Governo Lula
denuncia Bolsonaro na ONU
O
ódio promovido pelo governo de Jair Bolsonaro aumentou a violência política no
Brasil e os atos golpistas de 8 de janeiro devem ser entendidos nesse contexto
criado pelas forças no poder até o final de 2022.
Essa
foi uma das mensagens dadas pelo governo durante a sabatina do Brasil no Comitê
de Direitos Humanos da ONU, nesta segunda-feira em Genebra. Nos próximos dias,
as autoridades nacionais terão de dar respostas aos peritos da entidade sobre o
que farão para lidar com desafios e violações estruturais de direitos humanos
no Brasil.
A
sabatina já estava marcada para ocorrer antes mesmo de o governo de Luiz Inácio
Lula da Silva vencer a eleição e, ao longo do último ano do governo de Jair
Bolsonaro, o Brasil foi obrigado a apresentar um informe sobre a situação
nacional de direitos humanos.
Mas
chamou a atenção dos peritos do comitê o fato de o governo Bolsonaro ter
alegado nos documentos oficiais apresentados que não houve a difusão do ódio no
país pelas autoridades entre 2019 e 2022.
Nesta
segunda-feira, o governo Lula rejeitou a informação.
Em
seu discurso perante o órgão, a secretária-executiva do Ministério de Direitos
Humanos e Cidadania, Rita de Oliveira, afirmou:
“Ao
contrário do que foi respondido pelo governo anterior a este Comitê, nos
últimos anos, manifestações de ódio e de incitação ao ódio foram amplamente
verificadas em declarações públicas de altas autoridades que então governavam
nosso país Segundo a representante do país, “um dos efeitos dessa agenda
deliberada foi o aumento significativo da violência política e a realização de
eleições sob permanente ameaça de instabilidade”.
Mas,
ainda de acordo com ela, o país deu uma resposta. “Felizmente, mais uma vez, as
instituições brasileiras resistiram”, disse.
No
discurso da secretária-executiva, há uma relação entre a tentativa de golpe no
início de janeiro e essa atitude dos aliados de Bolsonaro de disseminação do
ódio.
“No
dia 8 de janeiro de 2023, poucos dias após a posse do novo Presidente da
República, assistimos no Brasil um ataque aberto, e extremamente violento, não
apenas ao patrimônio histórico brasileiro mas, sobretudo, à democracia de nosso
país. Com serenidade, as instituições democráticas agiram e seguimos em
frente”, afirmou.
Durante
o debate, peritos da ONU questionaram o governo brasileiro se houve algum tipo
de condenação contra líderes políticos que tenham usado o ódio e seu incentivo.
Segundo
Rita de Oliveira, para buscar respostas às causas profundas do ódio, o governo
criou um Grupo de Trabalho para a apresentação de estratégias de combate ao
discurso de ódio e ao extremismo e para a proposição de políticas públicas de
direitos humanos sobre o tema.
“O
grupo entregará seu relatório final nos próximos dias, trabalho resultante de
diversas áreas governamentais, pesquisadores, lideranças religiosas,
comunicadores, entre outros”, afirmou.
O
governo ainda aproveitou a sabatina para agradecer ao Comitê “por ter-se
colocado ao lado da democracia brasileira em um dos momentos mais dramáticos de
nossa história recente, felizmente superado, mas não sem custos para nossa
população e para nossas instituições”.
Ao
discursar, Rita de Oliveira destacou como os últimos anos foram marcados por um
desmonte operacional da ação do estado e se comprometeu com uma reconstrução
das políticas de direitos fundamentais.
“Hoje,
o Brasil passa por uma reconstrução profunda de suas políticas de direitos
humanos, duramente afetadas pela implementação, nos últimos anos, uma agenda
perversa de desmonte operacional e subversão conceitual”, completou.
Durante
seu discurso, a secretária-executiva destacou como, nos informes apresentados
pelo governo Bolsonaro, “lacunas de informação” existiram.
Ela
ainda prometeu “corrigir as numerosas distorções identificadas e trazer novos
elementos e iniciativas à apreciação do Comitê”.
A
atitude do Brasil representa uma ruptura em relação ao comportamento do governo
de Jair Bolsonaro que, durante quatro anos, negou a existência das dificuldades
no país e apresentou documentos que omitiam crimes e violência do estado.
Hoje,
a postura é outra.
“No
Brasil, reconhecemos que populações historicamente discriminadas e/ou em
situação mais vulnerável – negros, indígenas, mulheres, quilombolas, população
em situação de rua, comunidade LGBTQIA+, entre outros – estão mais expostos à
violência policial, à tortura, à denegação de justiça, ao trabalho forçado, ao
encarceramento em massa, à xenofobia e à violência política, entre outros”,
afirmou.
Para
ela, a garantia desses direitos passa por políticas de empoderamento material e
político dessas populações.
Em
seu discurso, a representante do governo enumerou as medidas que estavam sendo
tomadas pela nova administração. Entre eles:
#
“Novo Bolsa Família”, programa de transferência de renda que atende a 54,6
milhões de brasileiros, sendo que 73,4% dos beneficiários são pessoas negras e
81,5% das famílias são chefiadas por mulheres.
#
No campo da promoção da equidade racial, entre diversas ações, o Governo
Federal determinou o percentual mínimo de 30% de vagas em cargos em comissão e
funções de confiança na administração federal para pessoas negras e elaboração
do Plano Juventude Negra Viva, com vistas à redução da violência letal e das
vulnerabilidades sociais contra a juventude negra e ao enfrentamento do racismo
institucional.
#
No campo da igualdade de gênero, foi sancionada a Lei da Igualdade Salarial e
Remuneratória entre homens e mulheres. Foi também criado Grupo de Trabalho
Interministerial para elaborar a Política Nacional de Enfrentamento à Violência
Política contra as Mulheres.
#
Elaboração de Política Nacional de Proteção aos Defensores e Defensoras dos
Direitos Humanos, Comunicadores e Ambientalistas, para instituir um marco legal
para o programa de proteção.
#
Criação do “Projeto Mandela”, que irá atuar na garantia ao devido processo
legal, no enfrentamento à tortura e na promoção de políticas de
desencarceramento.
Durante
o discurso, a secretária-executiva ainda reconheceu a violência policial no
país e colocou num contexto histórico.
“Vale
observar que a situação prisional no Brasil, assim como a letalidade policial,
são em parte tributárias do racismo, que naturaliza a violência contra a
população negra e pobre do país e, também, dos longos 20 anos de ditadura
militar”, destacou.
Para
o governo, “a luta por verdade, memória e justiça segue inconclusa no Brasil”.
“Como medidas prioritárias do novo governo, revisamos a composição da Comissão
de Anistia e estamos em vias de restabelecer a Comissão Especial sobre Mortos e
Desaparecidos.
Estamos
igualmente comprometidos com o acompanhamento das recomendações da Comissão
Nacional da Verdade, que finalizou seu relatório em 2014, e empenhados em
resgatar, também a memória sensível do tráfico transatlântico e da escravidão
em nosso país. Todos esses elementos implicam a permanente defesa da democracia
brasileira”, disse.
No
contexto dos povos indígenas, o governo destacou a criação de um ministério
dedicado ao tema e apontou que se trata de um “marco histórico” no país.
Mas,
uma vez mais, a delegação usou a ocasião para denunciar as atitudes de
Bolsonaro.
“Logo
nas primeiras semanas de governo, nos deparamos com a situação dramática
enfrentada pelo povo Yanomami, fruto da negligência e da atuação criminosa de
quem governava o país”, afirmou.
“A
paralização dos processos demarcatórios e a internalização da tese do marco
temporal foi associada à omissão na fiscalização e no combate ao garimpo – que
é sempre ilegal – em terras indígenas, o apoio à extração de madeira e a outras
formas de violação aos territórios e a negligência da política de vacinação e
atenção à saúde dos indígenas durante a pandemia da COVID-19”, completou.
Outro
ponto anunciado pelo governo brasileiro foi a decisão de passar a dar refúgio
para pessoas que têm seus corpos e suas existência criminalizadas em seus
países de origem, em razão de sua orientação sexual e identidade de gênero.
O
governo também destacou o desligamento do Brasil do “Consenso de Genebra”, que
contrariava o compromisso nacionais com a realização dos direitos sexuais e
reprodutivos das mulheres a partir de uma perspectiva de promoção da igualdade
e da equidade de gênero, e com a não discriminação contra a população LGBTQIA+.
PF desconfia de investigação do caso
Marielle
A
Polícia Federal colocou experientes investigadores para tentar identificar o
mandante do assassinato de Marielle Franco. O grande desafio tem sido o lapso
temporal, de cinco anos, decorrido entre a execução do crime, em março de 2018,
e a entrada da PF no caso.
Investigadores
lamentam o fato de câmeras de segurança mapeadas, que poderiam ter captado
movimentos dos executores Ronnie Lessa e Élcio Queiroz antes do crime, já não
contarem com registros da época. Para economizar espaço de memória, muitos
computadores deletam automaticamente o material em prazos curtos.
Em
2019, ainda no governo Bolsonaro, a então procuradora-geral de Justiça, Raquel
Dodge, chegou a pedir a federalização das investigações envolvendo o
assassinato de Marielle Franco. O Superior Tribunal de Justiça, contudo, negou
o pedido. A PF abriu inquérito para investigar o caso em março deste ano após
determinação do ministro Flávio Dino.
Bolsonaro pede “direitos humanos” na OEA
O
núcleo de Jair Bolsonaro entrará com representação contra Alexandre de Moraes
na Organização dos Estados Americanos (OEA). Ainda em fase de elaboração, o
texto já acumula centenas de páginas e acusa o ministro do STF de suposta
perseguição ao ex-presidente.
A
representação se baseia não em um ato específico do magistrado, mas em um
conjunto de fatores que busca validar a tese. A ideia é que a representação
seja assinada por dezenas de parlamentares simpáticos ao ex-presidente antes de
ser protocolada na OEA.
O
movimento busca internacionalizar a insatisfação de Bolsonaro com a atuação de
Moraes no Tribunal Superior Eleitoral e na Suprema Corte. A OEA mantém foco no
monitoramento de processos eleitorais e é composta pelas 35 nações
independentes nas américas do Sul, Central e do Norte.
Em
2022, a organização atuou oficialmente como observadora do processo eleitoral
brasileiro. Em relatório preliminar divulgado em novembro, após as eleições, a
OEA destacou “o trabalho do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), instituição que
mais uma vez demonstrou seu alto nível de profissionalismo e solidez”.
Vice-PGE pode virar PGR após detonar
Bolsonaro
Um
detalhe chamou a atenção de integrantes do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e
do governo Lula no início do julgamento que deve levar à inelegibilidade de
Jair Bolsonaro: o endurecimento da posição do vice-procurador-geral eleitoral,
Paulo Gonet, pela condenação do ex-presidente por abuso de poder político e uso
indevido dos meios de comunicação.
Gonet
já havia se manifestado em abril pela condenação de Bolsonaro a ser impedido de
disputar eleições por oito anos, como punição pela realização da reunião com
embaixadores estrangeiros em que o ex-presidente atacou as urnas eletrônicas e
o sistema eleitoral, em julho passado.
Depois
disso, a candidatura de Gonet para assumir a chefia da Procuradoria-Geral da República
(PGR) cresceu na bolsa de apostas, especialmente pelo apoio de duas figuras
influentes em Brasília: os ministros do Supremo Gilmar Mendes e Alexandre de
Moraes.
O
mandato do atual procurador-geral da República, Augusto Aras, se encerra em
setembro.
Embora
a posição de Gonet pela condenação de Bolsonaro já fosse conhecida, ele foi
muito mais categórico e escolheu palavras bem mais fortes em sua fala perante
os ministros do TSE, na sessão transmitida ao vivo na TV Justiça.
Ao
rechaçar a ofensiva de Bolsonaro contra as urnas eletrônicas, Gonet frisou que
o discurso adotado diante dos embaixadores “reitera outros atos” e poderia
“perturbar a tranquilidade institucional”.
Mais
adiante, afirmou que “o sistema representativo desacreditado solapa a base da opção
fundamental do constituinte por um Estado Democrático de Direito”, e
classificou as críticas do ex-presidente ao sistema eleitoral como “temerárias”
e “sabidamente infundadas”.
Disse,
ainda, que “o discurso contra a confiabilidade do sistema de votação eletrônica
– mesmo que não visasse a esses resultados específicos – não poderia ter mais
expressiva revelação do seu infesto potencial antidemocrático”.
“Solapar”,
“temerárias”, “perturbar”, “infesto potencial antidemocrático”, nenhum desses
termos aparece no parecer escrito de Gonet enviado ao TSE há dois meses.
No
parecer escrito, Gonet havia afirmado apenas que a “gravidade do discurso
contra a confiabilidade do sistema de votação eletrônica não poderia ter mais
expressiva exposição”.
Para
um ministro de Lula, Gonet está tentando “mostrar serviço”.
Lula
já avisou que não vai seguir a lista tríplice formada após votação interna da
Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), encabeçada pela
subprocuradora-geral Luiza Frischeisen, que recebeu 525 votos dos colegas.
Os
subprocuradores Mario Bonsaglia e José Adonis completam a lista, após receberem
465 e 407 votos, respectivamente. Gonet não entrou na disputa da categoria, o
que o cacifou ainda mais para o cargo de Aras.
Lula
não é obrigado pela Constituição a seguir a lista tríplice – e busca para a
chefia do Ministério Público Federal um procurador que não lhe dê dor de cabeça
no Palácio do Planalto. Ou seja: busca um Aras para chamar de seu.
Fonte:
UOL/Metrópoles/O Globo
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