ex-presidente]“.
O
evento aconteceu na 4ª edição do Festival Sinfônico na orla do lago Paranoá, em
Brasília.
“Bolsonaro
inelegível. Eu estou orando pela prisão de Bolsonaro e de Michelle. Vamos
acabar com aquela quadrilha, amém?”, disse.
O
cantor agradeceu e a abraçou. Na sequência, ela se afasta do palco. Depois de
sua fala, a plateia inicia um coro, gritando “inelegível“.
Maria
Mônica Bispo do Nascimento é ligada a CCB (Congregação Cristã no Brasil) e
ficou conhecida nas eleições de 2022 por apoiar o então candidato à Presidência
Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Fonte:
Por Natalia Viana, da Agencia Pública/Poder 360
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