sexta-feira, 13 de dezembro de 2024

Além da UE: Mercosul inclui Bolívia e Panamá para se proteger de Trump, diz analista

Acordo Mercosul-União Europeia ofuscou a mais recente expansão do Mercosul para incluir Bolívia e Panamá nas suas fileiras. Com a chegada na Casa Branca de presidente que acha "tarifa a palavra mais bonita do dicionário", Mercosul acerta ao diversificar parcerias e se proteger de Donald Trump, acredita analista ouvido pela Sputnik Brasil.

Durante a Cúpula de Chefes de Estado do Mercosul de Montevidéu, no Uruguai, a euforia gerada pela assinatura do acordo com a União Europeia ofuscou a consolidação da mais nova onda de expansão do bloco: a Bolívia fez a sua estreia como Estado parte do Mercosul, que também fechou acordo com o Panamá, como Estado associado, inaugurando sua expansão rumo à América Central.

Após mais de dez anos de negociações, o presidente da Bolívia, Luis Arce, entregou o Instrumento de Ratificação do Protocolo de Adesão ao Mercosul durante a Cúpula de Montevidéu.

"Com a entrada da Bolívia, o Mercosul se constitui na sétima economia do planeta, com um PIB combinado de quase 3 trilhões de dólares", comemorou o presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva. "O comércio entre nós mobiliza a expressiva soma de 55 bilhões de dólares. 75% dessa cifra é de produtos de alto valor agregado."

O Mercosul agora representa 73% do território da América do Sul, 65% de sua população e cerca de 70% do PIB regional. Apesar das bonanças, o processo de entrada da Bolívia foi longo e marcado por turbulências, disse a cientista política e doutoranda em relações internacionais na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) Beatriz Bandeira de Mello.

"O processo teve inúmeras idas e vindas por questões políticas e [...] instabilidade, considerando que o Brasil enfrentou uma crise institucional e a Bolívia, um golpe de Estado", disse Mello à Sputnik Brasil. "Dentro do bloco, houve quem argumentasse que a entrada da Bolívia poderia 'ideologizar' o Mercosul e causar paralisia no bloco."

A finalização do processo foi beneficiada pelas relações próximas entre os presidentes Lula e Luis Arce, que relançaram projetos conjuntos no setor de infraestrutura.

"Vemos uma convergência de objetivos entre a presidência brasileira e boliviana, sobretudo quanto ao compartilhamento de recursos naturais – como o lítio, fundamental para a fabricação de semicondutores – e pela proximidade com a China, que é um dos grandes importadores desses recursos", notou Mello.

Lula revelou o interesse dos países em consolidar o projeto "Quadrante Rondon", durante encontro bilateral com o presidente Arce, em junho deste ano. A iniciativa tem como objetivo construir uma ponte binacional sobre o rio Marmoré e garantir a navegabilidade do rio Paraguai e do canal Tamengo.

"O presidente Lula já declarou, inclusive, que o gasoduto Brasil-Bolívia pode ser utilizado para transportar o gás natural da Vaca Muerta, na Argentina", lembrou Mello. "Em termos geopolíticos, outro recurso importante é a hidrovia Paraguai-Paraná, que oferece uma saída natural ao Atlântico e pode ser útil para o escoamento da produção boliviana e sua integração às cadeias globais de valor."

Além dos recursos naturais, a entrada da Bolívia favorece o desenvolvimento da indústria regional, que poderá contar com mercado interno pujante e ampliado, acredita o pesquisador do Núcleo de Estudos Latino-Americanos da Universidade de Brasília (UnB) Robson Valdez.

"A entrada da Bolívia cria oportunidades para o desenvolvimento de indústrias de valor agregado nos países do bloco, [...] já que expande o mercado interno do Mercosul e potencializa fluxos comerciais e investimentos", disse Valdez à Sputnik Brasil. "E mais, a construção geográfica da Bolívia no coração da América do Sul pode facilitar a conexão logística entre os países membros, especialmente com corredores bioceânicos que ligam o Atlântico ao Pacífico."

A economia interna boliviana também tem bastante a ganhar com o Mercosul, já que o país passa a acessar um mercado de 300 milhões de pessoas, que conta com uma das maiores economias do mundo – o Brasil.

"A Bolívia poderá acessar fundos de investimentos do Mercosul, como o FOCEM [Fundo para a Convergência Estrutural do Mercosul] e se beneficiar do livre trânsito de mercadorias, pessoas e capitais", notou Mello. "A decisão também confere maior peso político ao país, que poderá participar dos processos de tomada de decisão do Mercosul."

País exportador de mão de obra para países vizinhos, a Bolívia poderá garantir aos seus nacionais residentes nos países do bloco acesso à educação, saúde e direitos trabalhistas, participando da chamada "cidadania do Mercosul".

Por fim, a Bolívia também quer ver a sua capacidade negociadora fortalecida para selar acordos com potências extrarregionais, como a União Europeia, ressaltou Valdez.

"A Bolivia tem interesse em participar de negociações globais lideradas pelo Mercosul e terá uma oportunidade única para ampliar sua presença global", disse Valdez. "Acordos como o selado com a União Europeia poderão diversificar a economia boliviana, atraindo investimentos em setores estratégicos como o de minerais e energia."

<><> Nada é pra já

Apesar das comemorações, a Bolívia ainda terá quatro anos para liberalizar o seu mercado para o Mercosul e adotar a Tarifa Externa Comum (TEC) do bloco. Nesse período, o país também terá que internalizar o Protocolo de Direitos Humanos no Mercosul e o Protocolo Constitutivo do Parlamento do Mercosul, entre muitos outros.

"O Mercosul não tem como pressionar para a rápida adesão aos acordos, uma vez que esse é um processo que deve atender aos dispositivos constitucionais e legislativos da Bolívia", destacou a pesquisadora da UERJ.

A internalização das normas do Mercosul gera ansiedade, já que esse foi um dos principais entraves para a entrada da Venezuela como Estado parte do bloco. Além das controvérsias acerca de processos eleitorais, a demora de Caracas em adotar a TEC foi um dos motivos que levaram à suspensão do país do Mercosul.

“Acredito que o Mercosul vai tentar evitar repetir essas mesmas situações, esses mesmos problemas ocorridos com a Venezuela, ao estabelecer cronogramas claros e acompanhamento técnico rigoroso para que a Bolívia implemente, de fato, a tarifa externa comum e as demais legislações do bloco”, acredita Valdez.

Para ele, o Mercosul deve "garantir um diálogo constante e oferecer incentivos econômicos, juntamente com compromissos políticos firmes por parte da Bolívia", a fim de "assegurar a entrada bem-sucedida do país no bloco".

<><> Rumo ao Norte

O Mercosul e seus acordos com países da América do Sul fazem da região uma zona de livre comércio de fato. Por isso, o Mercosul busca se expandir para novas áreas, como a América Central.

Durante a Cúpula de Montevidéu, o Panamá assinou o Acordo de Complementação Econômica 76 (ACE-76), que oficializa sua entrada no bloco como Estado associado. O Panamá é o principal parceiro comercial do Brasil na América Central e o primeiro centro-americano a integrar o Mercosul.

"A adesão do Panamá fortalece as relações do Brasil com os países da América central, incrementa as exportações e o fluxo de comércio, tendo como referência o Canal do Panamá e a Zona Franca de Colón", disse Mello.

De acordo com o Itamaraty, negociações com El Salvador e República Dominicana estão em curso para consolidar a presença do Mercosul na América Central.

O governo brasileiro adota a estratégia de diversificação dos parceiros para driblar críticas feitas por membros como Uruguai e Paraguai, que pedem maior internacionalização do Mercosul. Montevidéu ameaçou inclusive se retirar do bloco, caso negociações com potências como a China não fossem aceleradas.

"Essa estratégia é adotada na expansão do bloco rumo ao Sudeste Asiático, vide o acordo firmado com Singapura em 2024, as tratativas com os Emirados Árabes Unidos, e a expansão rumo ao eixo Ásia-Pacífico, que incluem diálogos com a China e o Japão", disse Mello.

A diversificação de parcerias vem em boa hora e prepara o bloco para enfrentar a nova administração Donald Trump na Casa Branca. Entusiasta da imposição de tarifas, o novo presidente norte-americano poderá criar dificuldades para alguns setores exportadores do Mercosul.

"Donald Trump prometeu lançar mão de guerras tarifárias para reduzir o déficit comercial dos EUA. Nesse sentido, as estratégias de articulação do Mercosul com outros blocos, como a União Europeia, e com o Panamá, criam necessária diversificação e dinamização da economia do bloco", concluiu Valdez.

A 65ª Cúpula de Chefes de Estado do Mercosul, realizada entre os dias 5 e 6 de dezembro em Montevidéu, encerrou a presidência uruguaia do bloco. A partir de 2025, a Argentina tomará as rédeas do Mercosul, com a função não só de consolidar a entrada da Bolívia no bloco, mas também de finalizar as negociações com os Emirados Árabes Unidos e aprovar o acordo recém firmado com a União Europeia.

 

¨      Influência de Macron enfraquece no mundo, na UE e no acordo com Mercosul, diz analista

A influência do presidente francês Emmanuel Macron, devido à atual crise política no país, enfraqueceu na arena internacional, especialmente na União Europeia (UE), disse um especialista do Instituto de Estudos Políticos de Paris (Sciences Po), Alain Policar, à Sputnik.

O comentário surgiu antes de uma reunião planejada para quinta-feira (12) entre Macron e o premiê polonês Donald Tusk, onde espera lhe relatar sobre sua reunião com o presidente eleito dos EUA Donald Trump e o atual líder da Ucrânia Vladimir Zelensky em Paris na semana passada.

Entre outras coisas, Macron pretende discutir o acordo recém-fechado entre a UE e o Mercosul e o apoio europeu à Ucrânia, pois a Polônia vai exercer a presidência da UE em 2025.

Segundo Policar, os problemas domésticos de Macron no palco político, como os resultados das eleições legislativas e o voto de desconfiança em seu governo, "minaram completamente sua legitimidade".

"Ele não tem maioria política há muito tempo, e é justo considerar que ele perdeu sua influência real", disse.

Policar acredita que Macron não está mais sendo ouvido e, em questões como a formação de uma coalizão para enviar tropas à Ucrânia ou impedir a assinatura de um acordo de livre comércio entre a UE e o Mercosul, a França não tem mais voz.

"No cenário internacional, e especialmente na Europa, a voz da França está extremamente enfraquecida. Todos sabem que ele é extremamente impopular e que, em dois anos e meio, não será mais presidente", acredita.

Ao mesmo tempo, ele acha que a França perdeu sua influência não apenas por causa de Macron, mas também devido à deterioração da situação econômica do país.

¨      Problemas econômicos podem estragar as relações entre França e contratantes de defesa, diz mídia

A crise do governo na França prejudica os planos de aumentar o orçamento militar em € 3,3 bilhões (cerca de R$ 18 bilhões) e o problema poderia estragar as relações do país com contratantes de defesa, diz mídia, citando um funcionário do setor de defesa sem mencionar seu nome.

"Se o governo incentivar os fabricantes a produzir, dizendo-lhes: 'Não se preocupem, faremos pedidos', e depois não os fizer, isso criará um problema", disse um funcionário à mídia.

Ele também ressaltou que, em meio ao adiamento dos planos para aumentar o orçamento, quaisquer cortes provavelmente afetarão o investimento em armas convencionais, pois as autoridades "não sacrificarão a dissuasão nuclear".

A mídia diz que uma fileira de funcionários, militares e legisladores franceses declararam que não é útil esperar a adoção do novo orçamento antes de fevereiro de 2025.

Anteriormente, o presidente da França, Emmanuel Macron, proclamou que o novo orçamento será preparado no início do ano.

Previamente, o primeiro-ministro Michel Barnier já havia apresentado sua renúncia e Macron a aprovou. Antes disso, o parlamento apoiou de forma majoritária o voto de desconfiança ao governo e o governo tinha forçado sua renúncia.

O projeto de lei sobre o orçamento francês do ano de 2025 anunciado por Barnier tinha a ideia de regime de "austeridade". Barnier disse que o governo planeja cortar os gastos estatais em€ 40 bilhões (cerca de R$ 240 bilhões) em 2025 e o governo tem planos também de obter mais

€ 20 bilhões (cerca de R$ 120 bilhões) no contexto do aumento dos impostos.

Ele ressaltou que as autoridades, com ajuda de cidadãos ricos e grandes empresas, pretendem reduzir a dívida nacional do país, que atingiu € 3,228 trilhões (cerca de R$ 18 trilhões), que corresponde a 112% do PIB francês e está enfraquecendo as posições do país na Europa. Ele também disse que planeja reduzir o déficit fiscal de uma estimativa de 6,1% para 5% do PIB em 2025 e 3% do PIB até 2029.

 

¨      Mercado de petróleo em 2025 pode atingir equilíbrio devido ao Brasil e Guiana, explica especialista

A relação entre a demanda e a oferta no mercado global de petróleo em 2025 pode se igualar após um déficit em 2024, mesmo com a produção crescente no Brasil, na Guiana e nos EUA, opinou Kirill Rodionov, especialista independente em energia.

Ele explicou que os cortes acordados na Organização dos Países Exportadores de Petróleo e associados (OPEP+) deverão compensar o crescimento da produção de petróleo em alguns países que não participam da organização.

Os países membros da OPEP controlam cerca de 2/3 das reservas de petróleo do mundo e são responsáveis por cerca de 35% da produção mundial e metade das exportações mundiais de petróleo.

As reservas comprovadas de petróleo dos países membros da OPEP ultrapassam um milhão de barris.

O Brasil entrou oficialmente para a OPEP+ em 1º de janeiro de 2024.

"O mercado de petróleo pode ficar equilibrado em 2025. Vai ser influenciado pelo crescimento da produção da Guiana e do Brasil, que usam unidades flutuantes de armazenamento e transferência [FPSO, na sigla em inglês] para desenvolver campos offshore. A Guiana em 2025 deverá colocar em operação a FPSO Guyana One com capacidade de 250 mil barris por dia, e no Brasil atingirá sua capacidade de projeto a instalação flutuante Marechal Duque de Caxias [180 mil barris por dia], que foi colocada em operação na Bacia de Santos em outubro", disse o especialista.

Ele observou que o Departamento de Energia dos EUA, em seu relatório de dezembro, prevê uma redução do déficit no mercado de petróleo:

até o final de 2024, a demanda excede a oferta em 440 mil de barris por dia (bpd);

em 2025, deverá exceder apenas em 90 mil bpd.

De acordo com o relatório, a produção global de petróleo está prevista para 102,59 milhões de bpd em 2024 e 104,24 milhões de bpd em 2025.

A demanda é esperada em 103,03 milhões e 104,32 milhões de bpd, respectivamente.

Embora a OPEP+ tenha planejado anteriormente aumentar a produção em 2,46 milhões de barris no próximo ano, agora planeja aumentar em apenas 1,23 milhão de barris.

Rodionov destaca que a mudança da política da OPEP+ foi aprovada em 5 de dezembro, então o próximo relatório do Departamento de Energia, que vai levar em conta esse fato, será divulgado só em janeiro de 2025.

Porém, o especialista prevê que, se a administração do presidente eleito dos EUA Donald Trump cumprir a promessa de reduzir as restrições na esfera petrolífera estadunidense, os países da OPEP+ poderão optar por um aumento descontrolado da oferta.

"Nesse caso, o equilíbrio do mercado mudará significativamente e todas as previsões atuais poderão ser deixadas de lado", concluiu.

 

Fonte: Sputnik Brasil

 

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