terça-feira, 18 de junho de 2024

Em ‘jogo casado’ com Lira, bancada evangélica acena com recuo em projeto antiaborto

Em um jogo casado com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), a bancada evangélica indicou que irá recuar do discurso em favor de uma votação rápida do projeto que equipara o aborto ao crime de homicídio.

A tendência, segundo relataram ao blog fontes próximas às negociações, já está consolidada nos bastidores e deve ser referendada na reunião de líderes prevista para ocorrer amanhã.

Em um aceno à ala conservadora da Câmara, Lira amarrou o acordo que permitiu aprovar a urgência do texto. O movimento teve aval inclusive de partidos de esquerda, entre eles o PT, como informou o blog na semana passada. Mas Lira comprometeu-se a jogar para frente a apreciação do mérito.

Se tudo correr como previsto, o assunto deve ir para a gaveta pelo menos até depois das eleições.

Aprovada com aval velado do governo, a urgência do projeto provocou forte repercussão na base de apoio do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

De início, líderes do governo e do PT se mantiveram em silêncio sobre o assunto, embalados pelo acordo selado com Lira. Mas, diante das fortes críticas ao texto, se viram obrigados a se manifestar contra a proposta.

•           Após reação das ruas, oposição diz não ter compromisso com PL do aborto

"Eles acharam que estava tudo dominado, que ia ser uma semana de impor vexame ao governo, erraram na dose, perderam a mão e conseguiram, sozinhos, acordar as ruas".

A avaliação é de um dos líderes de Lula e peça central na articulação política do governo sobre a decisão da bancada evangélica e do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), de usar um projeto que, na prática, impõe a mulheres estupradas que engravidem e abortem, como hoje permite a lei, pena mais grave que a imposta ao estuprador.

<><> A oposição sentiu

Uma das principais vozes do PP, o partido de Lira, o senador Ciro Nogueira (PP-PI), presidente da sigla, diz que nem ele, nem Lira, têm qualquer compromisso com o mérito da proposta. "O acordo, o gesto para a bancada evangélica, era apenas o de votar a urgência. Apenas isso. Não há qualquer acordo sobre o mérito (conteúdo) da proposta."

O pedido de urgência acontece para que projetos de lei sejam incluídos na pauta do plenário sem que passe por comissões. A expectativa, normalmente, é que o texto seja votado de forma mais rápida, mas isso não é obrigatório.

A reação das mulheres, que foram às ruas em diversas capitais do país ao longo dos últimos dias, o desgaste midiático e a reação das redes dividiram inclusive a bancada evangélica e líderes religiosos em todo o país.

Falas de líderes religiosos, pastores, inclusive, contra o PL ganharam as redes sociais e expuseram as fraturas causadas pelo tema.

No grupo mais próximo a Lira, a avaliação é a de que o deputado Sóstenes Cavalcanti (PL-RJ) um dos autores da proposta, pode ter garantido "umas três eleições" em seu nicho, mas acabou expondo a oposição a um desgaste inédito desde o 8 de janeiro de 2023.

•           Deputados avaliam que não há ambiente para votar

Deputados contrários ao PL do aborto afirmam acreditar que o único avanço na tramitação da proposta deve ser a escolha de uma relatora para projeto.

Na avaliação deles, não há ambiente para votação, e as conversas sobre a relatoria da proposta estão acontecendo nesta semana.

Não há ainda um nome mais cotado, mas o deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), autor da proposta, quer conversar com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), sobre a indicação.

A repercussão negativa vai evitar a votação, pelo menos, por enquanto. A votação da urgência não passou de um gesto que Lira fez aos conservadores pra se manter influente e capitanear a escolha do sucessor pra presidência da Câmara.

Com os protestos do fim de semana e o engajamento nas redes sociais, muitos deputados desembarcaram da ideia de levar adiante o PL do aborto.

Em outra frente, o PSOL pediu a retirada do projeto por considerá-lo inconstitucional. O argumento é que o PL do aborto fere vários artigos da constituição, como os que tratam de:

•           direito à vida, igualdade e não discriminação

•           vedação de tortura

•           tratamento desumano e degradante

•           direito a saúde e acesso universal e igualitário aos serviços de saúde

•           Lira recua e afirma que lei sobre aborto não será descumprida

Se não fosse o recuo do presidente da Câmara, Arthur Lira, causado pela pressao da opinião pública, entraria na ordem do dia das votações um projeto totalmente absurdo que estabelecia pena de prião maior para mulher, vítima de estupro, e que faz o aborto, do que para o próprio criminoso. Reportagem de O Globo assinala que se permanecesse o projeto original, esse fato colocaria o Brasil na contramão do mundo.

Arthur Lira minimizou nesta quinta-feira a aprovação da urgência do projeto que trata do aborto e disse que é o relator quem dará “o tom” do texto final. “O sentimento da casa não é para avançar para liberação do aborto e também não é para descumprir os casos que já são permitidos hoje em lei”, disse ele em entrevista coletiva à imprensa. O Projeto de Lei 1904 quer colocar um teto de 22 semanas na realização de qualquer procedimento de aborto em casos de estupro no Brasil. O objetivo da proposição é equiparar a punição para o aborto à reclusão prevista em caso de homicídio simples.

SITUAÇÕES

Hoje, o procedimento só é permitido em três situações, os quais são a gestação decorrente de estupro, o risco à vida da mulher e a anencefalia fetal. Os dois primeiros estão previstos no Código Penal de 1940 e o último foi permitido via decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) em 2012. Para todos esses cenários, não há limite da idade gestacional para a realização do procedimento. É incrível como a capacidade destrutiva pode ser viabilizada num lance parlamentar. O recuo finalmente salvou a situação e impediu com que o país caísse na teia do absurdo.

Também sob pressão da opinião pública, o governo assumiu outra posição, agora contrária à omissão que marcava o seu comportamento anterior. Lula da Silva afirmou neste sábadoque considera uma “insanidade” a possibilidade de punir uma mulher estuprada que comete aborto com uma pena maior do que a aplicada ao estuprador. Lula deu a declaração ao ser questionado sobre sua posição a respeito do projeto em análise na Câmara dos Deputados.

“Eu sou contra o aborto. Entretanto, como o aborto é a realidade, a gente precisa tratar o aborto como questão de saúde pública. Eu acho que é insanidade alguém querer punir uma mulher numa pena maior do que o criminoso que fez o estupro. É no mínimo uma insanidade isso”, disse. Foi a primeira manifestação do presidente a respeito do mérito do projeto.

•           Após desgaste, aliados de Lira vão defender que aborto saia da pauta

Depois do desgaste e da pressão da sociedade, aliados do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), vão defender que o projeto que equipara aborto ao crime de homicídio saia da pauta da Casa e o foco passe a ser a regulamentação da reforma tributária.

Um amigo de Lira lembra que ele foi alertado que o tema iria provocar polêmica e desgaste para a Casa, mas ele decidiu cumprir o acordo com a bancada evangélica e colocar o requerimento de urgência do projeto em votação.

A decisão deve ser acertada na reunião de líderes desta terça-feira (18), quando o presidente da Câmara dos Deputados deve pedir um esforço para tentar votar o principal projeto de regulamentação da reforma tributária aprovado antes do recesso parlamentar.

O segundo projeto, que trata do comitê gestor da distribuição dos recursos do novo sistema tributário, ainda não foi enviado pelo governo Lula, apesar da promessa de que ele seria encaminhado na semana retrasada. Com isso, esse segundo tema deve ficar para depois das eleições municipais.

Aliados de Arthur Lira alertam que a Câmara dos Deputados virou alvo de críticas e perdeu o discurso de que prioriza os projetos de interesse do país, como a agenda econômica.

O principal projeto dessa agenda neste ano é a regulamentação da reforma tributária, que pouco caminhou até agora dentro da Casa. Em vez disso, acabou concentrada em temas como aborto e delação premiada, projetos que atendem grupos de parlamentares ligados ao ex-presidente Jair Bolsonaro.

•           PL do aborto é inconstitucional e 'desconexo da realidade', diz comissão da OAB

Uma comissão criada pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) considerou inconstitucional o projeto de lei que equipara o aborto após 22 semanas ao crime de homicídio, inclusive em casos de estupro.

O parecer elaborado pela comissão diz que o projeto é "grosseiro" e "desconexo da realidade".

"O texto grosseiro e desconexo da realidade expresso no Projeto de Lei 1904/2024, que tem por escopo a equiparação do aborto de gestação acima de 22 anos ao homicídio, denota o mais completo distanciamento de seus propositores às fissuras sociais do Brasil, além de simplesmente ignorar aspectos psicológicos; particularidades orgânicas, inclusive, acerca da fisiologia corporal da menor vítima de estupro; da saúde clínica da mulher que corre risco de vida em prosseguir com a gestação e da saúde mental das mulheres que carregam no ventre um anencéfalo."

O documento diz ainda que a criminalização do aborto para além do que já é previsto na legislação "incidirá de forma absolutamente atroz sobre a população mais vulnerabilizada, pretas, pobres, de baixa escolaridade, perfil onde também incide o maior índice de adolescentes grávidas".

Segundo a presidente da Comissão Nacional de Direitos Humanos (CNDH) da OAB, Silvia Souza, o texto vai ser submetido aos 81 conselheiros federais nesta segunda-feira (17).

"As discussões feitas pelas integrantes da comissão levaram em conta o aspecto jurídico da proposta. Não debatemos se a OAB deve ser contra ou a favor a prática do aborto. Discutimos se o projeto é ou não cabível no ordenamento jurídico brasileiro e a conclusão é que o texto é inconstitucional e inconvencional. Vamos submeter essa posição ao plenário da Ordem para que todas as conselheiras e conselheiros federais decidam qual será a posição da entidade", afirmou Silvia.

<><> Discussão no Senado

O Senado Federal agendou para manhã desta segunda-feira (17) uma sessão de debates a fim de discutir o processo de aborto legal no Brasil.

O requerimento para realizar o debate foi apresentado um dia depois de o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), anunciar o tema na pauta no plenário da Casa. O pedido do debate foi votado, de forma simbólica, no mesmo dia em que chegou no Senado.

O pedido foi feito pelo senador Eduardo Girão (Novo-CE), declaradamente contra o aborto e que em abril de 2023 ficou conhecido por ter tentado entregar uma réplica de feto para o ministro dos Direitos Humanos, Silvio Almeida, durante uma audiência pública no Senado

A solicitação ainda foi assinada por lideranças do Senado ligadas a base do governo, MDB e Republicanos, e de oposição, PL e Podemos.

De acordo com o regimento interno do Senado, as sessões de debates temáticos têm como fundamento "tratar de tema relevante de interesse nacional".

 

Fonte: CNN Brasil/Tribuna da Internet/g1

 

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